terça-feira, 11 de março de 2025

Ronin RPG - Resenha

 Ronin RPG
- Resenha -

 

Gostem ou não, Mörk Borg impactou significativamente o cenário dos jogos de RPG nos últimos tempos. Embora tenha surgido como uma marca de RPG de fantasia com tema black metal e com isso tenha atraído um público específico, a indústria caseira de RPGs que surgiu em torno dela é indiscutivelmente grande, robusta e diversificada ao ponto de surgirem coisas de uma única página no itch.io a hacks publicados completos como Pirate Borg em grandes editoras. Aqui entra Ronin, que acabou de entrar em financiamento coletivo pela Tria Editora (LINK) e que recebi antecipadamente sua versão traduzida em PDF e pronta para a impressão para avaliação.

O PDF de Ronin tem 128 páginas, e como algo do clã Mörk Borg ele já chega dizendo à que veio. Na capa vemos o que parece ser um ninja ou personagem adjacente a um ninja cometendo suicídio ritual (seppuku) ou tendo sido ferido mortalmente. Isso está de acordo com o tom geral do jogo e imediatamente o coloca em posição oposta à um higienizado Legend of Five Rings e semelhantes. Todo ele é sombrio e perigoso, violento e sangrento. Não à toa que logo no início temos um "aviso de gatilho" sobre seppuku, mas depois dessa capa, parece desnecessário.

O cerne de um jogo inspirado em Mörk Borg são as tabelas aleatórias, e Ronin tem muitas delas. Elas começam imediatamente dentro da capa (no início e no final do livro) e vão do simples (nomes) ao sanguinário (ferimentos debilitantes). Eles não estão brincando aqui. A morte é frequente e feia em Ronin. E tenha em mente que ainda nem passamos do índice.

Vale a pena salientar que Ronin é um livro lindo. As ilustrações geralmente são de temas sombrios — o cenário do jogo propicia isso — mas são de qualidade que me agrada muito. Não à toa li em uma outra resenha que “Ronin é um livro de arte com um jogo”, e sou obrigado a concordar com isso. Se lembrarmos Mörk Borg, Ronin segue a linha de que a aparência é tão importante quanto o conteúdo.

Começando a folhar o livro, inicialmente temos cerca de vinte de cenário. O cenário de Ronin é Kage no Shima, que pode ser traduzido como Ilha das Sombras. É uma ficcionalização do Japão Edo, completa com um xogunato, um misterioso clã ninja, monges de batalha, castelos assombrados por demônios e muito mais. Este território está sob o manto de um eclipse perpétuo, onde há constantemente escuridão. O mundo está prestes a acabar e, embora o povo de Kage no Shima possa ter descoberto isso, eles não sabem como ou quando o fim chegará.


De acordo com a aparência e a sensação do cenário, tudo é sombrio em Kage no Shima e está piorando. Guerra, fome e a devastação de demônios hediondos cobraram seu preço. É miserável nesta ilha, e pode-se argumentar que a morte será uma bênção quando chegar. Embora a honra e a tradição tenham seus lugares, as circunstâncias aqui exigem que a sobrevivência venha primeiro.

Mas não imaginem terem tudo pronto com essas páginas sobre o cenário. Ele não está aprofundado em detalhes. Esses são deixados para o Mestre resolver, o que é bom. Os jogadores não precisam saber os detalhes de nenhum cenário, a menos que seja específico para seu personagem ou para a história. Isso já é uma premissa da linha Mörk Borg. Mas como tudo, há aqueles detalhes incríveis que fazem dele sensacional. Estou falando do Calendário Sombrio.

O Calendário Sombrio é uma ótima forma de determinar para onde o cenário está indo. Numa série de círculos concêntricos há 66 marcações de eventos que seguem a linha de “o mundo está caminhando para seu derradeiro fim”. Esses eventos serão rolados pelo mestre e ocorrerão ocasionalmente (e não se repetirão), cada um durando um certo período de tempo.



Temos desde “O céu, já escurecido torna-se completamente negro por três dias e três noites. Todas as luzes tremulam e apagam, deixando todos em uma escuridão inescapável.” Até um “Vendavais varrem as vilas carregando espíritos malévolos consigo”. Dependendo de quanto tempo você espera que sua campanha dure, ocasionalmente rolará dados para ver se algum evento cataclísmico atingirá Kage no Shima. Se isso acontecer, os eventos podem ser grandes ou pequenos, mas sempre significativos, aumentam de intensidade até que o sétimo evento ocorra: o apocalipse. Isso traz aquela dose saudável de inesperado e surpresa para apimentar sua campanha e fazer tudo mudar de uma hora para a outra.

A criação de personagens básicos pode ser resumida em uma coleção de equipamentos e habilidades aleatoriamente rolados. Não há compra pontual, mas também não há classes. Você ganha o que ganha e um personagem básico normalmente terá (ou poderá ter) uma morte rápida. Nas regras opcionais há a indicação de escolher uma classe (ou rolar para pegar uma delas aleatoriamente) e rolar dentro de suas tabelas específicas. Temos as classes Ronin Esquecido, Samurai Erudito, Monge Bêbado, Shinobi Corrompido, Onmyoji, Bakuto, Yamabushi, Dançarino Indomável, Sumô Imprudente e Santo da Espada. É uma boa coleção de opções. Elas funcionam da mesma forma que qualquer classe em qualquer sistema influenciado por D&D. Elas têm modificadores para testes de habilidade, então cada uma tem pontos fortes e fracos e diferentes níveis de Pontos de Vida, etc. Mais importante, porém, elas têm Características. As Características são habilidades especiais que apenas as classes possuem. Por exemplo, em Ronin Esquecido, o personagem poderia ser um mestre da espada que pode infligir bônus de dano ou ter uma habilidade particular de aparar. Ele pode até ter uma katana amaldiçoada com um gosto pelo sacrifício de sangue. Depende do que você escolher ou rolar.


Uma das coisas interessantes sobre os Borgjogos é como eles refletem alguns aspectos do clássico primeiro D&D enquanto pegam emprestado de edições posteriores. Atributos são uma dessas coisas. Os jogadores rolam 3d6 para Rapidez, Espírito, Vigor e Resiliência, mas jogam o resultado depois de fazerem uma referência cruzada em uma tabela que lhes dá um modificador. Rolagens médias (9-12) não geram modificador. Rolagens excepcionalmente altas ou baixas podem ter um modificador de +3 ou -3 anexado. O que isso significa? Bem, vamos pegar Rapidez como nosso exemplo. Ela governa rolagens relacionadas a defesa, equilíbrio, natação, fuga e coisas do tipo. Ao resolver uma tarefa com um d20 contra um número alvo que se deve exceder (parece familiar?), aplica-se o modificador à rolagem. Isso pode fazer ou quebrar uma situação para um PJ.

Outra coisa que personagens precisam determinar em suas fichas de seus personagens (tendo ou não uma classe) é sua Honra. Honra é uma rolagem de 3d6. Personagens com um resultado maior que 10 são honrados, enquanto aqueles abaixo não são. Isso não significa que eles não podem tender na direção oposta, não importa o que rolem, e esse número muda durante o jogo, mas dá a você uma noção de onde seu personagem está na escala cármica logo no início. Cada uma das classes tem qual código de honra segue e elas são descritas detalhadamente em uma seção específica. Honra tem mais aplicabilidade do que apenas ser um elemento interpretativo. Ela impacta a geração de personagens mais tarde em uma campanha. Jogadores cujo personagem honrado morre recebem bônus para aplicar ao seu novo personagem. Jogadores que deixam seus personagens caírem em território desonroso sofrem penalidades ao gerar um novo personagem.

Adorei isso... Ao rolar um novo personagem, adiciona-se +1 às rolagens de pontuação de habilidade se o último personagem foi honrado, mas recebe -1 se desonroso. Essa pequena, mas significativa mudança pode fazer a diferença entre um bom personagem substituto e um péssimo. Mas existe uma última maneira de restaurar a Honra se um personagem não se saiu bem: seppuku. Assumindo que um personagem é bem-sucedido no ato do seppuku (é preciso um teste de Resiliência e Espírito), ele recebe 2d6+2 em sua Honra. Isso (provavelmente) o levará acima do limite de 10 e permitirá que ele faça um personagem com um bônus para rolar.

Gosto desse tipo de mecânica que mescla a preocupação do depois com a preocupação das ações no agora.


Como parte do processo de criação, você também rola para Virtudes, que são a meta-moeda deste jogo. Você não terá mais do que duas Virtudes para começar, então sua habilidade de alterar a dinâmica do jogo é limitada. Isso não significa que elas sejam inúteis. Ronin, como outros jogos da linha Borg, podem depender da utilização criteriosa desse recurso.

Seguindo em frente, chegamos ao equipamento, que todo mundo adora. Compras! Exceto que o primeiro lote de equipamento depende da sua classe. Você só rola se tiver escolhido fazer um personagem "personalizado". E se você teve a sorte de obter uma quantia decente de dinheiro antes ao rolar seu personagem, você pode escolher na lista de equipamentos e armas.

Algumas classes recebem Textos, essencialmente pergaminhos mágicos, embora filtrados pelas lentes culturais japonesas. Por exemplo, eles podem transformar sua arma em uma marca ardente ou lançar luz sobre uma área. Os usos do texto são limitados. Todo dia, rola-se Espírito+4 para saber com que frequência se pode usar um texto. E quando esse texto é usado, faz-se um novo teste de Espírito para determinar se funcionou corretamente. Aqueles que erram esse teste perdem Pontos de Vida e ficam tontos e com uma condição por um tempo. Aqueles que rolam uma falha crítica (um em um d20) devem consultar a tabela A Vingança do Kami onde a reação espiritual a esse erro é detalhada. Que tipo de reação espiritual? Que tal isso? “Seus ossos ganham senciência e malevolência. Em momentos de estresse, eles se torcem e se contorcem dentro de você, causando dor insuportável e sangramento interno por d4 de dano.” Então a sugestão é – não falhe criticamente!

Você pode se perguntar o que significa fazer rolagens de d20 e adicionar ou subtrair modificadores. Isso, como tudo no jogo, é simples. A maioria das tarefas tem um Nível de Dificuldade; rola-se um d20, aplica-se modificadores e obtém-se um resultado. Igual ou maior ao valo do nível de dificuldade é um sucesso; menor que isso é um fracasso. Tirar 20 significa um sucesso espetacular, enquanto 1 pode potencialmente dar vida aos seus ossos (heheheheheh). O nível de dificuldade é quase sempre 12, embora isso possa variar.

Posteriormente somo apresentados às regras para combate. Iniciativa é uma rolagem simples de um d6. Atacar usa Vigor contra um nível de dificuldade 12. Ataques à distância usam Espírito contra dificuldade 12 também. Defender usa Rapidez contra 12. E Aparar (que pode ser utilizada uma vez por combate ao invés de usar Defesa) usa Resiliência contra 12. Doze é um número mágico aqui e Mestres não rolam dados para essas coisas. O sucesso depende dos jogadores. Ocasionalmente, o Mestre rola para coisas como Moral para ver se os oponentes fogem, mas na maioria das vezes, a rolagem de dados é restrita aos jogadores. Acertos Críticos causam dano duplo. Sucessos críticos ao rolar defesa permitem um ataque livre. Ao aparar, um sucesso crítico causa dano duplo ao inimigo e reduz sua armadura em um nível.


A armadura em Ronin não é ablativa, mas tem algumas dessas propriedades. Cada peça de armadura tem um Nível, e esse Nível depende de quão eficaz ela é. A armadura de Nível 1 é algo como armadura de kendo, que é basicamente apenas acolchoamento. Ela reduz o dano em d2. A armadura de samurai é de Nível 2 e impede dano d4. Há também a armadura de Nível 3, mas é incômoda e afeta negativamente as jogadas. Quando alguém perde um nível, isso significa que a armadura está danificada e fornece menos proteção. No entanto, as regras não dizem se as penalidades associadas a armaduras mais pesadas ainda se aplicam. Eu considero que sim. Uma vez que a armadura é reduzida ao Nível 0, ela é inútil e deve ser reparada ou substituída.

Duelos são algo interessante nesse RPG. As regras de duelo são uma maneira mais envolvente de resolver o combate do que jogadas diretas. Os participantes escolhem entre alguns movimentos — Ataque, Bloqueio, Contra-Atacar — e tentam pensar melhor e manobrar melhor que o oponente. Isso só entra em jogo quando um jogador incorre em uma ação que desonre um NPC e sua família, já que os duelos podem restaurar a honra do vencedor. O interessante que esse elemento de Duelo ocupa apenas duas páginas, mas pode ser um elemento incrivelmente interessante e determinante numa campanha.

Quanto à evolução do personagem? Ele não ganha experiência para ficar “melhor”? Não... quase sempre ele vai morrer! Falando sério, talvez seu personagem tenha sorte e dure um pouco mais e nesse caso o Mestre pode ter pena de você como jogador e lhe dar um avanço do personagem. Isso é feito inteiramente a critério do Mestre, então não há pontos de experiência. Você ganha um avanço quando ganha. Para ser justo, um personagem que é "subido de nível" pode ficar bem forte. Você rola 6d10; se o total exceder o PV atual do seu personagem, ele ganha d6 PV adicionais. Isso pode ser um grande negócio, já que alguns personagens podem começar com apenas 1 PV.

Um aumento ainda mais considerável está nos valores de atributos. Rola-se um d6 para cada atributo, e se for maior que o número atual — -3 a +3, lembra? — o modificador é melhorado em um passo, potencialmente até +6. No entanto, se um personagem vive o suficiente para atingir +6 em qualquer habilidade, ele deixa de ser um Ronin.

Personagens também podem treinar para receber um bônus de +d2 em uma habilidade relacionada. Então, por exemplo, um personagem pode treinar com um grande sensei fazendo coisas como pegar moscas com pauzinhos à lá Senhor Miagui, eventualmente ganhando um bônus de +d2 em Rapidez. Mas isso só pode ser feito uma vez e nunca mais até para não banalizar e desequilibrar a proposta deste RPG. Um personagem precisa aprender com um professor por 2d6 dias antes de fazer um teste de dificuldade 12 contra a estatística relacionada. Claro, o teste pode falhar, e o tempo é desperdiçado.

Como já dissemos anteriormente, Virtudes são a meta-moeda do jogo, permitindo que os personagens inflijam o máximo de dano ou repitam um ataque falho. Uma das suas propriedades mais valiosas é negar um erro crítico. Personagens, em geral, começam com duas Virtudes e podem recuperá-las após seis horas de descanso. Você pode ganhar uma Virtude escrevendo um haiku no personagem, representado por um teste de Espírito contra dificuldade 12.


Para finalizar o personagem, pode-se rolar em algumas tabelas opcionais para obter peculiaridades e traços de caráter. Elas variam de dentes enegrecidos e podres a uma necessidade obsessiva de limpar suas armas e armaduras. Talvez seu personagem colete orelhas e sussurre segredos para elas. Ou talvez seja caçado por um monstro aterrorizante que não pode derrotar. As consequências de rolar nessas tabelas são muitas e variadas.

Personagens em Ronin podem e vão morrer. Muito. Mas alguns podem retornar para lutar outro dia porque cada personagem que morre vai para um reino inferior chamado Yomi, onde eles enfrentam um demônio em combate individual. Se o personagem derrotar o demônio, ele retorna à vida. Se não puder, então ele é devorado. Se o combate for particularmente difícil e os personagens estiverem caindo como moscas, eles aparecem em Yomi juntos e podem se unir contra o demônio, ganhando assim suas vidas de volta. Os personagens só podem retornar de Yomi uma vez, o que parece bem apropriado para não banalizar os perigos e a morte.

A maior parte do resto do livro é composta por criaturas e inimigos explicitamente projetados para matar seus personagens. Alguns, como os Bandidos, são relativamente fáceis de derrotar. Outros, como o temível Daimyo Esqueleto, têm uma tonelada de PV (40) e armadura pesada, são resistentes a praticamente qualquer magia que você possa imaginar e podem ressuscitar a si mesmos. Sim, um Daimyo Esqueleto aniquilará seu grupo.

O final do livro tem, em duas páginas, o resumo de todas as regras, que é completo, fácil de ler e bem-organizado. Jogadores que nunca tocaram em Ronin antes podem pegar essa folha e pegar o jogo em minutos.

Impressões finais
Penando que Ronin vem de Mörk Borg, em muitos aspectos ele é um exemplo perfeito de como um jogo deve ser adaptado de um sistema existente. Ele tem os elementos que você espera conhecer e amar, mas acrescenta diferença suficiente para que seja reconhecível como algo próprio.

Todos vão gostar de Ronin? Se você é fã de regras para cada detalhe e que nos obrigam a revisitar o livro básico à cada dois minutos para decidir como agirm, provavelmente não vai gostar. Ronin é um jogo de simplicidade e detalhes. Eu não quero deixar você com a falsa impressão de que Ronin não é nada além de um moedor de carne (desde que os dados cooperem). Há elementos suficientes, como o sistema de Honra, Virtude e de Combate, para agradar e muito os jogadores. O ponto em Ronin é como sobreviver em um mundo à beira do fim, onde a vida anda literalmente sobre o fio da navalha e quando temos apenas nossa honra, história pessoal e uma espada para nos guiar.

Corra e apoie financiamento coletivo de Ronin (AQUI) e aproveite a emoção na ponta da espada!

 

[Fontes de apoio: excertos de reviews variados - RPGpub, EnWorld, GeekNative - e leitura comentada de PDF cedido pela editora]

 

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