Evolução da Fabricação
de Espadas
Para todos aqueles que acham
que ter uma espada, fosse em uma aventura de fantasia de rpg fosse na história
real, era coisa corriqueira, pode esquecer. Produzir uma espada é uma das
amostras do desenvolvimento do pensamento humano, e a evolução da metalurgia é
um dos avanços mais importantes da humanidade, influenciando tanto a
geopolítica quanto a produção e subsistência.
História
Como já vimos anteriormente a
espada pode ser dividida, em última análise, em duas partes principais – lâmina
e guarda. Quando falamos da história de sua produção vamos nos centralizar
basicamente na evolução da fabricação das lâminas e principalmente no material
usado para essa fabricação.
Historicamente a espada é vista
como a evolução natural de uma adaga, mas ainda há muito controvérsia com
relação à linha divisória que teria feito o homem criar uma ferramenta mais
longa. Analiticamente há dois pontos centrais que as dividem. O primeiro deles
é, claro, o comprimento com a lógica de que com um maior comprimento da lâmina,
maior dano será causado pela lâmina. Arqueólogos e estudiosos de armas dizem
que podemos considerar as adagas com no mínimo 45 cm (18 polegadas) de
comprimento e as espadas com no mínimo 60 cm (24 polegadas) de comprimento. O
segundo é a funcionalidade principal, visto que a lâmina tem a função
perfurante, enquanto a espada tem a clara função de corte.
Por lógica as adagas aparecem primeiro,
junto com a concepção tecnológica para produzi-las. Esse salto tecnológico foi
um desenvolvimento das armas de pedra (lascada e polida) que tinham um
limitante tanto possibilidades de trabalho, manuseio e resistência. Com o
início do seu desenvolvimento temos adagas com lâminas menores. Conforme a
técnica foi se aprimorando a lâmina das adagas foram sendo alongadas. Em algum
ponto tivemos uma divisão onde lâminas foram alongadas a ponto de terem outra
função principal e, a partir daí, coexistiram, mas com histórias próprias.
Esse ponto de ruptura ainda é
um enigma, pois à cada descoberta, e a partir dos conceitos utilizados, vamos
jogando a data mais e mais para trás. Atualmente o grande debate seria se a
peças encontradas nas escavações Aslantepe (Turquia), e datadas entre 3000-3250
a.C., são ou não espadas. Caso sejam, serão as espadas mais antigas já encontradas.
De qualquer forma já é uma interessante expectativa de tempo.
Nessa primeira e longínqua fase
as espadas eram feita de cobre.
Metal mais maleável e de certa forma abundante, ele já era usado em outros
tipos de ferramentas, inclusive adagas. Podemos dizer que ele foi o ponto de
partida natural, mas com um problema sério. O cobre é tão maleável que mesmo
lâminas de adagas facilmente se deformavam, além de terem pouca resistência.
Mesmo com esse problema não podemos desdenhar de sua importância pois as
primeiras técnicas de alongamento das lâminas só foram possíveis por seu grau
de maleabilidade, criando know-how para a metalurgia incipiente.
Muitos historiadores colocam
justamente no tipo de metal um divisor para as primeiras espadas. Muitos reforçam
que só podemos considerar espadas quando elas começam a ser produzidas em
bronze, por volta de 1600-1700 a.C. nas regiões do Mar Negro e Mar Egeu.
O bronze
é uma liga (materiais com propriedades metálicas composto por dois ou mais
elementos) composta por cobre (maior parte) e estanho. Não podemos esquecer que
é um momento histórico de efervescência tecnológica e a experimentação foi a
base para muitos dos desenvolvimentos da metalurgia. Não sabemos ao certo qual
o ponto em que foram levados à testar o bronze como metal para espadas, mas
sabemos que essa liga já era muito utilizada em um sem número de outros
utensílios e equipamentos. Conforme o local do mundo e o grau tecnológico da
sociedade tínhamos ligas com mais estanho (cerca de 20% de estanho gerando cobre
mais duro, como na região da hoje atual China) ou com menos estanho (cerca de
10% de estanho gerando cobre mais maleável, entre o Mar Negro e o Mediterrâneo).
Essas ‘primeiras’ espadas
tinham comprimento entre 50 a 88 cm (20 a 35 polegadas) e com lâminas no
formato de folhas. Podemos dizer que tamanho e formato estão intimamente
ligados. Conforme a lâmina alongou, ela teve que adaptar um formato que lhe
concedesse menor possibilidade de flexão. O resultado mostrou-se muito
satisfatório não sendo alterado até os séculos 12 a 13 a.C., quando tivemos a
ascensão do ferro.
A fundição do ferro requereu um novo salto
tecnológico. Sendo encontrado com certa facilidade, ele exigia altíssimas
temperaturas, temperaturas essas só possíveis com o desenvolvimento de
proto-fornalhas e do uso do carvão. Por que o uso do carvão é tão importante?
Não se poderia conseguir a temperatura com lenha apenas? Não. O minério de
carvão é composto por ferro, oxigênio e impurezas. Quando o carvão é usado em
altíssima temperatura, ele produz um agente redutor sob a forma de carbono e
monóxido de carbono que se ligam ao oxigênio, deixando o ferro puro e
produzindo, como efeito, dióxido de carbono, ao mesmo tempo que introduzia
pequenos traços de carbono no ferro fundido. Aula de química à parte, este é um
salto tecnológico que só é possível com um longo e lento desenvolvimento da
metalurgia.
O ferro era fundido, formando
uma massa porosa (chamada Bloom ou ferro-gusa). Ele era então martelado em
ciclos de aquecimento e resfriamento até atingir a consistência desejada.
Podemos dizer que o longo período de uso do bronze foi devido, principalmente
ao aprimoramento dessa técnica ao longo de muita experimentação.
Com o aprimoramento da técnica
de manuseio do ferro e a percepção de suas propriedades nos equipamentos
criados, possibilitou espadas mais longas. Mas esse processo de alongamento das
lâminas de ferro levou certo tempo. Por um longo período histórico as lâminas mantiveram
o mesmo formato de folha e o mesmo comprimento. O alongamento começou como
necessidades utilitárias já no meio do império romano, como forma de adaptação
à introdução dos cavalos aos exércitos.
Justamente o próximo passo da
evolução tecnológica da metalurgia de espadas veio com a compreensão de que
adicionar carbono ao ferro produzia uma liga ainda mais resistente e leve – o aço. Mas a dificuldade de controle fino
do quanto e como adicionar carbono gerou um período com enorme variação de
qualidade das espadas, mas mesmo assim, todas elas muito superiores às suas
antecessoras.
Novamente tivemos um longo
período de experimentação devido à incapacidade de compreensão real do processo.
A produção do aço, diferente do ferro por endurecimento pelo trabalho (ciclos repetitivos
de uso do martelo com aquecimento e resfriamento), consistia no endurecimento
por resfriamento rápido (técnica que reduz a formação de cristalização dentro
da lâmina, enquanto aumenta a integridade estrutural do metal). Essa
especificidade era ignorada, produzindo assim aços de diferentes qualidades e
fazendo que o seu uso fosse melhor compreendido e utilizado apenas da Idade
Média.
O Trabalhador
Algumas confusões, e até mesmo
erros conceituais, acontecem quando nos referimos às pessoas que trabalham com
metais num ambiente real ou de fantasia. Vamos fazer alguns esclarecimentos
então.
O cuteleiro é a pessoa que trabalha com
cutelaria (a arte de produzir ferramentas cortantes e armas brancas em geral).
Já o ferreiro é o artesão que
trabalha com forjaria (a arte de produzir utensílios de ferro). O ferrador é o artesão que trabalha com
ferraria (arte de produzir e aplicar ferraduras). Então não espere encontrar um
ferreiro produzindo espadas de ferro nem um cuteleiro que só produz cutelos.
Nem tentem pedir a um ferreiro para colocar as sapatilhas metálicas em suas
montarias. O cuteleiro era um profissional extremamente especializado e
habilidoso. Seus trabalhos eram reconhecidos e lhe trazia sempre bons frutos e
status. Sua figura, como a dos outros dois artesãos, estava associada à
ferramentas tais como a forja, a bigorna, o martelo, a tenaz e o cinzel. Com
elas ele poderia ingressar na vida da nobreza mesmo sem perder seu status de
plebeu.