Analisando Regras:
Criando
personagens
Há
muito tempo que digo que criar um personagem não se restringe em conhecer
regras e decifrar tabelas dentre muitos e muitos livros. Lógico que o
conhecimento das regras é fundamental para a transposição do personagem para o
papel e para a sua utilização no jogo. Mas para sua construção, em Mutantes e
Malfeitores, que é nosso alvo aqui, temos coisas mais importantes ainda – o
conceito.
Um
personagem, tal qual uma pessoa, possui íntimas particularidades que fazem dele
único, ou melhor, o destacam na multidão. Em critérios de M&M, como na
grande maioria dos sistemas, nós criamos um personagem baseados em uma série
regras que atribuem à ele habilidades físicas e mentais, conhecimentos,
aptidões, dons, capacidades de combate/defesa e, claro, poderes. Em M&M
existe uma gama tão grande de livros e possibilidades que quase tudo o que
imaginarmos poderá ser colocado ou simulado em uma ficha de um personagem
próprio ou de uma adaptação e muitas vezes um simples detalhe cria um
personagem totalmente novo, mesmo que usando os mesmo elementos.
Em
mais de um artigo aqui mesmo na Confraria de Arton eu já expliquei da
importância de usarmos Feitos, Extras e Falhas para ampliar nosso espectro de
possibilidades na construção de um personagem. Pois bem, a questão é – como
perceber onde aplicar tais elementos para criarmos um personagem único ou com
personalidade própria? Aqui entra o ‘conceito’.
A
construção de um personagem requer que saibamos como ele será, não importando
se será uma adaptação ou não. Para isso temos que compreender como a sua
mecânica particular funciona, como ele se portará ou como queremos que ele se
porte. Duas perguntas básicas são a
chave disso.
Como
é sua estrutura de funcionamento?
Gosto
de começar por aqui. Com essa questão tento delimitar como o personagem
funcionará, se baseado em habilidades (atributos básicos), conhecimento &
treino (feitos e perícias) ou em poderes. Com essa simples questão respondida
já temos um bom caminho percorrido para a montagem do personagem e sabemos onde
começar a nossa construção.
Vamos
à um exemplo prático. Um personagem será muito forte, e isso pode aparecer por
muitos motivos em M&M. A partir do quão forte ele será influenciará, um
pouco pelo menos, na construção do personagem. Ele pode ter treinado, como um
halterofilista ou um agente de forças especiais; ele pode ter sofrido
alterações devido à um soro, como o Capitão América; ele pode ter nascido
assim, como Thor e Hércules; ou mesmo ele pode ficar assim devido à alguma
modificação fisiológica, como n caso do Hulk. A força enorme do Homem de Ferro
só é possível devido ao uso de uma armadura. E ainda existem muitas outras
possibilidades. Isso já nos dá a noção de por onde o personagem poderá ser
diferenciado dos outros e onde essa diferença irá aparecer. Estamos iniciando a
delimitação de seu conceito.
O
Hulk teria sua Força descomunal ligada à uma alteração de sua forma. Já o
Capitão América teria sua força permanentemente ativada, mas ligada à existência
do soro do supersoldado. Já Thor teria sua enorme força ligada diretamente à
Habilidade Força em um grande nível. Para vocês verem, três exemplos de personagens
com grande força baseados em possibilidades diferentes. Mas vamos começar de
forma prática com o Capitão América.
Por
que o personagem funciona assim?
Uma
pergunta que pode parecer banal, mas que tem todo o sentido. Se um personagem
possui uma mecânica baseada em algo adquirido de fora para dentro (elementos
externos como equipamentos ou treinamento) ou internos (mutação ou de
nascença). Por exemplo, o Capitão América tem sua força baseada em um soro
testado nele durante a Segunda Grande Guerra. Essa força está permanentemente
ativa, pois o soro está permanentemente ativo. Mas nada impede que esse soro
seja extraído dele ou que ele receba um antídoto. Ao mesmo tempo sabemos que
esse soro deu outras características especiais para o personagem como maior
agilidade, rapidez, imunidades, longevidade, resistência etc. Então delimitamos
que esse soro é fonte de uma série de características mais ou menos
interligadas onde a perda de uma acabará acarretando na perda de todas. Está
mais do que na cara que isso requer o uso de um Repertório de poderes, que
interligará todos ele à um básico, mas que quando travado o soro, afeta todos.
Isso
é muito diferente do Homem-Aranha, por exemplo, que teve sua estrutura alterada
após a picada de uma aranha radioativa, mas que acabou causando uma mutação
nele. Ou seja, ele foi alterado permanentemente. Neste caso de Peter Parker as
suas alterações, embora todas ligadas à um evento em comum, agem de forma
independente dentre dele e na construção de sua fica poderíamos colocar cada
característica como um poder independente.
Com
essas duas primeiras questões resolvidas já temos um norte para seguir. Sabemos
onde dar mais ênfase em nossa criação ou onde nos preocuparmos mais. Depois disso
só é necessário delapidar aqui e ali. A colocação de Feitos de Poder, Extras e
Falhas se encaixarão de forma muito mais perfeita com esta diferenciação
determinada.
Um
erro comum que temos na construção de um personagem é olharmos para o poder ou
para a característica especial de nossa construção e esquecermos que o
personagem em si é um sistema todo interligado. Talvez nos casos de dispositivos
especiais não faça tanta diferença, mas mesmo assim, uma boa interpretação dos
poderes do dispositivo trarão melhores efeitos no jogo.
E
depois...
Depois
desses dois primeiros passos vamos adiante no entendimento do personagem. O que
ele conhece ou sabe fazer (perícias e feitos). Um personagem pode ter muita
força e não por isso ser um bom lutador ou então não ter a capacidade de criar
muito dano, ou ainda ao contrário, mesmo com apenas um certo grau de força
causar um grande estrago. O capitão América tem uma força bem maior que a de um
humano normal. Mas, além disso, ele é bem treinado. Como esse treino independe
de seus poderes eles serão agregados ao personagem em si como Feitos. Se esse
treino ou feitos dependessem do poder para serem usados ou aparecerem, eles
estariam ligados ao poder em si.
Um
contra-ponto de exemplo aqui seria o Demolidor. Ele possui poderes fora do
comum devido à um acidente com elemento radioativo que lhe tirou a visão, mas
lhe conferiu uma espécie de radar. Com
isso ele possui uma mira extraordinária. Quanto mais ele treina, melhor ele
fica, mas no momento que esse ‘radar’ for retirado dele, seu treinamento e toda
a evolução que ele teve de nada adiantarão. Aqui temos o claro exemplo de um Feito
(que pode ser Tiro Preciso ou Acurado) ligado apenas à sua estrutura de
poderes.
...e
mais!
Outro
exemplo prático e que muitos se perdem tem haver com a relação
ataque-dano-poder-eficência na hora da criação ou adaptação do personagem. Nem
sempre o melhor ataque garante o maior dano o a melhor eficiência. Da mesma
forma um alto nível de um determinado poder não garantem um bom ataque ou dano.
Temos que pensar também no conceito para ter isso claro. Uma boa forma disso é
perguntarmos como o ataque afeta o adversário.
Se
nosso personagem acerta quase sempre seus ataques, significa que ele tem um
alto nível de ataque, mas não significa que ele cause mais dano com isso. Da mesma
forma, se um personagem acerta com dificuldade, não significa que quando ele
acerte não seja extremamente poderoso. Outra possibilidade é que o ataque de um
poder, mesmo sendo baixo, pode ser muito significativo se não puder ser salvo.
Leve
essas noções em consideração na hora de construir seu personagem. Muitas vezes
uma simples adesão de feitos à um equipamento ou poder já resolve.
Terminando
Esse
assunto poderia dar muito pano para manga e consumir páginas e mais páginas com
debates. O certo é que temos que ter uma boa construção de conceito de nosso
personagem para que nosso resultado final seja o mais próximo possível do que
imaginamos ou de uma adaptação desejada. Perca alguns momentos pensando sobre a
mecânica do personagem e só depois comece a rascunhar a ficha!