Lendo
dias atrás um artigo curto, mas muito elucidativo, sobre a dinâmica das
tendências em RPG me lembrei de uma conversa com alguns colegas à muito tempo.
Na época muitos deles eram iniciantes e debatíamos sobre o uso das tendências.
O
debate surgiu pois jogávamos na época D&D e GURPS. O primeiro, como todos
devem saber, usando as tendências para direcionar a interpretação e o modo de
ser dos personagens e o segundo sem este dispositivo de forma clara.
Eles
reclamavam que o personagem, ou pelo menos sua interpretação, ficava como que
‘engessada’ em D&D pela necessidade de seguirmos a tendência estabelecida.
O mesmo, aparentemente, não acontecia nos jogos de GURPS.
As
tendências surgiram (corrijam-me se eu estiver enganado) em Dungeon &
Dragons. Elas são parâmetros morais, éticos e de convivência que os personagens
seguem no seu modo de ser e de se relacionar com o mundo. Ora, como nossos
personagens são em última análise ‘representações’ que pretendemos que sejam
reais precisamos de algum parâmetro para regrar a forma como elas interagirão
com o mundo que os cerca.
Uma necessidade
Seria
muito fácil tomarmos atitudes que nos beneficiariam em prol de não sofrermos
uma morte terrível ou uma participação desastrosa numa aventura. Seria muito
melhor realizarmos pequenos deslizes intencionais que nos fariam contornar
situações perigosamente mortais ou para amenizar relacionamentos para ganharmos
alguma informação importante.
Mas
esta não é a intenção do RPG ou pelo menos sua prática, não é mesmo? Além da
diversão pura, é claro, o RPG leva seus participantes à vivenciarem a
experiência de assumirem o papel de um ‘outro’ sejam ele quem for – de
cavaleiro medieval à explorador espacial, passando até por caçadores de
recompensas no velho oeste e sobrevivente de um mundo devastado. Não importa o
ambiente (cenário), a verdadeira diversão do RPG está no realismo da
experiência que vivemos.
Neste
sentido a participação pode ser mais ou menos realista. Mas mesmo havendo
diferença no realismo o certo é que algum parâmetro deve haver.
Qual
seria o sentido de uma prática (jogo) que tem seu cerne na vivência de uma
realidade que não é a nossa, se justamente o que fazemos não é vivenciarmos
essa realidade fantasiosa, mas apenas entrarmos em um cenário e moldarmos ele
conforme nosso desejo?
Como
já disse aqui e em outros artigos – o principal, em RPG, é sempre a diversão.
Mas se estamos procurando a experiência de vivenciarmos uma outra realidade de
forma realista não tem sentido não sermos realistas. Mas então você me
pergunta: mas se estamos procurando realismo, como vivenciar isso em mundos de
fantasia ou ficcionais? Então vamos esclarecer esse realismo.
Quando falamos em realismo estamos falando
sobre relações humanas (ou mesmo extraterrestres ou qualquer outra raça) entre
si e com a comunidade e o mundo em que estão inseridos. Certos parâmetros
sustentam isso não importando o cenário que está sendo jogado. Sempre haverão
regras claras para as sociedades e não importa qual a conduta que seguem, os
personagens podem ou não se adequar à elas.
Nisto
é que entram as tendências. Elas mostram o quanto um personagem está ou não
adequado com essas regras sociais e de que forma ele se relaciona com os outros
membros da sociedade em suas relações com o seu mundo.
Em
verdade todo o membro de uma sociedade passa por essa inter-relação, não
importa se real ou fantasiosa. Acho até que o que é tão atrativo na prática do
RPG é justamente a possibilidade de recriarmos essas relações sociais sem o
perigo de represálias conforme nossas ações.
Assim
as tendências são imprescindíveis para o sucesso de nossa diversão. Sem ela a
própria relação entre os jogadores e dos NPCs com os jogadores perderia muito
de seu brilho e acabariam se tornando mecânicas.
Além
disso, a própria prática da interpretação das tendências é uma diversão à parte
para qualquer rpgísta. Essa prática nos aprimora os entendimentos de
ação/reação, as capacidades de relação com o diferente, além de ser hilário, em
muitas ocasiões, ver nosso personagem indo para o buraco por aquilo que ele
“não pode” deixar de dizer ou fazer.
Não
estava, nesta primeira conversa, tentando ensinar como interpretar uma
tendência em especial, mas apenas salientar sua importância. Em outras
postagens iremos debater sobre cada uma das tendências!