Manter o ritmo em RPG
Manter o ritmo de uma aventura não é tarefa fácil para qualquer mestre, mas também não é nenhum desafio intransponível e pequenos detalhes podem fazer a diferença. Muitas vezes o ritmo é afetado pela própria ação dos personagens e a atitude do mestre é primordial para superar isso. Um grupo de jogadores, embora bem intencionado, pode travar um jogo à ponto de quase paralisar as ações ou mesmo fazer com que uma seção, prevista para um encontro, dure dois ou três.
Algumas
dicas são simples e quase não influenciam na diversão. Outras servem para
ensinar os jogadores alguns limites próprios do hobby.
Vasculhando uma casa
Quem
nunca passou por uma situação dessas em jogo? Um grupo de aventureiros invade
uma casa à procura de uma determinada pessoa. Eles a encontram, quase sempre a
matam, e vasculham seus aposentos. Até aí tudo normal. Até mesmo a procura de
objetos é normal, pois é uma boa forma de se adquirir riquezas e encontrar
objetos mágicos. Mas o que deveria ser uma busca por algo útil acaba sempre se transformando
numa verdadeira pesquisa forense. Cada fresta, cada canto, cada sombra é
vasculhada e olhada pelo menos duas vezes por cada membro do grupo. Móveis são
arrastados para procurar passagens secretas e o chão é despedaçado na procura
de alçapões escondidos. Em resumo, uma verdadeira baderna de algumas horas é
criada pelos aventureiros. Enquanto isso o mestre permanece pacientemente (o
que não era o meu caso hehehehe) repetidamente respondendo às questões dos
personagens - “nada aí!”, “aí também não!”, “você não encontra nada”, “a parede
é firme!”, “não, você não pode cavar o chão abaixo do piso!” - e por aí vai.
Essa
ânsia dos aventureiros até que não está errada, mas está tirando o foco do jogo
em si, além de estar trancando o seu ritmo. O mestre tem aqui dois problemas.
Primeiro, ele deve manter o ritmo. Segundo, ele não pode parecer um carrasco
desumano que corta o barato de seu grupo. Como sempre digo, na maioria de
minhas postagens sobre regras e jogabilidade, o bom senso é o melhor remédio, às
vezes mais do que simplesmente seguir as regras. Se pensarmos bem os
aventureiros não estão ferindo as regras com sua minuciosa procura, mas isso
está atrapalhando o jogo. O ideal é ser lógico.
Como
mestre você já deve ter uma boa noção do que o grupo irá encontrar naquela casa
do exemplo acima. Apresente os cômodos conforme os aventureiros vasculhem a
casa, sem exagerar no mistério. Muito da ação dos jogadores deriva de pequenas
falhas ou vícios dos mestres. Claro que você não precisa ser desleixado com a
narrativa, mas guarde detalhes em excesso para os momentos apropriados. Quanto
à procura dos jogadores por objetos ‘valiosos’ os mestres devem ser rápido
sempre que possível. O mestre deverá permitir que o grupo vasculhe a casa como
um todo ou seus cômodos em separado. Faça um teste simples contra uma CD baixa.
Quanto maior o sucesso mais coisas eles terão encontrado. Todas aquelas coisas
usuais tais como armas simples, peças de armadura de couro velhas, livros e
utensílios ou qualquer outra coisa que existam normalmente numa casa, poderão
ser listados de uma vez só para o grupo como se eles tivessem vasculhado e
encontrado sem maiores dificuldades. Se houver um objeto importante, à ponto de
valer à pena ser escondido, o mestre já deverá ter isso pronto (pelo menos a
maioria tem isso pronto com antecedência). Para esses casos sim a CD deverá ser
bem maior, proporcional à qualidade ou valor do objeto. Mas o mestre deve ser sutil
no teste e não transparecer a qualidade do que o grupo pode ou não encontrar ou
aí sim que eles não saem mais daí.
Se
o grupo insistir em permanecer na casa, vasculhando, continue usando a lógica.
Quanto mais tempo eles permanecerem em uma casa ‘sem serem convidados’ maior será
a chance de serem flagrados por alguém. A decisão de como fazer isso depende do
mestre e do sistema que está sendo utilizado, mas o tempo gasto deve ser
revertido em algum contratempo para o grupo.
Ações exageradas
Lembro
de uma das minhas primeiras aventuras que mestrei com meus irmãos. Eles estavam
entrando sorrateiramente em uma vila no meio da noite. Um deles teve a
brilhante idéia de sair cortando orelhas e pendurar no pescoço (muitos anos
antes do Daryl em The Walking Dead). Ele perdeu um tempão fazendo isso. Depois
disso ele queria sair pela rua como se nada de estranho tivesse acontecido e
como se o tempo não tivesse passado. Ele aprendeu amargamente que isso não é
possível.
Da
mesma forma que o exemplo da casa, aqui o grupo perde tempo de mais fazendo
algum, como podemos dizer, ‘estúpido e sem sentido’. Isso embora possa parecer
diversão está tirando o ritmo do jogo.
Nesse
caso nada melhor do que a boa e velha lei de ação e reação. Coisas como essas
podem ser facilmente ‘solucionadas’ colocando o grupo para colher os frutos de
sua imprudência com a perda de tempo. Use da imaginação e coloque o grupo em
uma situação delicada (ou à beira de uma situação delicada) por causa de suas
atitudes.
Voltando para cidade
Outra
situação irritante é quando o grupo acaba de passar por alguma situação que
lhes rendeu algum dinheiro e eles chegam em uma cidade (até mesmo uma vila). Na
ânsia de adquirir itens que lhes traga mais poder ou proteção eles percorrem
cada canto da cidade atrás de lojas e mercadores e averiguam cada mercadoria
que eles possuem.
Neste
momento também é muito fácil do grupo se esquecer da aventura e começar um
verdadeiro passeio pelo supermercado para comprar e adquirir coisas novas.
Aqui
tenho duas sugestões. Deixem esses momentos para o final da seção. Essa atitude
simples já ajuda a manter o ritmo até o momento de chegarem na cidade. Daí a
compra poderá ser até mesmo meio informal. Quando isso não é possível seja
sucinto. Faça com que a procura seja rápida e faça com que eles saibam o que
tem para vender sem muito mistério. Ou seja, não criem quinhentas lojas e as
esconda pela cidade. Pressuponha que as lojas estejam dispostas normalmente nas
ruas. Raciocine que se houver alguma loja com artigos misteriosos ela será
única e o grupo só a encontrará com algum rumor na taverna ou no mercado.
Mesmo
cidades comerciais, como o caso de Vectora no cenário de Tormenta, possuem uma
ou outra loja especial descrita. Nas outras pressupõe-se que encontremos coisas
usuais ou sem tão grande valor e qualidade. Descreva as lojas especiais ou de
renome e nas demais não se preocupe.
Encerrando
Como
disse no início temos que ponderar e usar a lógica para manter o ritmo. Essa
quebra de ritmo é muito diferente daquela situação em que o grupo tangencia o
foco da aventura ou sai atrás de uma pista errada – mas isso será tratado em
outra postagem. Seja criativo e justo. Mostre ao grupo como um bom ritmo pode
ser a diferença entre uma aventura emocionante ou uma chatice!