sábado, 11 de outubro de 2008

Por mares nunca antes navegados
Parte 2 - A aventura inicia -
João Eugênio Córdova Brasil

V. Chifres

A porta foi jogada, espedaçada, sobre Slocun, lançando-o a uns bons três metros. Todos ficaram atônitos. A impressão que tinham é de que acabara de haver o estouro de uma manada e que o primeiro touro começara a sair. De dentro surgiu uma criatura – só assim que eles conseguiam descreve-la – enorme e veloz.

De início acharam estar enfrentando alguém de Tapista. Mas logo em seguida perceberam alguns traços diferentes. Mas não tinha tempo para pensar nisto, e nem a criatura daria este tempo a eles. O enorme oponente manteve seu caminho na direção do capitão. Logo atrás dele saíram dois homens e outros dois seres tão surpreendentes quanto o primeiro.

As pistolas armadas, em número de duas, deram uma boa vantagem à tripulação do Gaivota deixando os dois homens inertes no chão logo após atravessarem a porta. Restavam só as “criaturas”. Uma delas dava a nítida impressão de terem colocado a cabeça de um leão sobre o corpo de um homem. O outro parecia muito com Garas, embora seu porte fosse muito menor e menos intimidador. As suas vestes eram claramente de um filho do mar e praticante da pirataria.

O homem, com a cabeça de leão, jogou-se para a esquerda caindo sobre dois marinheiros. Sua velocidade deixou-os perplexos. De suas mão brotavam garras tão afiadas quanto uma boa faca amolada à exaustão. Ele feriu os dois rapidamente, não mortalmente, mas o suficiente para deixa-los sem possibilidade de continuarem lutando. Para ele só restou Tary.

Do outro lado, para o caminho que seguiu o homem com a cabeça de lobo, a contenda teve outro rumo. Ele estava mais interessado em fugir do que em lutar. Também veloz, conseguiu desviar dos golpes e estocadas dos marinheiros e correu em direção da floresta. Três marinheiros o seguiram por indicação de Syan. Ninguém queria mais companhia que esse infeliz poderia chamar.

Na beirada da praça Slocun levantou-se a tempo de desviar da corrida de seu enorme opositor. A pistola já estava fora de alcança, postada a muitos metros, no chão. Restava-lhe o sabre, o que não o deixara nem um pouco triste.

- Então os vermes estão deixando seus buracos? – brandiu o enorme animal desembainhando igualmente o sabre.

- Ora, ora, ora...então sabes falar. Não esperava mais do que um “mu”!!!

- Sei o suficiente para fazer uma prece por sua alma ao grande indomável.

- Por que tanta rabugice, o pasto destas redondezas não te agradaram? Ou será que perdeu-se do rebanho?

- Quem perderá algo aqui é você e será este sorriso da cara. Depois será a vez de seu mestre, Garas – e saltou em direção ao capitão Slocun.

Muito embora estivesse longe de ser um homem pequeno Slocun tinha grande agilidade. Movia-se com leveza e rapidez dignas de um elfo. A estocada desferida pelo seu opositor veio com enorme força. Com certeza o teria atravessado até a empunhadura da arma, se o tivesse atingido. Mas ter força e ter rapidez para atingi-lo eram coisas bem diferentes.

Ele ficou parado esperando que o enorme taurino se preparasse novamente. O segundo golpe foi mais violento ainda que o anterior, mas um leve desviar de Slocun o fez ir ao chão como uma árvore tombando.

Joshua permanecia com a mesma calma irritante. No rosto havia um ligeiro sorriso que de tão sutil poderia levar a irritação o mais calmo dos clérigos de Lena.

- É como dar agulha e linha para um orc. Tem-se certeza que te ensinaram a usar este espeto que tens nas mãos – brincava Slocun.

- Cala-te verme...e lute.

- E preciso? Se tu levasses este contenda a sério eu até me daria ao trabalho de levantar meu sabre. Mas contra ti nem de arma necessito.

- Quero ver se manterá esta ladainha quando eu matá-lo – e avançou para o terceiro golpe esbravejando impropérios.

Mas desta vez Slocun não se manteve tão evasivo. Com um pequeno passo desviou o suficiente para deixar a imensa massa corpórea de seu opositor passar em desabalada. Fez, ainda, um pequeno movimento com o sabre – tão rápido quanto imperceptível. E um filete de sangue nasceu no braço desarmado do taurino.

A dor fria do aço fez a raiva cegar o oponente de Slocun. Os golpes eram desferidos para todos os lados com grande velocidade. Mas não o suficiente para acertar o capitão do Gaivota. Em cada golpe Slocun desviava com graça e aplicava um contra-golpe sutil e certeiro. Ora no ombro, ora no braço, os golpes eram sempre seguidos de pequenos pontos de sangue. O enorme pirata de cabeça de touro já mostrava sinais de que as forças o estavam abandonando.

- Eu desistiria agora. É uma morte estúpida, mesmo para alguém como você. Vamos lá. Desista e quem sabe um dia eu lhe ensino a lutar como um verdadeiro homem....pirata....touro....ou o que quiser que você seja.

Mas a resposta veio com um salto em sua direção.

- Maldito seja..... – gritou apontando o sabre e os chifres.

Slocun deu um ligeiro riso de canto de boca e girou o corpo. Quando o homem-touro parou já estava com o capitão à suas costas segurando seu sabre trespanssado-o em seu peito. O filete de sangue agora escorreu de seus lábios e seu corpo deixou-se cair de joelhos. O combate estava encerrado.

- Você não consegue lutar de boca fechada? – gritou Syan enquanto terminava de aplicar os últimos curativos em um de seus companheiros.

- É mais forte do que eu... – responde Slocun mesclando sua resposta com uma risada disfarçadamente irônica – Todos estão bem?

- Os ferimentos foram profundos, mas dei conta do recado com esses dois.

- Não tive muitos problemas também – gritou Tary enquanto limpava sua adaga na perna da calça.

- E aquele que fugiu... – mas antes de Slocun terminar a pergunta, de uma moita à sua frente, saíram os dois marinheiros arrastando o corpo do infeliz fugitivo sem vida.

Mas em terras desconhecidas cada sombra esconde uma surpresa e o aparente silêncio foi novamente cortado. Agora por um som sussurrado e sutil. Só tinham certeza de que ele vinha de dentro do casebre que abrigara os oponentes animalescos.