quarta-feira, 18 de março de 2009

Polêmica sobre a Dragon Slayer

A POLÊMICA DA DRAGON SLAYER
João Brasil

Pois é. Fazia tempo que eu não colocava um post de “Opinião”, mas dada à polêmica dos últimos dias eu resolvi contribuir.

Para todos entenderem o caso. Um dos maiores veículos de debate sobre RPG no Brasil é o Fórum Jambô. Tudo relacionando à RPG (e afins) é discutido, criado e debatido por ali. Pois bem. A revista Dragon Slayer, como sendo a única revista dedicada inteiramente ao nosso amado hobby, é um dos alvos dos olhos atentos e inquiridores dos fãs. Este é um ponto.

O outro ponto vem lá dos Estados Unidos. Como todos sabem a Wizards lançou no meio de 2008 a nova versão do maior sistema de rpg do mundo. O lançamento da 3ª edição do Dungeons and Dragons foi um divisor de águas para a prática do RPG ainda no início da década. Com o lançamento da edição 3.5 muitos ajustem foram feitos e alguns equívocos sanados, mas de qualquer forma, o sistema conhecido por d20 foi reforçado em todos os sistemas. Além disso, e também inovador, foi a prática do licenciamento para qualquer cenário das regras.

Diga-se de passagem é, na minha opinião, um sistema perfeito para o RPG. É a síntese de tudo o que os jogadores achavam aqui e ali, mas nunca tinham num só lugar. Não é por acaso o tamanho do seu sucesso.

Quando a DS inaugurou suas atividades o sistema d20 estava em plena atividade. O cenário Tormenta, se utilizando do sistema d20, era o cenário mais jogado no Brasil. As principais cabeças pensantes da DS – entre eles o Trio Tormenta, idealizadores do cenário Tormenta – nunca esconderam (e isso desde os tempos em que estavam na Dragão Brasil) sua preferência pelo sistema lançado na 3ª edição.

Com o lançamento, em 2008, da 4ª edição do D&D houveram duas mudanças cruciais no sistema. Uma delas tem relação com o sistema de licenças para uso das regras da nova edição nas editoras detentoras de cenários que desejem utiliza-las. A segunda modificação, e que gerou muitas polêmicas até agora, foi a mudança radical do sistema, em D&D 4ª.

A Dragon Slayer sempre foi uma publicação centrada em Tormenta (embora uma de suas grandes iniciativas tenha sido o criação de Moreania), uma revista para jogadores do cenário, com suporte para o cenário. Com isso, e por isso, o sistema lançado até a edição 3.5 de D&D sempre esteve, também, nas páginas da DS. Dar suporte para Tormenta é, mesmo que indiretamente, discutir as regras da D&D.

O que aconteceu, então, foi natural. Com o andar das edições mensais (ou não) da DS sempre tivemos presente o sistema d20. Mesmo quando adaptações nos eram apresentadas – tal como a adaptação de Full Metal ou do Evangelion – eram baseadas no sistema da edição 3.5. Alguns apontamentos, pequenos artigos ou comentários mais longos são feitos sobre outros sistemas, mas mais como curiosidade ou apenas apresentação de novidades.

Com o lançamento da 4ª edição muita coisa mudou na cabeça do pessoal. Vamos ver os dois pontos da discórdia. Antes vou deixar claro que não irei discutir a qualidade ou não do sistema apresentado na 4ª edição. Isso fica para os “especialistas”.

A grande maioria dos jogadores de RPG no Brasil – como no mundo – utilizavam a edição 3.5 de D&D (claro que muita gente também se utiliza de 3d&t também eheheheheh). Foram anos de utilização em mesa nos mais variados cenários e ambientes imagináveis. Criou-se uma cultura de utilização desses sistema para RPG. Não foi por acaso que sistemas interessantes como GURPS e storytteler foram caindo para segundo plano.

Uma grande empresa, como a Wizard, se preocupa em tentar sempre fazer um material melhor do que o anterior. É quase uma obsessão. Eles conseguiram discernir no mercado em constante evolução que é aquele ligado ao seu público alvo – que se esbaldam em quadrinhos, games, filme e cultura pop – uma modificação muito acentuada.

A 3ª edição (e a edição 3.5 acompanhando-a) foi mais uma grande evolução ainda da AD&D. Erros discutidos, ampliações feitas, anos de experiência em mesas de jogo avaliados. Tudo isso contribuiu em muito para a produção dela. Era o necessário para um jogo de sucesso naquele momento.

Para a 4ª edição muita coisa mudou. Primeiro o sistema já era um sucesso e havia atingido patamares de complexidade ímpares. Segundo o público havia mudado. A enxurrada de modas nipônicas representadas por mangas, animes etc, a febre dos games de última geração, o dinamismo dos filmes desde Matrix. Tudo isso criou um outro tipo de público. E a Wizard levou tudo isso em conta para a produção.

Tudo isso foi levado em conta pela Wizard para a produção da 4ª edição.

Então o que temos aqui? A DS tem uma opinião formada com relação à 4ª edição. Eles não gostam e ponto. Claro que não é algo tão curto e grosso assim, mas não estou aqui para discorrer isso. Essa posição da DS tem sido fortemente criticada pelos participantes (não todos, é claro, mas uma parte representativa) do Fórum Jambô.

Os críticos acham um absurdo essa posição. Para eles uma publicação como a DS, principalmente por ser a única no estilo nas bancas, deveria ter uma opinião mais flexível sobre o assunto e suprir seus leitores de material que sirva de suporte para seus jogos. Eles acham que a revista deveria ter o mesmo tipo de interesse e preocupação dispensado para a época da edição 3.5. Em contrapartida a DS não muda de opinião e, até que algo mude, não dará suporte para a 4ª edição.

Há posição certa ou errada aqui? É um tema e discussão difícil. Eu entendo a posição de alguns leitores da DS e usa frustração com a falta de interesse dela em relação à 4ª edição. Eles ficaram meses esperando o novo lançamento e agora que o tem nas mãos sentem-se órfãos.

Mas ninguém pode censurar a DS pela sua posição. Existe uma coisa que chamamos de coerência. Algo muito pouco aplicado na maioria das publicações no Brasil. Essa coerência é o que fez com que a DS se tornasse uma referência em RPG – e a única – no Brasil. A coerência da DS é seguir uma linha de pensamento (ou linha editorial) baseada em suas concepções. Eles avaliam produtos e publicações baseadas em suas noções, preferências, gostos e experiências. Em cima disso criam opiniões.

As pessoas se enganam quando acham que compram uma revista porque ela escreve o que elas querem ler. Esse engano é comum. Na verdade compramos pois nos identificamos com a linha editorial da revista. Mas temos de ter a consciência de que isso não acontece em cem por cento dos casos – divergências podem acontecer. E acho que estamos num caso de divergência aqui.

Os leitores têm de ter consciência de que uma revista não pode (e não deve) simplesmente se vender à modas ou novidades para agradar seu público. Deve ser fiel primeiramente à suas opiniões. Se alguém estiver de acordo ótimo, se não estiver não custa nada um pouco de flexibilidade. Flexibilidade esta que deve vir do leitor e não da revista. Também não devem e não podem achar que os editores da revista simplesmente são pessoas cabeças-duras e que não dão apoio por não quererem dar o braço à torcer.

Uma resposta para aquela pergunta? A resposta é que uma revista deve manter sua linha, desde que com coerência. Que o leitor pode e deve discordar da linha editorial de qualquer publicação, desde de que não queira impor seu gosto, ou desde que não queira que a revista mude conforme seu desejo.