terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Diários de Campanha - Kult: Divinity Lost - Mists Around the Lake – Sessão 1 a 3



Diários de Campanha
Kult: Divinity Lost
Mists Around the Lake – Sessão 1 a 3

Eu estava devendo à algum tempo um diário de minhas sessões. Diários de sessões de RPG são ótimos, pois ao mesmo tempo em que ilustram o andamento da mesa em si, servem como referência do sistema jogado. Não prometo regularidade, mas farei o possível. Esse primeiro será mais longo, pois apresentarei o sistema, o cenário e personagens, além de uma prévia das sessões anteriores.

A sessão dessa semana foi nosso sexto encontro jogando Kult: Divinity Lost. Para quem não conhece o título, Kult é um RPG que teve sua primeira edição lançada em 1991 pela Metropolis Ltda e que está hoje em sua quarta edição, lançada em 2018 pela Modiphius. Ele será lançado no Brasil em português em breve, pela Burô Brasil. Em poucas palavras ele é um cenário de terror que lida com temas extremos ligados à maldade pura, violência e abuso, interligados com o misticismo, o sobrenatural e o psicológico dos personagens. O jogo em si é uma jornada ao autoconhecimento do personagem... e essa visão não será agradável.


Mas em linhas gerais os seres humanos já foram deuses e um ser poderoso conhecido como Demiurgo acabou com isso, prendendo a humanidade e sua consciência em uma ilusão. Essa ilusão é nossa realidade e serve como nossa proteção contra as criaturas existentes, seres que nos vêem quando os vemos. Então o Demiurgo começou a desaparecer e a ilusão começou a rachar. Hoje o Demiurgo se foi, a consciência da humanidade está se ‘rebelando’ contra a fé e os Arcontes - os servos todo-poderosos do Demiurgo - ficam ocupados tentando nos manter sob controle.

A verdade é que o mundo ao nosso redor não é o que imaginamos. Ele é uma mentira e toda a humanidade está presa em uma ilusão que nos esconde o que realmente existe à nossa volta. A realidade é terrível, sóbria, macabra e com o odor férreo do sangue. Apenas alguns de nós, aqueles com mentes e consciências mais rebeldes, percebem flashes da verdadeira realidade. Aqueles detalhes que não compreendemos com exatidão, mas que nos incomodam o inconsciente. Estamos presos numa percepção que não é a nossa e sair desses grilhões nos levará à realidade, à verdade... e à inevitável loucura. Precisamos acordar, por pior que isso seja.

Os personagens são pessoas despertas ou em processo de despertar desta ilusão. Elas estão ligadas à fatos de seu próprio passado, pecados inomináveis de eventos que estão perdidos ou apagados em seus íntimos. Esses fatos precisam ser resgatados e expiados acima de toda a ilusão que os cerca. Kult é a procura de nossos demônios pessoais onde somos os culpados ou a luta efetiva contra essa ilusão que cerca à todos. Como bem diz no livro básico, os personagens são subitamente despertados de um “sono” e percebem que suas vidas são uma mentira e, conforme a realidade se desfaz peça por peça, eles começam a enxergar o verdadeiro mundo à sua volta. Um mundo de horrores.

Em nosso jogo em si, nossos personagens estão no processo de despertar e, por isso mesmo, estão em um movimento pendular entre realidade e pesadelo, enquanto eles tentam compreender o que se passa. A mecânica de Kult é o PbtA (Powered by the Apocalipse) e ela é perfeita para esse tipo de jogo e traz experiências ainda maiores para mim como jogador. Um cenário desse tipo, entre perturbador e de autoconhecimento, casa perfeitamente bem com narrativas e interações profundas e alongadas, dramas pessoais e compartilhamento de cenas, coisas que estão acima de mecânicas puramente físicas. Conforme o jogo progride e temos ‘sucesso’, fragmentos de nosso pesadelo pessoal nos é revelado.

Pelo que já devem ter percebido Kult é um RPG que necessita de cuidados. Ele é perturbador, pesado e desconfortante. Sua temática, a história e seu andamento são um desafio. Ele realmente não é um jogo para todos e requer cuidado ao ser narrado ou em sua participação. Mesmo folhar o livro pode ser desconfortante para a maioria devido à suas belíssimas, mas perturbadoras, imagens. Suas cenas podem conter elementos gatilho para muitas pessoas e requer extrema atenção do mestre e comunicação entre mestre e jogadores antes e durante o andamento das sessões.