quinta-feira, 12 de março de 2015

Morre Terry Pratchett


Morre Terry Pratchett
(1948 - 2015)

Mais uma morte significativa no mundo da cultura pop e nerd. Faleceu agora a pouco o escritor britânico Terry Pratchett, um dos autores mais aclamados das aventuras de fantasia. Suas obra mai conhecida era a série de livros Discworld, publicados desde 1983 até 2011, totalizando 39 obras, entre tantas outras.


Resenha: Belonave Supernova volume 2


Belonave Supernova volume 2
- Resenha -

Fazer uma resenha nunca é fácil. Ficamos com medo - pelo menos eu fico já que é uma tremenda responsabilidade – de cometer alguma injustiça, de entender errado algum ponto ou de não ter percebido a profundidade de algo. Mas no caso de “Belonave Supernova volume 2”, de Alexandre Lancaster, lançado pela editora Jambô, foi ainda mais difícil, pois quero conseguir passar para os rpgístas tudo o que eu senti ao lê-lo.

Sou de um tempo arcaico do RPG no Brasil, se é que se pode dizer isso. Naquele tempo passávamos horas inventando e criando nossas aventuras em cima de livros dos poucos livros importados ou xerocados que dispúnhamos. Algumas vezes nos valíamos de aventuras de algum mestre conhecido nosso ou de algum revista importada que por obra do acaso chegava à nossas mãos.

O tempo foi passando e tive o privilégio de acompanhar o surgimento de muitas revistas nacionais de RPG onde a saudosa Dragão Brasil perdurou por mais de cem edições. Tínhamos afinal um local para achar aventuras, mesmo que nem sempre de forma tão periódica, mas ainda assim uma referência. Quando uma aventura começava em uma edição e terminava em outra nós subíamos pelas paredes de alegria e estufávamos o peito para dizer que era uma aventura ‘enorme’.

O momento seguinte, já após o nascimento do cenário de Tormenta, na mesma Dragão Brasil, foi quando recebemos em mãos uma publicação inteira em forma de uma única aventura onde os jogadores teriam que atravessar duas dezenas de labirintos para libertar uma tal deusa aprisionada. Foi épico. Meses de jogos, alguns personagens mortos e muita diversão.

Mais tarde tivemos o surgimento de uma nova revista, Dragon Slayer, chegando cheia de gás com todo um cenário e algumas aventuras. E então a Jambô mostrou sua cara, crescendo como uma das maiores editoras de RPG do Brasil, assumindo de vez o cenário Tormenta e nos suprindo com aventuras e mais aventuras seja nas páginas da DS, no seu próprio site/blog ou nas publicações como as “Só Aventuras”.

Toda esta longa introdução foi necessária!

Posso dizer com convicção que estamos atravessando hoje mais uma barreira, dando um significativo passo com o lançamento de “Belonave Supernova volume 2”.

Eu tive o privilégio de receber, assim como outros editores de blogs, uma edição em primeira mão para avaliar. Confesso que realmente esperava algo grande desde que havia terminado a leitura do primeiro volume. Consegui ser surpreendido mais uma vez, algo que não é fácil depois que atingimos certa idade.

Vou colocar aqui, de forma bem didática minhas conclusões tomando o cuidado para não dar spoilers e tentando fazer jus à qualidade do produto.

Por muito anos, como mostrei nos parágrafos acima, fomos servidos da melhor forma que era possível pela revista Dragão Brasil no que diz respeito à aventuras prontas para RPG. Posteriormente tivemos a memorável “A Libertação de Valkaria” com suas mais de cento e vinte páginas de puro dungeon em uma corrida desenfreada para salvar a deusa. Depois tivemos o lançamento da revista Dragon Slayer que continuou nos provendo de aventuras até culminar com as edições do “Só Aventuras” para Tormenta RPG pela editora Jambô


Mas em todos esses casos tínhamos a disponibilização de aventuras de um certo tipo e natureza. Normalmente eram lineares, sempre heróicas e diretas. Quase sempre curtas para serem introduzidas em uma campanha criada por algum mestre. No caso da LdV a aventuras era, com toda a certeza, enorme, mas proporcionalmente linear. Não é uma crítica qualitativa, de forma alguma, mas uma constatação da infância do RPG produzido no Brasil e de uma adequação ao espaço disponível mo mercado.

Com o lançamento de “Belonave Supernova volume 1”, e agora o lançamento de seu término, tivemos uma alteração substancial disso em dois pontos. Primeiramente ele é aparentemente linear. Como toda a aventura de RPG é necessária uma espinha dorsal, um fio condutor, no sentido de interligação causa-efeitos dos acontecimentos. Mas a imposição de linearidade termina aí. Os 26 capítulos da aventura, 13 neste segundo volume, representam episódios de um grande arco. Embora eles tenham um plot inicial, introduzido ou não no capítulo anterior, podem ser transcorridos de muitas formas diferentes, todas elas influenciando de forma substância os capítulos vindouros. Se no primeiro volume isso não era tão percebido, neste segundo isso pula em nossa cara nos assustando e trazendo o interminável mantra “...se eu não tivesse feito isso lá atrás!”

O sentido de causa e efeito é muito mais palpável do que já visto em outras aventuras. Isso trás à luz dos jogadores uma coisa que nem sempre eles se dão conta – da importância dos atos. Normalmente, e de forma equivocada, nossos jogadores estão acostumados à simplesmente seguir a aventura sem muito raciocínio e de forma quase automática. Eles querem o prazer do final épico. Mas isso não acontece em “Belonave Supernova volume 1”. Aqui os aventureiros são levados à apreciar e vivenciar a beleza e complexidade da jornada. Cada inside realizado juntando peças da aventura os leva a um outro patamar de entendimento do todo, e não um simples final apoteótico medido pelo nível de seu personagem.

Em segundo, temos aqui uma forma de ver e lidar com os personagens diferenciada. Eles são levados a se questionarem sobre seu papel dentro da história, sobre o quão importantes e fundamentais eles foram/são e o que realmente significa ser um herói em todo o peso que o termo carrega.

Colocando esses dois elementos juntos e unindo com a vivência plena da aventura e estaremos vivendo não um jogo, mas tendo experiência rpgística.

Este segundo volume continua com algo que me agradou muito já no primeiro volume – os tipos de personagens. É impressionante a quantidade de tipos de personagens que cabem ou podem ser utilizados em uma aventura como esta. Isto concede ao mestre uma gigantesca variedade de NPCs possíveis, enriquecendo ainda mais a ambientação da aventura.

Os capítulos (ou episódios) são construídos de forma prática e sem elementos desnecessários dando muita margem para que a dinâmica dos personagens ache seu próprio roteiro, mas sem nunca perder o foco na aventura em si. Isso possibilita, mais uma vez, a fuga da linearidade objetiva, mas sem perder o fio condutor da aventura.

Se você curtiu o combate entre batalhões de Hussardos e Lanceiros no Episódio 5 do primeiro volume, teremos novamente as mesmas emoções neste segundo volume, no capítulo 17. É um outro nível de emoção e diversão.

Da mesma forma que no voluma anterior o autor apresenta considerável material na forma de dicas para auxiliar o mestre em desmembrar tramas, dramatizar situações, explorar detalhes e prolongar situações, tudo isso para possibilitar uma maior imersão e diversão de cada episódio.

A aventura em si é desafiadora como todo verdadeiro “herói” merece. Não imagine chegar ao final de cada capítulo ileso, seja física ou mentalmente (pelo menos para aqueles que aproveitam a imersão à fundo). Além disso, nada será fácil, sejam combates ou insides sobre a trama. Tudo vai requerer muita dedicação dos jogadores e, sobretudo, do mestre.

Para finalizar temos uma excelente escolha de ilustradores que de forma enxuta não poluem o livro e, ao mesmo tempo, conseguem dar o tom exato de cada episódio. Diferentes em seus estilos, mas convergentes em seus conceitos, as artes transmitem exatamente o que esperar ou vivenciar em cada episódio.


Mas não por isso tudo que eu apresentei até o momento que considero o “Supernova Belonave Volume 2” (e vamos pensar no conjunto dos dois volumes) como um novo patamar das aventuras de RPG nacionais. Mas ele trata os jogadores de uma forma nova. À muito que batalho pelo fato de que temos que qualificar o RPG e seus jogadores e isso não é sinônimo de menos diversão, e este livro prova muito bem isso. Ele pretende uma aventura que faça os PCs pensarem e sentirem, desejando e possibilitando uma imersão completa dos jogadores dentro de seus papéis.

Daí você pode me questionar: mas os jogadores estão prontos para isso? Não estão prontos ainda e mesmo muitos mestres não o estão. Não temos tido interesse, como mestres e jogadores, e também não havia acesso à campanhas com este intuito. Mas isto não é algo que se consiga do dia para a noite, mas apenas jogando e jogando aventuras cada vez mais desafiadores (neste sentido de imersão) e qualificadas. Claro que qualquer tipo de mestre e jogador poderá usar essa aventura e ainda assim se divertir muito sem grandes problemas, mas para vivenciar a profundidade esperada pelo autor, requer um pouco mais de cuidado e zelo. Algo que qualquer grupo e mestre podem tentar. Perceberam que em nenhum momento da resenha eu comentei o sistema, diga-se de passagem 3d&T, ao qual esta aventura se pretende? Isso foi proposital, pois seu conceito e importância vão além de meros sistemas, são divisores de águas.

Esse é o ponto que transforma esta aventura em uma corajosa iniciativa tanto do autor Alexandre Lancaster quanto da editora Jambô. Já estava na hora de termos acesso à algo deste nível para que nossos rpgístas possam ir além do simples ato de jogar percorrer uma aventura e chegar ao seu fim.