quinta-feira, 9 de abril de 2009

Entrevista da Confraria

A Confraria entrevista
Rogério Saladino


Na quarta entrevitsa da Confraria de Arton temos o prazer de conversar com Rogério Saladino. Ele, como a maioria deve se lembrar, é um dos membros do Trio Tormenta. Por muito tempo foi participante da revista Dragão Brasil, além de ter participado das revistas Dragon Magazine e Dragon Slayer e ainda ter trabalhado como tradutor de algumas reconhecidas obras de RPG. Mais recentemente Rogério Saladino assumiu a editoria dos títulos Marvel da Panini. Vamos dividir nossa conversa em dois temas, principalmente - RPG e MARVEL.

Sobre RPG

1 – Para começar, sem ter a menor pretensão de ser original, gostaríamos que nos contasse como foi sua história particular com o mundo do RPG. Como iniciou suas andanças pelas mesas de jogo e como foi se desenvolvendo a vida de RPGista?

Rgs. Nossa… faz um tempinho. Comecei a jogar em 1991, num evento de Star Trek que um amigo ajudou a organizar. Eu já sabia que RPG já existia antes, e também era um grande fã da série de livros Aventuras Fantásticas, de Steve Jackson (o outro) e Ian Livingstone. Comecei com GURPS (incrível, não?) e em seguida passei a jogar AD&D, e não larguei mais… Com o tempo, na época que eu ainda estava cursando a faculdade de Jornalismo, na Cásper Líbero, acabei entrando em contato com o pessoal da Abril Jovem que estava desesperado porque tinham que fazer uma revista de RPG, mas não conheciam ninguém que entendesse sobre isso. Fui entrevistado e fiquei como editor da Dragon Magazine por dez edições. Nesse período, eu conheci boa parte do pessoal que trabalha com RPG no Brasil (uma parte eu já conhecia, era um antigo freqüentador da Devir, quando ela importava mais quadrinhos do que RPG). Nisso conheci também o Marcelo Cassaro, e tínhamos uma boa relação de amizade. Sinceramente, não acredito nessa de “ele é editor da revista concorrente, então tenho que odiá-lo com todas as minhas forças”. Isso é uma besteira enorme. Quando saí da Abril, o Marcelo me convidou para trabalhar com ele. Fiquei com ele por um tempão e o resto imagino que o povo já saiba. Participei de traduções de livro com a Devir (Ravenloft, meu cenário favorito, traduzi o Domains of Dread), de projetos com o pessoal da Gibiteca Henfil, fiz trocentas matérias para a DB, participei da criação do cenário Tormenta, dei um monte de sugestões para Holy Avengers, participei de uma pá de eventos… ufa! Hoje estou um pouco afastado, mas ainda escrevo suplementos para Tormenta e eventuais matérias para a DragonSlayer. Quando sobra tempo, claro.

2 - Em algumas oportunidades disseste que era fã de Forgotten Realms. De que forma este cenário influenciou tua visão sobre Tormenta?

RgS. Hmmm... essa é meio complicada de responder. Para mim FR é o meu estilo padrão de RPG, então a minha forma de ver Tormenta está permeada com esse estilo. Claro que eu jamais cairia na besteira de conscientemente fazer versões artonianas de personagens, monstros, eventos, organizações ou quaisquer outros elementos característicos de FR. Sempre vi Tormenta como uma oportunidade de colocar idéias legais num cenário igualmente que pudesse ser usado para praticamente qualquer tipo de campanha. Talvez a fato dos dois cenários serem enormemente versáteis possa ser vista como uma das maiores e principais influências de um no outro.

3 - Quando o Trio Tormenta começou a conversar sobre a criação do cenário tu, particularmente, achaste que chegaria onde está hoje – o mais bem sucedido cenário totalmente nacional de RPG? Onde acha que ele ainda pode chegar?

RgS. Pra dizer a verdade, não. Eu achei que seria muito bom pra revista, pra gente escrever sobre um cenário específico, que poderíamos nos divertir mais e fazer histórias mais interessantes para os leitores, com mais espaço para trabalharmos. Em alguns momentos, cheguei a imaginar que alguns elementos precisariam de tempo para ficarem realmente interessantes, para que os jogadores usassem e depois a gente evoluísse a coisa, mudando partes aqui e ali para ficar ainda mais bacana e propiciasse aventuras mais emocionantes e/ou chocantes. Não sei até onde pode chegar o cenário, principalmente porque não parei muito para pensar sobre isso a longo prazo. Prefiro me concentrar mais em resolver alguns pontos e pensar em outras novidades para se desenvolver.

4 - Cassaro forjou Mestre Arsenal. Trevisan criou o Crânio Negro. Qual o vilão que recebeu tua atenção especial (ou personagem), ou qual o vilão que gostaria de ter criado para o cenário?

RgS. Uma vez comentei com o Cassaro que eu só fiz coisa do mal para o cenário. E “mal” com “M” maiúsculo. O deus Szaass, Mzzileyn, alguns sumos-sacerdotes bem malvados… Não tenho nenhum personagem que gostaria de ter escrito ou feito para o cenário, pois nunca fui impedido de escrever nada. Muito pelo contrário, o Cassaro pedia é mais, para a gente escrever mais o tempo todo. Tenho liberdade para escrever o que eu quiser, desde que não conflite com o trabalho dos outros, então é bem capaz de aparecer no futuro mais vilões, personagens, monstros e elementos escritos ou desenvolvidos por mim.

5 – Um grande projeto, à certa altura, foge das mãos do criador e começa à andar sozinho. Tormenta cresceu tanto que a atividade dos fãs gera novos elementos, personagens, linhas e aventuras inéditas e originais à todo dia. Sabemos que o RPG se presta bem para isto. Como tu vês iniciativas como a do projeto Aliança Negra, que gerou um volume muito interessante sobre uma região pouco abordada até aquele momento, e outros tantos projetos que estão em fase inicial tal como o projeto Deserto da Perdição, ambos dos participantes do Fórum Jambô?

RgS. Como eu disse antes, estou um pouco afastado e não tenho acompanhado com a devida atenção as iniciativas novas dos fãs, o que acho uma pena. Mal consigo responder em tempo hábil os recados no meu perfil do Orkut. Eu até precisaria dar uma olhada no Deserto da Perdição, porque tenho algumas idéias para a região e queria muito ver o que os leitores estão esperando de lá.

No mais, esse tipo de iniciativa e de apoio dos fãs integra a enorme massa de incentivo que eu encontro por aí, na internet, nas mesas de jogo, nos encontros e nos eventos. É por conta de coisas como esses dois projetos que eu me sinto ainda mais motivado a continuar escrevendo e criando pro cenário e para RPG. Isso é que me mostra que tem muita gente que gosta do que eu escrevi, e que pede por mais. Compensa todos os momentos ruins que passei como profissional, compensa e muito.

6 – Acho que ninguém nega que a trilogia do Leonel, ambientada em Arton, foi uma ótima materialização de todo o universo de Tormenta. Quais as tuas opiniões sobre a trilogia?

RgS. O Leonel é um excelente escritor, e eu não canso de me surpreender com ele. E não é porque ele escreveu um livro de “fantasia de RPG”, não. É porque ele escreveu três livros formidáveis. O leitor não precisa ser fã de RPG, jogador ou etc. para curtir o que ele escreveu, basta gostar de fantasia medieval. Ou nem isso até. Um certo problema com quem escreve livros baseados em cenários de RPG é que acabam falando só pra quem já curte o hobby, esquecendo que é bom a gente conseguir mais leitores. Já li um moooonte de romances publicados pela TSR/Wizards (todos de Ravenloft, praticamente todos do R. A. Salvatore e muitos, muitos sobre Underdark, drows e mortos-vivos), e digo sem a menor sombra de dúvida, que o Leonel pode figurar tranquilamente entre esses autores.

7 - O que pretende ainda realizar ou contribuir para o cenário de Tormenta? Continua trabalhando ativamente em Tormenta ou as tuas atividades extra-RPG impedem?

RgS. Não tenho a menor intenção de largar o cenário de Tormenta ou deixar de escrever para RPG. Tenho alguns projetos, algumas idéias e algumas coisas que quero escrever, matérias, suplementos, livros e outros. Mas o tempo agora é um pouco mais escasso, por isso não vou anunciar nada para não furar em seguida. O bom é que como eu não tenho prazos, posso fazer esse material com calma, detalhados e etc.

Sobre Marvel

8 - Atualmente tu está como editor da Marvel na Panini. Como foi trocar o mundo editorial do RPG pela potência que é a Panini e a Marvel? O que contou mais, para tua experiência, para ajudar a chegar à Panini - já ter participado de revistas de sucesso como a DB e a DS ou ter feito parte de um projeto de sucesso como Tormenta?

RgS. Essa troca foi… curiosa. Sempre quis trabalhar com quadrinhos, até mesmo antes de começar a escrever para RPG. O trabalho é bem diferente, apesar de ter alguns pontos meio parecidos ali e aqui. Tem muita coisa para fazer e cuidar (acho que “cuidar” é a palavra mais certa, deveria estar na definição de editor), muitos personagens, cronologia, terminologia, respeito pela obra de outro autor… coisas assim. Acho que o que pesou mais na minha contratação foi a experiência com revistas, a forma escrevo, como encaro o trabalho, afinal, eu sou um jornalista que trabalha (e sempre trabalhou) com veículos de comunicação social, voltados para públicos específicos, com necessidades igualmente específicas. Também tem o fato de que eu sempre tento manter ao máximo uma postura profissional em tudo que faço. Acho que deve ter ajudado… Participar da criação e do desenvolvimento de Tormenta também ajudou, já que é uma excelente forma de mostrar como você escreve, como você cria, edita e etc. Mais fácil do que chegar e dizer “eu sei fazer, confie em mim, tá?”.

9 - Sou fã desde o início dos anos oitenta da Marvel. Ainda por cima sou mutantemaníaco desde a primeira página lida dos X-Men. Imagino que se eu, fã como sou, fosse convidado para ser editor da Marvel com toda a certeza ficaria entre o pavor e a histeria. Como foi contigo, ser convidado para trabalhar na Panini, e qual a tua relação com os quadrinhos de heróis?

RgS. Na verdade, eu que procurei. Sabia que estavam precisando de gente para trabalhar na redação de super-heróis e entrei em contato, mandei texto de teste e etc. Fiquei extremamente feliz quando soube que fui selecionado. Com o tempo e com as reformulações na redação, fiquei responsáveis por títulos de peso, Homem-Aranha, X-Men, Wolverine, X-Men Extra e Marvel Millennium: Homem-Aranha. A idéia era eu me tornar responsável por personagens relacionados (mutantes, por exemplo) e também o Homem-Aranha, tanto a versão tradicional como a versão millennium, porque não seria mais organizado, eu poderia me dedicar e entender melhor as tramas, relações e etc. Claro que me deu um baita frio na barriga, porque é uma responsabilidade e tanto! Homem-Aranha é um ícone, um dos maiores da Marvel, e os heróis mutantes tem uma legião de fãs dedicadíssimos. Mas isso não poderia ser um fator para me impedir que fazer um bom trabalho, oras! Eu tento cada vez mais fazer o melhor trabalho possível, fazer com que as revistas ficassem o melhor possível para os leitores. A responsabilidade é boa para me manter sempre atento, sempre preocupado com a qualidade do material.

Sabe que o mais engraçado de ser um editor de heróis Marvel, é que antes de trabalhar na Panini, era mais leitor da DC Comics, fã de Batman, Lobo, Legião dos Super-heróis e outros. A verdade é que eu lia (e ainda leio) muita coisa, diversos títulos de variadas editoras, além das duas grandes. Sou um grande fã de quadrinhos de terror e fantasia, acompanho muitos lançamentos e séries (por exemplo os quadrinhos relacionados a Hellraiser, Army of Darkness, Friday the 13th, por exemplo) e também acompanhei muito mangá, quadrinho europeu e alguns alternativos (que é mais a praia da minha esposa).

10 – Algo bem particular com relação à tua atividade de editor. Sabemos que a quantidade de títulos da Marvel, principalmente nos Estados Unidos, é enorme. Um grande problema que tínhamos (em tempos de Abril), falo como leitor e fã, é que eram lançadas algumas linhas de histórias ligadas à certos grupos de personagens, e muita coisa (mesmo que relacionado à estes personagens mas que estavam em outros títulos) ficava fora da grade de lançamentos. Mesmo hoje, com o ótimo tratamento dado pela Panini aqui no Brasil, sabemos que vários títulos não são lançados. Com funciona esta política de escolha de lançamentos e escolha de títulos para um mercado como o brasileiro?

RgS. As decisões sobre quais títulos serão lançados aqui no Brasil passa pelo crivo da matriz da Panini, na Itália. A gente participa, sugere, insiste, reclama e tudo mais, mas a palavra final é deles (afinal, eles são a Panini). Pode até parecer meio ditatorial, mas não é não. Na maioria das vezes, eles ouvem nossas sugestões e opiniões, assim como nossos argumentos, e tem consciência que a gente conhece o nosso mercado. Parando para pensar um pouco, não é tão difícil assim escolher o que precisa ser publicado. Temos os títulos “básicos”, como X-Men, Homem-Aranha, Vingadores e muitos outros. A partir destes, a gente vê o que é mais necessário (ou melhor, está mais relacionado com o que está acontecendo) para o leitor acompanhar melhor as histórias. A gente também acompanha as edições mais adiantadas das revistas, para saber o que precisa sair. Sem contar que ainda temos que nos preocupar com a cronologia (que por fezes os próprios americanos se bagunçam) e com eventos importantes que precisam sair antes de determinadas edições.Eu sei que tem muita gente que pede para este ou aquele título ser publicado, e para pararmos de publicar um outro. Não são escolhas fáceis e por vezes ficamos um pouco indecisos sobre onde sair este ou aquele título, mas garanto que tentamos sempre equilibrar a qualidade do material com a necessidade dele dentro do Universo Marvel.

11 - Estamos envoltos numa crise econômica mundial. A Marvel, no Brasil, já passou por problemas em época de outras editoras que a levaram desde a troca de títulos, troca de tamanho das revistas até culminar nas edições Premium e encerrarem atividade. Já a Panini está – pelo menos aos olhos dos fãs e leigos – cada vez mais forte. Temos uma inundação de títulos, de especiais, de séries que parecem não ter limite. Qual o motivo da Marvel lançada pela Panini ter um enorme sucesso em sua caminhada no Brasil? Ainda, de que forma a crise pode modificar isso e quais as medidas que tomaram?

RgS. Eu trabalho a relativo pouco tempo na Panini, comparando com nomes como Fernando Lopes e Fabiano Denardin, mas acho que posso dizer a minha humilde opinião a respeito do sucesso da Panini. O primeiro fator é, sem dúvida, a enorme preocupação com a qualidade das edições. Cada vez mais, a editora procura encontrar formas de melhorar ainda mais a qualidade das revistas. Volta e meia temos algumas polêmicas, ou alguns assuntos que o leitor não gosta, como a distribuição setorizada (que pode não ser a melhor alternativa, mas viabiliza muitos lançamentos que talvez nem sequer chegassem por aqui), por exemplo.

A Panini quer vender mais revista, para isso elas precisam ser boas, o material publicado precisa agradar ao leitor, as edições ficarem melhores dentro de preços justos. E há um esforço nesse sentido. É um raciocínio lógico, não?

12 - Pode adiantar algumas das novidades guardadas pela Panini para o Brasil para breve?

RgS. Em abril teremos (ou tivemos, depende de quando a entrevista for ao ar...) uma verdadeira enxurrada de especiais do Wolverine (sabe como é, tem filme do personagem, badalação etc.), como a edição Anual, Logan, encadernados como Inimigo do Estado e Duro de Matar e Eu, Wolverine. Para maio teremos aguardadas edições especiais do Demolidor, como a Biblioteca Histórica e Diabo da Guarda. Também temos a Invasão Secreta, minissérie que vai bagunçar muito a vida dos heróis Marvel (tá, eu sei que já dissemos isso antes, mas vai acontecer mesmo, de novo...). Também teremos algumas boas novidades nas revistas mensais, em parte por conta da Invasão Secreta. E tem muito mais coisa, mas seu falar, os outros editores me matam...

Obrigado pela participação e estamos sempre à disposição!!!

RgS. Eu é que agradeço pelo convite e pela entrevista, e pela paciência de esperar as minhas demoradas respostas.