sexta-feira, 7 de abril de 2017

Material de Apoio - Série Dungeons & Cavernas: O perigo das Megadungeons

Material de Apoio - Série Dungeons & Cavernas
O perigo das megadungeons


Voltando à nossa série de postagens sobre dungeons quero aproveitar umas dicas feitas por John Four essa semana – como usar megadungeons? O que seriam elas? Magadungeons, como o próprio nome sugere, são aquelas dungeons gigantescas em todos os sentidos (muitos andares, quilômetros de corredores, centenas de aposentos, infinidade de armadilhas, milhares de monstros e incontáveis formas de perder a vida). Uma verdadeira febre, desde os anos setenta (Greyhawk, de Gary Gygax, por exemplo), elas ganharam suplementos próprios dentro de vários sistemas, acréscimos e foram adaptadas para muitos universos e cenários. Elas seriam, em tese, a fonte para sessões e mais sessões de jogo, verdadeiras campanhas e si mesmas.

Segundo o próprio Gygax, na primeira versão de The Underworld & Wilderness Adventures, uma enorme dungeon era quase que uma obrigação para uma boa aventura de RPG: “Uma boa masmorra terá nada menos do que uma dúzia de níveis abaixo, com níveis de ramificação além, e novos níveis em construção para que os jogadores nunca se cansam dela. Não há limite real para o número de níveis, nem há qualquer restrição em seu tamanho (diferente do tamanho do papel gráfico disponível).” Mas isso eram outros tempos. Tempos de início do RPG, em que ele engatinhava e que tudo era uma maravilhosa novidade.

Primeira versão do Nível 1 de Greyhawk, de Gygax

Mas elas tinham um perigo obscuro – a chance de tornarem-se chatas e desinteressantes era proporcional ao seu tamanho. Muitos ainda incorrem no erro de que tamanho é significado de qualidade e diversão. Não é. Tamanho está muito mais próximo de fracasso e tédio do que de diversão.

Embora isso não seja uma regra imutável, megadungeons, mesmo sendo grandiosas, tendem a ser tediosas por alguns aspectos. Por maiores que sejam elas ainda são um espaço restrito. O grupo de aventureiros tem em muito suas possibilidades de ação diminuídas, quase sempre em uma linearidade previsível. Além disso, o ambiente em si guarda um leque curto de interações.

Uma vez que o grupo entre numa megadungeon ele sairá dali quando terminar todas as quests e sub-quests existentes ou nunca sairão. Isso condena o grupo a descer e subir, ir e vir, ‘n’ vezes, enfrentando e reenfrentando as mesmas armadilhas e inimigos de novo e de novo (ora...quem diabos rearmou essa armadilha?). Por mais ação que os jogadores apreciem, pouco a pouco o ambiente vai tornando-se mais e mais artificial e a diversão passa a ser mecânica. Não foram poucas as vezes que megadungeons transformaram-se no ponto final de campanhas muito bem intencionadas.

Além disso, não estamos mais nos anos setenta. Rapidamente a lógica toma conta dos jogadores e perguntas simples se apossam deles fazendo-os questionar a veracidade do ambiente (já conversamos sobre isso anteriormente): de onde vêm tanto monstros... como eles vivem apinhados aqui embaixo... como eles se alimentam... por que não se mataram eles mesmos até agora... por que o mago maligno resolveu ficar aqui... ele não sai nunca... e por aí vai! Os jogadores se tornaram exigentes e procuram mais do que simples ‘percorrer corredores, matar e pilhar’.

Mas existem algumas opções que podem dar mais vida à utilização desse enorme ambiente que consumiu dias (quem sabe semanas) de trabalho árduo do mestre e que pode sim ter alguma utilidade em suas campanhas de RPG.

Primeiramente temos que imaginar que essa megadungeon não está isolada no cenário. Ela tem de perder a característica de dimensão de bolso, um universo em si, onde tudo gira em seu redor (e essa dica vale para muitas das dungeons e cavernas menores também, como já disse mais de uma vez em outras postagens). Ela faz parte de um todo, tem um lugar no ambiente e na história de uma região ou reino por mais isolada e perigosa que seja. Por isso mesmo – se ela é de conhecimento das pessoas – o grupo de aventureiros não será o primeiro à encontrá-la ou desafiá-la. O mestre deve certificar-se de deixar pistas e dicas sobre ela em lendas, conversas de taverna, comentários em mercados ou histórias contadas por bardos e sobreviventes. Isso a tornará mais crível e sua fama será condizente com seu tamanho.


Um segundo ponto importante é como as utilizarmos na campanha. Para fugirmos ao efeito “dimensão de bolso” não pense nela como o local de todas as quests e eventos. Ela poderá ser um local importante, ok, mas imagine ela como um elemento de um todo maior. Tal qual uma cidade ou vila, faça o grupo ter de entrar e sair dela várias vezes, percorrendo à cada vez pontos diferentes. Preocupe-se em criar várias entradas e passagens possíveis, quem sabe até mesmo não deixando claro para o grupo que fazem parte da mesma estrutura (já que ela é uma dungeon gigantesca ela pode cobrir uma vastíssima área). Além disso, pense em diversificar o que o grupo poderá encontrar em seu interior no que tange à seres vivos. Comunidades de excluídos, monstros e animais perigosos, aventureiros de profissão, caçadores de relíquias ou de animais raros, alguma guilda (e não precisa ser de um lich), dentre muitos outros. Imagine que ela tem a mesma dinâmica que uma cidade se pensarmos em suas relações internas.

Em termos de aventura reaproveite, nas futuras quests, todo o conhecimento que o grupo adquirir nas jornadas dentro da megadungeon. Isso fará com que eles se preocupem com suas entradas mais do que simplesmente matar e pilhar, criando uma verdadeira história. Crie encontros recorrentes, locais importantes e que sejam reconhecidos por eles, se preocupe menos com armadilhas (já que depois de sobrepujadas uma vez perdem sua utilidade efetiva e de surpresa) e mais com quem as armou, até mesmo uma pequena comunidade pode viver ali dentro ou perto de uma das entradas, etc.

As possibilidades são enormes, mas o trabalho que isso dará também será grande. Por isso mesmo não se preocupe em preencher todas as lacunas tudo de uma vez. Faça o grupo passar por aventuras diferentes entre cada visita à esta megadungeon. Deixe-os respirar e sentir saudades dela. E quando eles estiverem prontos para retornar, complete mais um pedaço dessa enorme estrutura.