Distopia RPG– a celebração das
possibilidades infinitas -
Foi
anunciada pela editora Tria, na última edição do Diversão Offline, sua lista de
lançamentos para os próximos meses. Dentre eles havia uma surpresa escondida,
um RPG autoral da editora, uma produção nacional que estava no forno a algum
tempo e que agora começava a ganhar forma real – trata-se de Distopia.
Distopia
é, em poucas palavras, uma maravilhosa caixa de ferramentas para criação de
aventuras em um cenário multifacetado que abrange quaisquer imagináveis (como
no próprio playtest fechado diz) “subgêneros da fantasia científica: ópera
espacial, espada e planeta, romance planetário, terra agonizante, cenário
apocalíptico e ficção científica transcendental”, isolados ou mesclados, usando
por completo as regras de Pathfinder 2e, às quais tive acesso, mas também terá
versões para D&D 5e e T20.
Normalmente
cada um desses tantos gêneros está em um universo diferente, isolado em seu
próprio mundo e com suas regras. Em Distopia temos quase um amálgama. Se alguém
pensou em um lutador marcial shaolin com luvas energéticas seguidor do mantra
de uma tecnomancia sombria... Isso será possível!
Mas
só isso ainda diz pouco sobre o RPG que teremos em mãos em breve.
Distopia
é claramente uma ode de amor à uma série de variados gêneros de ficção, mas
fugindo daquela típica pegada retrô sessentista, setentista e mesmo oitentista
que vemos em outras produções rpgísticas que se propõem ao mesmo e tentam se aproximar
do gênero. Nada contra o visual retrô (gosto muito, por sinal), mas Distopia é
modernoso na melhor acepção da palavra. Não estamos mais no mundo da futura e
visionária IA (HAL 9000 manda lembranças), estamos em um mundo onde as IAs já
estão conversando conosco em nosso dia a dia e nos auxiliando. Assim, Distopia
nos brinda com um texto moderno, inundado de referências “antigas”, repleto de
realidade vívida, mas com aquela remasterizada de qualidade.
Mas
vamos por partes, pois tenho muito a dizer com o cuidado de não estragar as
surpresas que virão no futuro.
Temos
em Distopia um multicenário. Como assim? O cenário foi criado dentro da ideia
de multiverso. É uma estrutura que tenta dar corpo para a ideia de variados ambientes
conceitualmente diferentes sob um mesmo prisma, mas ainda assim, com linhas
delimitadoras claramente perceptíveis, embora tênues. Assim como Marvel e DC
nos ensinaram o que eram, Distopia usa e abusa dos conceitos de multiverso,
dimensão e plano. É a forma perfeita de conseguir unir tantos elementos de
cenários distintos em um único ambiente. Toda a introdução de Distopia nos
apresenta uma explanação científica em uma linguagem acessível e simples que
vai se encaixando e construindo noções do próprio universo do cenário - o
Constelado. Mas por trás de todo o texto há apenas uma única intenção dita ao
leitor – este é o nosso cenário de ficção, e te damos de brinde nele todos
os cenários que você ama para se divertir e explorar.
Quando
vi pela primeira vez a proposta, logo que comecei a ler a obra parcial (ainda
em fase de produção), logo uma questão me veio à mente – isso não ficará
bagunçado já que teremos tantos cenários com tantas peculiaridades, com tantas
‘regrinhas’ em cada canto? A leitura foi me mostrando que não.
Todos
os elementos superlegais dos cenários existentes no imaginário da
fantasia científica – John Carter a Patrulha Estelar, de Tropas Estelares a Star
Trek – estão presentes em Distopia de uma ou de outra forma. Como eu disse, pode
parecer perigoso tantos elementos soltos em um só lugar, mas temos um detalhe
muito bem pensado e trabalhado aqui – eles não estão realmente soltos. Embora
tenhamos todo o multiverso à disposição com todos os seus elementos ao alcance
da mão, pairando sobre tudo está o enredo do cenário – a derrota da VIA
(Verdadeira Inteligência artificial) na Grande Revolução que acaba por causar
uma série de efeitos em todos os lugares (não vou estragar a graça dando
spoiler sobre isso) – que tem por objetivo puxar fios aqui e ali para
determinar limites, consequências e efeitos gerais, facilitando o trabalho de
enquadrar cada ‘mundo’.
Assim
os autores não precisam criar regras para cada cenário em si (o que seria
impossível quando a proposta é do cenário ser o próprio multiverso), mas linkar
elementos básicos como magia, planos, portais à reguladores específicos. Assim,
por exemplo, a magia que existe em um mundo tipo de ópera espacial assim como
em um tipo de romance espacial ou qualquer outro, terá especificidades (é
claro) em cada um... mas com os limites determinados pelo cenário com apenas
uma frase: “quando alguém usa magia relevante, é fortemente impactado por
essa superconcentração da essência mágica, de maneira que parte de sua própria
existência é danificada (ainda que na maioria dos casos temporariamente)”...
Isso é brilhante! O recado é: ‘magia existe no mundo x, y ou z, mas com essa
peculiaridade, use-a dentro disso... o resto é magia’.
Então
uma outra pergunta me veio à mente: mas como unir esse tanto de mundos de uma
forma que não engesse demais as campanhas pelas distâncias ou localização
planar? Novamente isso é apresentado e explicado de forma simples – portais. Os
Portais serão um elemento presente em todo o cenário. Uma forma de explicar a
mobilidade ou a possibilidade de integração de elementos diversos dentro dos
cenários. Tão logo comecei a ler sobre eles e sua proposta, me lembrei das
manhãs de sábado na minha infância, nos anos setenta, quando ficava vidrado na
televisão assistindo ao clássico seriado The Fantastic Journey (1977) – uma
incrível referência, tenho certeza. Em Distopia poderemos ir para os mundos
listado de sistemas solares próximos e distantes (são 25 mundos em Distopia) ou
outros tantos que os mestres quiserem com a facilidade de atravessar simples portais.
E antes que eu começasse a questionar as dificuldades dessa abrangência toda, novamente
os autores me apresentaram aquela pequena regra delimitante linkada ao cenário do
Constelado e sua história que atua nos portais, enquadrando-os ao cenário,
assim como fez com magia.
É
muita coisa interessante para falar, mas não posso exagerar, então vou me
prender em alguns outros pontos que são os que sempre me chamam mais a atenção.
Vamos começar com os personagens possíveis.
Um
dos chamarizes de todo o cenário que se preze é o quanto ele possibilitará aos
jogadores soltarem sua imaginação para criar seu personagem e Pathfinder 2e nos
ensinou muito sobre isso. Em Distopia temos coisas interessantes para fazer
tanto pela criatividade dos autores quanto pela utilização da mecânica de P2e. São
apresentadas sete ancestralidades mais comuns no cenário:
- Athaches,
seres de três braços super avançados tecnologicamente, que consideram ter a
missão de proteger o multiverso;
- Bioroides,
que foram criados pela VIA como substitutos cibernéticos aperfeiçoados dos
humanos;
- Brachys,
grandes crustáceos bípedes, extremamente adaptáveis e expressivos;
- Dorgones,
enormes humanoides pacíficos com placas e escamas que contemplam o cosmos;
- Svartalfar,
elfos sombrios telepatas e que vivem sob a lei do mais forte e mais rico;
- Humanos,
seres ambiciosos e resilientes com reputação de comportamento efêmero;
- Nissthras,
humanoides ofídios capazes de trocar de pele para transformar sua aparência.
Com
essas sete ancestralidades temos um prato cheio de possibilidades para um
universo diverso como o do Constelado. Cada uma delas sai do usual em outros
RPGs e mostra que a intenção e nos jogar diretamente no diverso. Agora, imagine
que além delas temos a possibilidade de miscigenação, ou seja, nossa
ancestralidade escolhida inicialmente como base, com traços de outra ancestralidade.
As possibilidades são multiplicadas. A variabilidade é a palavra de ordem e
abraço isso com amor. No tópico específico para as miscigenações são
apresentadas as características de alguém de cada uma dessas heranças e suas
peculiaridades.
Tem
mais? Sim, tem. Mas é surpresa, por enquanto. Seguindo o esquema ABC de
Pathfinder 2e, nas biografias temos uma generosa lista de possibilidades que concedem
aquele tempero à nossa construção com uma enorme série de escolhas possíveis,
do Apostador ao Clone, do Cultista ao Hacker, ou o meu preferido no momento – o
Desistente.
As
Classes já são um conceito comum trabalhado em muitos sistemas de várias
matrizes diferentes de RPG. Aqui a função é a mesma – mais variabilidade
direcionando para uma forma de agir ou interesse. As classes de Distopia são
também em número de sete: Agente, mestre em atividades e operações
especiais; Comandante, capacidade pessoal de controle de situações; Combativo,
a pessoa do campo de batalha; Dimensionista, usa o poder de outras
dimensões para moldar a realidade; Primor, usando magia sem apoio da
tecnologia; Tecnista, o expert em todo o tipo de tecnologia; e o Tecnomante,
mesclando tecnologia e magia. Para quem conhece P2e espere a mesma estruturação
e desenvolvimento durante a evolução do personagem com toda aquela
variabilidade maravilhosa.
O
segundo ponto que muito me atrai em RPG são os equipamentos. Ora, queremos é
puxar a espada laser, sacar a pistola de raios e erguer o escudo energético.
Como era de se esperar não faltarão opções para proteção ou ataque. Recomendo
experimentarem uma Granada Criogênica Maior para... esfriar um pouquinho as
coisas em meio ao combate. Teremos tabelas e mais tabelas com descrições e mais
descrições. Me lembrou muito o que temos em Starfinder por motivos óbvios da
temática, mas com uma pegada autoral de primeira.
Quanto
as Perícias, elas são muito da alma de um RPG já que nos dão o grosso do que
podemos fazer em mesa. Não se vive só de combate no RPG e em um mundo tão
variado quanto o do Constelado, perícias podem ser o que mais vamos usar.
Teremos várias perícias novas em Distopia adaptadas para as necessidades do
cenário. Muito da nomenclatura me lembrou jogos com temática Cyberpunk, então
preparem-se variados tipos de ação tais como hackear, manipular sistemas,
ajustar armaduras, pilotar e mais. Como o documento que tenho em mãos ainda é
um playtest, acredito não ter tudo ali ainda, mas já me deu uma enorme vontade
de invadir um sistema e burlar a segurança.
Finalizando...
Eu vi muita coisa boa no pouco que pude ver, pois como eu disse o livro ainda
está em produção. Há um enorme potencial em Distopia. Para alguns pode parecer
“apenas mais um jogo de opera espacial e afins”, mas não, ele é mais, muito mais.
Por ser essa caixa de ferramentas com todo um multiverso à sua disposição ele
possibilitará muito mais aos mestres e mesas do que RPGs usuais unitemáticos.
Com
o trabalho cuidadoso que eu percebi no material, os autores parecem querer que
a história do cenário se desenrole ao largo de todas as campanhas que serão
criadas pelos fãs e jogadores, podendo ou não ser relevante ou usadas. Essa
história do cenário estará sempre lá, já que seus efeitos são percebidos em
vários pontos de todo o multiverso e do que se pode fazer, mas ao mesmo tempo,
não precisa ser o foco de cada aventura. Isso é pensar além do próprio cenário.
É pensar no desenvolvimento e diversão que os jogadores terão com suas
aventuras que, por acaso, estão acontecendo num mundo com essas peculiaridades.
Eu
realmente quero muito ler mais disso e conto os dias para ter o livro completo
em minhas mãos.
[Observação: o financiamento coletivo de Distopia inicia à 00:01 do dia 04/07.]
Um comentário:
Excelente resenha! Fico muito satisfeito de saber que essa prévia do Distopia passou a mensagem que desejamos! Bora ligar os motores!
Postar um comentário