Spralwrunners, o cyberpunk em Savage Worlds EA Resenha
No
finalzinho do ano passado recebi meu exemplar de Sprawlrunners, da Retropunk
Publicações. Eu o aguardava ansiosamente e considero que com sua chegada foi um
fechar de ano sensacional. Depois de uma lida rápida (rápida, pois queria ver
tudo o que ele tinha para me oferecer) resolvi colocar minhas impressões aqui.
Tenho
muitas, inúmeras, paixões. Dentre elas há a temática cyberpunk e o sistema de
RPG Savage Worlds (em especial a Edição de Aventura). A temática cyberpunk me
acompanha a décadas, desde a primeira obra que li por inteiro ainda nos anos
oitenta. Hackers, lutas contra um sistema opressor em um mundo futurista e
distópico, viagens no cyberespaço e alta e sombria tecnologia. De lá para cá fui de Willian Gibson à Marie
Lu, com as mais variadas nuances sobre o tema. Por óbvio acabei por
experimentar Shadowrunner – que por incrível que pareça conheço muito pouco -,
mas foi uma experiência muito prazerosa. De outro lado, Savage Worlds EA arrematou
meu coração com sua mecânica simples e enxuta e com algumas das campanhas mais
sensacionais que já joguei, tanto pelo cenário quanto pelas mãos criativas e
competentes do mestre. Então, era óbvio que eu iria me apaixonar por
Sprawlrunners.
Pretendo
fazer aqui um apanhado das minhas impressões, sem profundidade em demasia.
Em
primeiro lugar, e o mais importante neste suplemento, é termos claro à que ele
veio. Como é dito em suas páginas - “Sprawlrunners não traz páginas de
equipamentos por personagem. Ele não fornece uma infinidade de implantes ou
poderes. Em vez disso, é uma estrutura para te ajudar a contar as histórias
desses runners. (...) Sprawlrunners é sobre pessoas e suas histórias, não sobre
a acumulação de equipamentos”. Esse é o mote principal aqui e exatamente o
que procuro e o que me encanta.
O
cenário é exatamente o mesmo ambiente distópico que estamos acostumados a ver
em todas as infinidades de produções semelhantes – megacorporações, outras
espécies, certo grau de magia, desigualdade, violência e tecnologia. Mas esse
cenário não é detalhado à exaustão, como em outras franquias de RPG. Aqui ele é
comentado ao longo das passagens do livro, mais como exemplos práticos do que
como uma narrativa encadeada e linear. Os autores pressupõem que você sabe como
é um cenário dentro da proposta de Sprawlrunners e deixa à cargo do mestre sua
estruturação conforme suas preferências – ora, essa é a proposta de tudo em
Savage Worlds, não é?
Mas Sprawlrunners não te deixa órfão. Ele te oferece
tudo que você precisa, mecanicamente, para criar um personagem típico deste
cenário. Embora ainda seja necessário termos o Livro Básico de Savage Worlds EA,
em Sprawlrunners temos todos os elementos para criação de personagens neste
tipo de cenário – todas as ancestralidades estão lá com detalhes para um mundo
cyberpunk. Temos complicações exclusivas para o cenário – que somamos às do
Livro Básico -, temos Vantagens Modificadas (para uma adequação ao cenário),
Vantagens de Ciberespaço e Vantagens Cibernéticas, essas duas últimas a cereja
do bolo de nosso personagem. Temos muita magia também... vai por mim, você vai
adorar os totens e servos! O livro nos apresenta três antecedentes Arcanos
novos (Adeptos do Chi, Magos e Xamãs) e regras adicionais novas.
Retornando ao começo, o detalhe que é um grande diferencial
em Sprawlrunners – o sistema de riqueza abstrato. Ele nos traz uma forma diferente
de alocar recursos. Em vez de apenas controlar o dinheiro (que aqui está
totalmente em segundo plano e diretamente ligado ao Estilo de Vida - começamos no mais baixo deles), os
personagens têm uma seleção de Pontos de Logística que podem ser alocados para
equipamentos, com base no que é necessário para uma missão/ação/corrida
específica. Os personagens podem alocar esses pontos livremente (um
personagem novato começa com 10 pontos, aumentando esse limite à cada estágio
adicional) conforme necessário para conseguir recursos uteis (armas, veículos,
vestimentas etc) e, após a missão/ação/corrida, eles recebem de volta todos os
pontos gastos ao mesmo tempo que devolvem os equipamentos. É como o personagem saber perfeitamente quem procurar para
conseguir aquela drone de reconhecimento de última geração (que, por acaso,
custa 4 pontos de logística). Os personagens ainda podem, se precisarem ou
quiserem, selecionar algum equipamento para que o tenham equipado com eles, mas
isso será uma exceção e custará pontos de logística ou a boa vontade do mestre.
Existem ainda os Pontos de Implante. Eles limitam a
quantidade de ciberware que um personagem pode ter e representa tanto o
dinheiro gasto para obter um determinado implante quanto o estresse recebido
para isso – demonstrando a tensão ou a redução de essência que eles causam. Os Pontos
de Implantes são definidos pelo padrão de vida do personagem - novamente um
mecanismo para evitar o foco no dinheiro no jogo. Meus implantes
preferidos já são a Navalha de Mão (2 pontos de implante) e os Aprimoradores de
reação (0,5 pontos de implante). Todos estão listados, junto com outros
equipamentos próprios para o cenário, em um capítulo exclusivo para
equipamentos.
Com os parágrafos anteriores em mente, podemos ir
um pouco além na proposta de Spralsrunners. Normalmente um RPG cyberpunk é
baseado em conseguir recursos e mais recursos para o que quer que desejamos
fazer. Mas aqui o foco não está nos recursos. O que isso significa? Significa
que o foco está em outro lugar – no desenvolvimento do personagem. Fazemos 4
rolagens ou escolhemos nossos antecedentes para selecionar nossas Raízes (de onde vieram),
Trabalho (o que ele costumava fazer), Revolta (como a vida dele mudou) e Metas
(o que impulsiona ele). Este último é o mote do jogo – onde o personagem quer
chegar. O jogo está aqui, em como atingir isso e nas relações que se construirão para isso.
Mas isso não seria um RPG cyberpunk se não
tivéssemos um capítulo especial sobre o ciberespaço. Nas dez páginas dedicadas
à ele, temos regras para cyberdecks, GELOs e todos os elementos clássicos de um
cenário cyberpunk com foco na realidade virtual. Há duas regras para hackear.
Queima Lenta (andar sorrateiramente através dos Nós do sistema, lutando contra
o GELO e vasculhar dados) e Pista Rápida (método rápido para lidar com o
ciberespaço em tempo real). Além disso, temos quatro páginas para os Jóqueis –
operadores que se conectam à um drone ou veículo através de seu deck... eles
são o veículo.
Ufa... tudo isso em quase cem páginas!
Conclusão
São quase cem páginas de uma leitura muita
agradável e que no fim nos deixam claro de que não precisamos de quinhentas
páginas para termos nossa mesa cyberpunk. Não desmereço outros sistemas ou
franquias, mas Spralsrunners cai como uma luva em quem se adaptou à leveza do Savage
Worlds EA. Se você já joga SW, a criação ou entrada em uma mesa cyberpunk será tranquila
e sem traumas, precisando de poucos ajustes ou orientações aos seus jogadores.
Se você ainda não joga SW, pode ter certeza de que o ingresso no sistema, com
foco em uma mesa cyberpunk, será indolor e nada assustador. O foco no que os personagens querem e como eles chegarão à isso, em vez de equipamentos, dinheiro e loot, nos presentei com uma visão do
gênero focado nos fins e não no acúmulo de recursos por si só.
Alguns podem sentir
falta de um cenário estabelecido e detalhado, mas realmente considero essa
liberdade como uma benção que nos livra de um excesso de história pregressa que
acaba por dar detalhes demais para coisas que nunca vamos usar. Os mestres
estão livres para colocar em voga a sua ideia de cenário e levar adiante as
suas histórias.
Assim como Savage Worlds EA, recomendo muito que
experimente Spralwrunners. Não se arrependerão!
Nenhum comentário:
Postar um comentário