Capitulo – 1 “Caminho de casa” (continuação)
A luta recomeçara.
Os dois atacaram ao mesmo tempo desferindo uma serie de golpes com ambas as espadas. Enquanto um atacava o outro desviava, e assim alternadamente. Espadas se encontravam ocasionalmente. Os dois eram especialistas em esquivas, e faziam isso como uma arte. Randorill iniciara um movimento repentinamente, seu aluno recuou a tempo, e a lamina passou a alguns centímetros de seu rosto. O jovem desferiu uma estocada com as duas espadas, dando um passo a frente. O professor aparou com a arma da mão direita, deixando assim todo o corpo do aluno desprotegido. Em contra-ataque girou o corpo, acertando-o aluno no flanco com uma arma após a outra.
O jovem recuou alguns passos, ainda sentindo o peso dos golpes. Conseguiu se equilibrar com algum esforço, olhou para baixo e percebeu onde seu corpo tinha sido acertado. As duas marcas ficaram impressas em sua camisa, assim como a dor. Abaixou-se sobre um dos joelhos. Estava sem fôlego. Respirou longamente e sentiu dor. Uma de suas costelas devia estar quebrada.
“– Levante-se. Tenho que lhe acertar mais uma vez antes que desista – o professor parecia cansado, mas mantinha a postura perfeitamente ereta.”
“– Não acredita mesmo que eu vá desistir agora, acredita? - o jovem usou as espadas como apoio e se pôs de pé – Hoje vou lhe provar que posso vencer!”
“– Venha! – era Randorill, enquanto secava o suor da testa com a manga da camisa.”
Dessa vez, o avanço foi calculado. O estilo de luta usado pelos dois era propicio a defesa, mas quando no ataque, cobrava velocidade e resistência. A fadiga já começara a avançar, o ímpeto inicial cessara, estratégia tinha sido a saída adotada no combate.
O jovem saltou e desceu as espadas na vertical com força. O professor desviou as armas com as suas. O jovem estocou na altura do estomago e no ombro esquerdo, mas com um giro Randorill passou entre as laminas vermelhas já contra atacando. O aluno precisou se jogar no chão e largar uma das espadas para escapar. Ao tocar o solo, já se pôs em movimento rolando para esquerda evitando um ataque duplo.
O aluno recolheu a espada que soltara a tempo de usá-la para aparar. Conseguiu ficar de pé antes de se esquivar três vezes seguidas, abriu os dois braços e tentou cortar em direção ao centro. O professor apenas recuou um passo, e as armas encontraram somente o vazio. Aproveitando o impulso das armas o jovem desceu a espada da direita. Na diagonal. Randorill a evitou facilmente com outro giro já preparando o próximo ataque. Ao girar, confiante que seu ataque seria o ultimo, recebeu no centro do peito uma estocada fortíssima. Sua cota de malha quebrara no lugar do golpe. A tinta vermelha se transferia rapidamente para o tecido branco.
O professor parara pela segunda vez. Os anéis da sua cota de malha caiam aos montes. A armadura estava arruinada. Randorill embainhou as duas espadas, e soltou o nó que prendia a cota em suas costas. Retirou-a por cima da cabeça e a arremessou a esmo.
Cansaço, ansiedade e dor. Sentimentos partilhados pelos dois naquela hora. As espadas já apresentavam fissuras e arranhões, e a tinta vermelha estava chegando ao fim.
“– Dois acertos pra cada - o jovem falava com as espadas totalmente abaixadas – ainda acha que não aproveitei bem seus ensinamentos?”
"– Foi uma boa jogada, nada mais. Cuidarei para que o próximo ataque a acertar o oponente seja o desferido pelas minhas mãos". – provocou o professor.
“– Posso lhe garantir que não será!”
Com as espadas cruzadas a frente do corpo e andando lateralmente, o aluno voltou ao combate – Hoje, me sagrarei vencedor!
O combate terminaria nos próximos minutos. Caso o aluno conseguisse a vitória estaria livre para retornar para casa. Caso perdesse, deveria se preparar por mais um ano, antes de ter a chance de um novo combate.
Randorill imitara o gesto. A técnica dos dois era exatamente a mesma. Um erro cometido agora não teria volta. Os dois estudavam cada movimento, se aproximavam, fintavam ataques, mas não se tocavam.
Ele avançou com ímpeto impressionante. A fadiga deixou de incomodar. A juventude prevaleceria, a vontade prevaleceria, a ambição seria o ponto final. O jovem atacou por todas as direções, suas espadas no momento inicial pareciam furacões, tornados, fenômenos da natureza. O professor se assustara , estava sentindo extrema dificuldade para escapar dos golpes. Quase tinha sido tocado três vezes seguidas. Esperou o momento propicio e se jogou no chão. As laminas ferozes erraram por pouco. Randorill se levantou rapidamente, atacou seu oponente mirando-lhe as costas. O jovem por sua vez, de novo esperava o ataque. Mirou seu golpe no meio da espada adversária, o intuito não era o normal, desviar, ele queria mais.
As espadas se acertaram com força total. Dois ataques magníficos desferidos ao mesmo tempo. As duas vibraram nas mãos de seus donos. O impacto amortecera o braço do jovem. Ele piscou sem acreditar, nunca atacara com tamanha força. Olhou para o braço que doía e depois para a espada. Espanto. Ela jazia agora quebrada, o choque tinha sido enorme, sua lamina tinha sido mais requisitada na defesa. Rachou e explodiu em pequenos pedaços de ferro forjado, a metade de cima aguardava caída no chão, inerte. Seus olhos subiram em direção ao professor. Ele pôs-se em guarda como esgrimista e esperou.
“– Belo ataque meu rapaz. Para um pederasta como você, pode se considerar um grande feito. Pelo que vejo, terá de lutar em desvantagem.”
“– Vencerei com, ou sem espadas – provocava o aluno sem saber se acreditava nas próprias palavras – Sempre disse que podia vencer sem uma das mãos, hoje só te provarei que falava a verdade.”
“– Não lhe darei tal gosto. – e com isso enterrou a lamina de sua espada até o meio no piso frio – Lutarei a sua maneira!”
Avançaram e o combate reiniciou. Os ataques agora eram menos cuidadosos, o momento sugeria ousadia. A mesma espada que atacava tinha de defender. A luta com uma espada, sem escudos, penderia ao mais ousado. Randorill usava de inteligência, fazia seu prodígio defender os braços, as pernas e o tronco á todo momento, deixando-o assim sem chances para o contra-ataque. O aluno combatia bem, não atacava, mas estava se saindo melhor do que esperava. Defendeu-se por mais dois longos minutos e conseguiu seu primeiro ataque. A troca de golpes se tornara normal, intercalavam-se em defesa e ataque perfeitamente. Estranhamente, os dois sorriam.
“– Agora! – o jovem em um salto a frente surpreendeu o adversário, sua espada em um arco cortou o ar em direção ao ombro inimigo. O professor girou para lado esquerdo se esquivando por pouco. Ele atacou novamente com uma estocada, que o professor aparou com a espada.”
O combate continuou acirrado, o professor levava vantagem na experiência, o aluno na juventude. A variação de manobras era impressionante, cada golpe nunca era repetido. Nenhum dos dois ousava parar a essa altura. Voltar atrás não era uma opção.
Os ataques do aluno, não mais visavam seu combatente, Randorill percebera que sua espada se tornara o alvo. Defendeu-se por mais alguns minutos sem entender a estratégia adversária.
O jovem parou de sorrir. Estocou ameaçadoramente e recuou propositadamente. Aproveitando o espaço, o professor partiu ao ataque com a espada preparada. Levou a arma acima da cabeça, desceu-a com toda a força que lhe sobrava caindo na armadilha. O aluno não acreditava como seu simples truque não fora percebido. As longas partidas de xadrez, que jogara obrigatoriamente contra Randorill, tinham vencido a batalha.
Dera a impressão de descuido, mas sua verdadeira intenção só seria descoberta tarde demais. Contra o ataque do professor, revidaria igualmente. Levantou sua espada e rapidamente a fez descer. As laminas se tocaram no alto, novamente sentira seu braço adormecer, hesitou por alguns segundos, mas se manteve firme. Uma fissura prendia uma na outra como tinha previsto.Randorill sem perceber a gravidade de sua ação, colocou todo seu peso sobre a disputa. Passaram alguns segundos de puro silencio, e finalmente algo aconteceu. A lamina do professor começara a rachar, linhas aleatórias preencheram toda a espada. Um segundo estouro aconteceu, e os pedaços voaram.
Randorill, o professor de combate, que nunca havia perdido uma batalha na escola onde lecionava, despencou. A espada do aluno o derrubara, o golpe que destroçou sua arma o acertara em cheio. A tinta mágica tinha sido transferida totalmente a sua camisa. Uma mistura de tinta vermelha e suor, se espalhava por todo o tecido. O aluno sentiu euforia. Caiu de joelhos. Seu corpo não agüentaria nem mais um minuto de pé. Olhou o professor que levantava sem graça, fechou os olhos, abriu os braços e desmaiou.
O professor estava contente, em seu intimo sentia extrema felicidade. Aquela criança jovem e imatura que conhecera há cinco anos tinha mudado, mudado para melhor, tinha finalmente entendido. O treinamento excedera suas expectativas.
“ –Você venceu; o ciclo está completo; sua família o espera. Já pode se considerar um homem livre – Em seu rosto, um sorriso paternal – Volte para casa, Islade Valkair.”
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