sexta-feira, 24 de julho de 2009

Diário de um Escudeiro - 27

Décimo dia de Salizz de 1392

Depois da ótima noite de sono numa cama verdadeiramente confortável, mesmo para um simples escudeiro como eu (e os outros), acordei completamente refeito e pronto para voltar à nossa jornada.

Esta manhã esteve iluminada e divertida. Desde nossa saída da terra-mãe, Namalkah, que não tinha uma tão boa conversa, como as que fiz com os escudeiros e demais serviçais. Nem parece que eles viviam em uma fronteira relativamente instável. Aquela pequena cidade era um oásis de tranqüilidade.

Esta parada foi ótimo para minha mente. Deixei todas as dúvidas e pensamentos obscuros para depois e me preocupei comigo, pelo menos por algumas horas. Tanto que acordei, esta manhã, renovado.

Meu mestre também estava parecendo extremamente satisfeito com esta nossa parada. Ele não entrou em detalhes comigo, mas seu rosto transparecia que havia tido uma noite muito satisfeita, e bem acompanhado. Mesmo pela manhã ele ainda transpirava o odor forte do álcool e luxúria. Seu sorriso largo me garantia que teríamos um bom final de viagem. Eu agradecia em silêncio aos deuses por isso.

Reiniciamos nossa jornada um pouco depois do meio da manhã. Tínhamos pelo menos este dia, e mais dois, até o início da cerimônia de admissão da Ordem da Luz, em Norm. Pelo que Sir Constant declarou, ele era um dos responsáveis por alguma parte da cerimônia, ou algo parecido. Mesmo assim tínhamos tempo mais que suficiente para chegarmos ao nosso destino e meu senhor se mostrava tranqüilo.

O caminho mais seguro seria irmos no sentido oeste até a capital de Bielefeld, Roschfallen, e depois seguirmos direto para Norm. Logo que iniciamos a jornada percebi o porque de considerar este caminho como mais seguro. O fluxo pela estrada era muito grande. Muitas caravanas indo e vindo pela estrada juntamente de suas guardas pessoais. Alguns sectos de um ou outro deus peregrinando pelo território. E muitos cavaleiros, normalmente indo na mesma direção que nós.

Aos poucos íamos agregando novos companheiros à nossa ida para Norm. Quando a tarde foi chegando ao seu final, e nos aproximávamos de Roschfallen, já contávamos com um grupo de pelo menos vinte cavaleiros sustentando os mais variados estandartes, além de muitos cavalariços e escudeiros. Duas ou três carroças completavam nossa fila rumo ao festival.

Quando finalmente vislumbrei os enormes portões encravados nos muros da capital do território dos cavaleiros entendi a grandiosidade que me aguardava. Por mais que meu avô contasse de suas participações neste tipo de cerimônia eu nunca imaginei o tamanho que isto realmente representava. E olhe que nem estamos ainda na cidade de Norm.

Depois de atravessarmos os portões somos presenteados com centenas de bandeiras, flâmulas e estandartes tremulavam em cada telhado, em cada torre. Vermelhos e azuis fortes pintavam toda a parte superior da cidade, realizando um contraste com as residências de madeira e os prédios de alvenaria. As calçadas abarrotadas de sua população com rostos iluminados faziam um contra-ponto às ruas num vai-e-vem de cavalos e cavaleiros em suas armaduras metálico-reluzentes.

Pena que quando chegamos à cidade a luz do sol já estava se escondendo no horizonte e as lamparinas iniciavam seu trabalho. Contudo a impressão que tive foi das mais surpreendentes. Ainda voltarei aqui para conferir cada centímetro desta cidade.

Muitas vezes nem eu me entendo. Tenho uma ligação incrivelmente forte com as coisas da mãe Allihanna. Sempre considerei a natureza e toda a vida por ela criada e protegida como minha casa. Muito dormi ao relento, sobre a relva, tendo as estrelas e o céu por cobertura. Ao mesmo tempo as coisas ligadas à civilização – ao Reinado - me chama muito a atenção. Vivo entre estes dois mundos. Nunca havia percebido este meu lado. Também nunca havia saído de perto das terras da minha família para perceber tal coisa.

Como em Ranthor Gate pernoitamos num dos vários casarões pertencentes à umas das famílias nobres da cidade. Fui muito bem tratado e alimentado. Houve, com certeza, menos festa e alegria que em nossa última noite, mas foi igualmente confortável e prazerosa. Conheci um casal muito simpático de idosos que faz as vias de cozinheiros da ala dos serviçais. Pakhun e Kanni contaram-me que já trabalhavam ali por mais de duas décadas e que seus filhos, provavelmente, continuariam trabalhando ali. Passei uma boa noite por ali conversando e jantando com eles. Me fizeram lembrar da minha família. Quanto tempo faz que saí de casa?

De qualquer forma fizemos uma ótima comemoração entre nós. Como eu haviam pelo menos mais dez escudeiros que serviam à cavaleiros que dormiriam nesta casa, como meu senhor. Eles eram de diferentes idades e tinham igualmente diferentes histórias de vida. Eu era o mais jovem e inexperiente dentre todos e tentei absorver todas as informações que contavam-me. Me senti como um mascote daquele grupo tão alegre, e assim me trataram.

Foram ótimos momentos. Estivemos rindo e comento os ótimos assados, feitos por Kanni, até poucos momentos. Resolvi me recolher para poder escrever em meu diário – algo que tento manter o costume – senão poderia passar toda a noite e madrugada conversando ao redor daquela mesa.

Amanhã sairemos para a última parte de nossa jornada rumo à Norm.

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