Estamos nos aproximando do início dos torneios e tudo ao nosso redor transpira festividade e alegria. O povo de Tollon é extremamente transparente quanto à suas emoções. Mas ao mesmo tempo são extrovertidos ao ponto de não se conterem em si, tanto que por muitas vezes exageram. E isto aconteceu hoje.
Nosso dia começou como de costume. Mesmo longe da academia Sir Tussan fazia questão de mantermos os rigores do nosso dia-a-dia. Muito embora ele não fosse um exemplo de conduta e rigor em sua desregrada vida de cavaleiro ele sempre nos repetia que quando fossemos cavaleiros, como ele, teríamos liberdade para fazermos os que desejássemos. Mas não agora.
Os preparativos da feira estão bem adiantados. Muitas barracas são erguidas em todo o canto da praça central. Nenhuma delas está em funcionamento ainda, mas acho que será uma ótima oportunidade para encontrar alguns itens novos.
Hoje encontramos a cidade um tanto mais cheia do que de costume. Percebi muitos Tollonenses, com suas barbas repletas e desgrenhadas, percorrendo a cidade com suas famílias numerosas. Também o número de anões estava significativo. Era curioso. Depois eu fiquei sabendo que a Grande Feira é antecedida de uma semana de folga – algo quase estranho para a população deste local, acostumada com o trabalho árduo e enobrecedor. De qualquer forma isso deixava a cidade muito mais cheia e recendo um ar real de festividade.
Os cadetes tinham trabalhos específicos. Na parte da manhã tínhamos nossos afazeres e treinamentos. Saíamos com Sir Telleon para treinamento físico e depois com Sir Argnal para um treinamento prático com armas. Como éramos considerados visitas podíamos usar as dependências do quartel da milícia da cappital para nossos treinos. Mas mesmo lá dentro aqueles momentos eram disputados por muitas crianças e jovens que viam na imagem do cavaleiro, que representávamos, algo a ser venerado. Eu quase me sento uma celebridade por aqui.
Na parte da tarde nos dividíamos entre manter guarda das tendas destinadas ao Cavaleiros da Luz, próximo às arenas de disputa de jogos, e patrulhar a cidade como forma de auxilio aos organizadores dos jogos.
Eu particularmente gosto de patrulhar a cidade. Não por uma questão de orgulho, mas por ser o mais próximo que chegamos de uma verdadeira ação enquanto cavaleiros. A atividade era simples. Eu, Gustav e Arlan, num grupo, e outros três em outro, percorríamos os arredores da praça central, onde ficaria uma parte das tendas com venda de produtos, tentando intimidar qualquer tipo de roubo.
Os outros cadetes achavam isso o máximo. Eles não perdiam a oportunidade de ostentar ainda mais seus elmos e escudos. Isso nos divertia. Eles quase caiam de seus cavalos de tanto estufar seus peitos. Arlan brincava – “olha lá.... parecem pombos prontos para acasalar!!”.
Mais ao final da tarde tive uma grata surpresa. Estávamos escoltando um comerciante que havia trazido alguns cerossauros para a feira. Nossa maior preocupação era que a criançada em volta, querendo brincar com aqueles enormes animais, não fossem pisadas por descuido. Era divertido.
De repente tive a atenção chamada por uma voz familiar – “ora ora se aquela criança franzina não está desabrochando?!” Ao me virar vejo velhos amigos. Apenas alguns meses haviam se passado, mas a impressão era de uma eternidade.
Sobre a primeira de quatro grandes carroças com panos brancos estava Sullion. Com um largo sorriso o comerciante que eu conhecera meses atrás estava claramente feliz por me ver – “ou eu muito estou enganado ou você está carregando o símbolo do deus da justiça garoto!?” Eu assenti positivamente, o que resultou um grande berro de felicidade – “eu sabia.... soube disso logo depois daquele incidente na caravana em que tu foste tão providencial nos ajudando... seu destino estava determinado!” Eu fiquei meio sem jeito, mas muito feliz com o que ele havia me dito – “pois é, de escudeiro para cadete, posso considerar que evolui um bocado!” – respondi.
Mikail surgiu meio que detrás da segunda carroça, montando um cavalo de cores acinzentadas. Seu olhar de surpresa foi substituído, aos poucos, por uma enorme gargalhada.
“- Não posso acreditar... agora estão aceitando qualquer um para ser Cavaleiro da Luz? Só pode ser um sinal do fim dos tempos!” – ele ia dizendo enquanto se aproximava com sua montaria estendendo a mão para um cumprimento.
O aperto de mão foi caloroso e sincero.
“- Gustav. Arlan. Está é a companhia de comércio de Karbos e Sullion, bons amigos meus. Eu já lhes contei daquela luta em que entrei rumo à Gallienn. E este é Mikail, à quem devo minha primeira aula empunhando uma arma.”
Meus companheiros pareciam se divertir com a festividade que se tornou aquele encontro. Mesmo sobre os cavalos contei de forma resumida tudo o que havia acontecido naqueles meses, comigo, o que resultou em muitos parabéns e palavras de incentivo e apoio. Trícia e Kalla não estavam junto da caravana. Eles, como já era de se esperar, haviam se perdido por entre as tavernas ainda no início da cidade. Mikail é mais reservado e prefere não ficar enchendo a cara em meio a grandes multidões.
Mas logo me lembrei de minhas obrigações e tive que me despedir, mas com juramentos de que tão logo pudesse eu os procuraria para passarmos algum tempo junto naquele mesmo dia, coisa que fiz nesta mesma noite, horas atrás.
O resto do dia correu tranqüilo e, tão logo me vi fora de minhas obrigações corri para o local onde a caravana de Karbos e Sullion estava parada. O jantar foi farto e a diversão abundante. Gustav e Arlan, que levei junto, apreciaram muito. Nunca os vi se divertindo tanto. A presença de Trícia e Kalla, meio bêbados ainda, animou ainda mais o encontro.
Mas de tudo isso o que mais me interessou foi algumas notícias que Sullion me contará sobre sua jornada. Havia uma aldeia que eles cruzaram à três dias atrás que estava sendo aterrorizada por um grupo de bandidos muito bem organizados e comandados por uma figura misteriosa chamada Orac. A pequena vila vivia momentos de terror e considerava-se abandonada à plena sorte já que não esperava ajuda da capital de Tollon. Pelo visto eles tinham o costume de deixar que cada comunidade resolvesse seus problemas sozinha, ou até que a situação fosse insustentável. Mas pelo visto lá o insustentável já havia sido ultrapassado à algum tempo.
De forma maliciosa Sullion me olhou de canto de olho enquanto me contava tudo e finalizou dizendo – “seria uma ótima oportunidade para um grupo de valentes cadetes, não acha?!”
Eu concordei. O que mais eu desejava era um pouco de ação. Não aguentava mais ficar naquele papel diplomático. Acho que isso também incomodava Sir Tussan, mas como ele mesmo dizia - “é um mal necessário”.
Mas não custava nada eu tentar convencê-lo de nos enviar para lá pelo menos para ajudar a organizar as defesas da vila. Com a ajuda dos teleportadores poderíamos ir e voltar ainda antes do início do festival. No caminho contei para meus dois colegas que se mostraram interessados, embora que um pouco apavorados. Mas convencer eles foi fácil. Amanhã cedo eu irei conversar com Sir Tussan e os outros professores. É uma ótima oportunidade.
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