Mestre: rigoroso ou liberal?
Ser
mestre é uma tarefa que não chega a ser difícil de ser exercida, embora
necessite de um mínimo de conhecimento de regras de um sistema determinado e do
cenário jogado. Cabe à ele a função de direcionar o uso das regras, ponderar as
situações de disputa e apresentar o enredo da sessão ou campanha. Até aqui
temos o senso comum.
O
grande diferencial está em como exercer essa função de forma proveitosa na mesa
de jogo. Todos aqueles que já jogaram com mestres diferentes perceberam que não
existem dois mestres iguais. Cada um impõe sua forma de usar os NPCs, de
narrar, de fazer sonoplastia dos acontecimentos, de conduzir a história etc. Em
suma, cada um tem o seu estilo de ‘mestrar’.
Eu
poderia cometer aqui o exagero - que nem é tão exagero assim - de afirmar que
não existe formas erradas de mestrar. Mas isso desde que não se firam duas
premissas básicas do RPG – a diversão e a simulação.
O
ato de jogar RPG significa inserir uma série de jogadores em um universo
fantasioso (não necessariamente de fantasia), auxiliado por regras
determinadas, onde eles experimentarão a sensação de vivenciar tal cenário, em
uma verdadeira simulação da realidade, usando para isso, basicamente, a
imaginação.
O
ponto central para essa experimentação da realidade é o conhecimento,
compreensão e utilização das regras pelo mestre. Muitas vezes já escutamos a
celebre frase de que para se jogar RPG os jogadores nem precisam conhecer as
regras de determinado sistema. Ao mestre se delega tal função. Tudo isso
corrobora a noção de importância do mestre para o andamento do jogo e, por
conseqüência, da possibilidade de experimentação de uma realidade para o
jogador.
Com
isso podemos nos perguntar qual seria a melhor forma de exercer essa função. Se
a diversão e a simulação são os cernes centrais da prática do RPG temos que nos
valer de formas que não a delimitem além do necessário e com isso atuar, como
mestres, de uma forma que deixem os jogadores tendo uma excelente experiência
de sua prática.
Existem
duas vertentes, ao meu ver, seguidas pelos mestres. Uma delas prega o rigor das
regras e de sua utilização. A outra vertente prega a liberdade das ações sem
limites. As duas vertentes buscam a mesma coisa para os jogadores – uma boa
prática do RPG. Qual está certa? À rigor, nenhuma delas está correta em sua
plenitude.
A
vertente que prega o rigor da utilização das regras pelo mestre não o faz como
uma forma de espezinhar os coitados dos jogadores. Sua visão vai muito além
disso. Para eles uma plena e correta utilização das regras garante, sem noções
dúbias ou regras que fujam das páginas do livro, a única forma de proporcionar aos
jogadores uma plena noção da realidade que procuram. Isso aconteceria, pois
para eles as regras seriam a forma definitiva de condução do jogo e assim não
possibilitariam que qualquer imprevisto pudesse atrapalhar o jogo e a diversão.
Aqui a segurança seria o ponto principal para sua escolha. Essa forma de
proceder também lhes garante segurança em como proceder com possíveis exageros
por parte dos jogadores.
Já
a vertente da liberdade na utilização das regras o faz por ter a noção de que a
diversão está intimamente ligada à liberdade de agir por parte dos jogadores.
Este grupo confia no feeling dos jogadores, e do mestre, para que a meta do RPG
seja atingida. Eles temem que uma interferência possa acabar prejudicando tanto
o andamento do jogo quanto a forma como os jogadores. As regras existentes nos
manuais seriam meras diretrizes genéricas para serem utilizadas somente em
momentos cruciais.
Pelo
que se pode perceber, as duas vertentes têm a diversão dos jogadores como pauta
principal. Claro que trabalho aqui com a condição perfeita de mestres e
jogadores que interessados em um jogo decente. Então como equacionar isso? A
resposta é óbvia – necessitamos de um meio termo.
Nem
tanto à gregos, nem tanto à troianos, como diz o ditado. Já disse isso em outro
artigo e quero sim me tornar repetitivo... o importante é sempre o bom senso.
Sabemos que as regras nos proporcionam um ‘norte’ na condução de um sistema ou
de um cenário. Mas elas devem servir como amparo e não como âncora do mestre.
Já vi muitos jogos que simplesmente travavam, ou mesmo terminavam, por causa do
uso incessante das regras. Ao mesmo tempo já presenciei grupos de RPG que
entravam numa verdadeira espiral de loucura na hora de jogar e exageravam em
sua liberdade transformando a exceção em regra.
O
meio termo é saber quando e onde usar as regras ou quando e como puxar as
rédeas dos jogadores. O mestre deve ter noção que o jogo de RPG precisa de
fluidez e ritmo para ser cativante e interessante para os jogadores. Isso só é alcançado
quando as regras passam a ter um papel secundário na prática do RPG, como sendo
apenas elementos para consulta quando necessárias. Lógico que para que isso
funcione o mestre também deve observar (não impôr) que a condução das ações dos
jogadores permaneçam dentro de um certo limite aceitável. E para isso não é
preciso jogar regras e regras em cima deles. Basta mostrar-lhes que estão
extrapolando. Junto deste bom senso uma boa dose de interação entre mestre e
jogadores é fundamental também, pois o respeito às interferências mostra-se
importante.
Como
disse antes, quando mestre e jogadores estão dividindo juntos a
responsabilidade por um jogo que lhes proporcione sensações únicas e
gratificantes, tudo fica muito mais fácil.
Então
para que isso dê certo aqui vão umas dicas básicas:
-
use as regras apenas quando for indispensável;
-
não tire vantagem das regras para alterar o andamento do jogo, faça isso através
do enredo;
-
não altere as regras apenas para ter razão, se vais cobrar as regras o faça de
forma coerente e correta;
-
não conduza o jogo no lugar do jogador, deixe ele tomar as decisões;
-
esteja preparado para contratempos no andamento do jogo, e resolva com
criatividade e não com a imposição de regras.
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