Dicas do Mestre
Torne seu jogador especial
Em
alguns casos o início de uma nova aventura ou campanha torna-se um tanto
estressante. Uma queda de braço tem início entre mestre e jogadores para a
criação de seus personagens e uma barganha impressionante inicia onde cada ponto
para construção do personagem é debatido. Em cada sistema, com suas
peculiaridades, os jogadores querem tirar o melhor proveito dentro de algumas
diretrizes dadas pelo mestre e que se encaixem em sua aventura proposta. Já o
mestre tenta manter todos com rédeas curtas pensando em não deixar que o
equilíbrio inicial seja quebrado.
Uma
coisa é certa, todo jogador ou mestre de RPG procura algo muitas vezes
diferente de si quando ingressa neste hobby. Ele quer ser o herói, o
aventureiro, o guerreio espacial, o matador de zumbis. Ele quer proteger os
fracos, matar o vilão e salvar o dia. Mesmo que ele queira ser ‘ele’ mesmo, ele
será uma versão sua salvando o dia de alguma forma. Esse rpgista quer ser
especial de alguma forma.
Demorei
um pouco para perceber isso em meus anos iniciais como mestre e mesmo como
jogador. Quando percebemos esse importante detalhe começamos a ver com outros
olhos o momento de criação de um personagem, tanto para nós quanto para nosso
amigos, e as tentativas, até certo ponto engraçadas, dos jogadores em montar
seu alter ego ‘especial’. Sei que esta é uma questão importante e delicada para
muitos mestres que desejam manter uma certa tranquilidade na condução de sua
aventura que levou horas, quiçá dias, para ser contada.
A
questão aqui é: por que não fazer seu jogador se sentir especial, valorizando
de uma forma diferente o personagem dele. Esta ideia não é minha, mas seria
impossível dormir novamente sem repassa-la para nossos mestres e jogadores
depois que a li. Não só isso, eu tentarei desenvolve-la um pouquinho mais aqui.
Muitos
livros, quadrinhos, séries e filmes começam com uma pessoa aparentemente comum
que se descobre, inesperadamente, especial. Não estou falando para adotarmos a
famosa e batida ‘jornada do herói’, pois em nosso caso aqui a pessoa já é um
herói. Estou indo além. Estou falando de valorizar e surpreender nosso jogador
demonstrando que ele é especial. Algo que ele desconhecia sobre si mesmo. Não
um pequeno detalhe, mas algo significativo a ponto de mudar seu rumo na
aventura.
Vamos
delimitar o caso com as perguntas básicas – quem, quando e como.
Quem
Este
pode ser o primeiro desafio do mestre sobre esta dica. Você não pode tornar
todos os jogadores do grupo de aventureiros especiais, pois logicamente nenhum
deles seria verdadeiramente especial. Particularmente eu gosto de surpresas e
um simples sorteio com uma rolagem de dados seria ótimo para indicar um dos
membros. Essa aleatoriedade também trás o elemento da surpresa para o próprio
mestre.
Quando
preparamos uma aventura para um grupo regular, como mestres temos uma ideia de
qual cena cada jogador do grupo mais apreciará ou as quests que cada um mais
participará. Aqui, se escolhermos de antemão um jogador, corremos o risco de
prepararmos uma aventura ou campanha específica para ele (o que também não
seria nenhuma heresia, mas não é o foco deste artigo) quando na verdade o que
desejamos é mantermos a aventura, mas com um elemento novo.
O
impacto na mesa de jogo será grande e espera-se que isso influencie a
interpretação e modo de ser e de se verem dos personagens. Relações de poder e
mudança no status quo do grupo são um combustível muito interessante para
incendiar a relação intrapersonagens e deles com o cenário. O potencial é
grande!
Quando
Tornar
um jogador especial, mesmo que aleatoriamente, deve estar nos planos da
aventura, pelo menos num primeiro momento. Não estou dizendo para que seja tudo
planejado nos mínimos detalhes, mas a aventura tem de saber que isso acontecerá
ou pelo menos estar interligada de alguma forma ao enredo. Além disso, não
procure ter pressa, pois a surpresa será ainda maior e mais gratificante. Uma
boa pedida e lançar um problema à longo prazo sem que o grupo tenha a solução e
ir plantando aos poucos pistas sobre essa surpresa.
Seria
antiprodutivo simplesmente jogar no colo do grupo uma mudança dessas sem
qualquer explicação. Crie o clima, alimente as dúvidas e suspeitas, dê pistas e
encerre tudo com um impressionante clímax. Como qualquer outro elemento dentro
do RPG o mestre deve ter o feeling do momento de começar a introduzir a
mudança.
Como
O
‘como’ talvez seja a parte mais trabalhosa e está intimamente ligada ao
‘quando’. Existem muitas formas criativas que os mestres podem fazer uso para
que os jogadores descubram que existe algo de diferente. Como dito
anteriormente é importante não ter pressa. Dicas desta natureza podem surgir
várias sessões antes de finalmente terem certeza de que algo está acontecendo.
Mas as pistas são apenas um detalhe que culminará com algum fato em especial
que esbarrará com o grupo.
Podem
ser várias coisas diferentes. Uma magia de detecção pode indicar algo indeterminado
que leve o grupo a pesquisar ou procurar ajuda. Um feitiço de uma armadilha,
que não teria efeito sobre magos, pode não fazer efeito sobre um aventureiro
que supostamente seria afetado. Um diário antigo dos pais de algum dos membros
do grupo pode ser encontrado com algumas dicas ou revelações impressionantes.
Um vilão sabe um segredo ou fragmento de informação sobre um dos aventureiros e
barganha sua liberdade com o grupo. Os meios são muitos. Dependerá muito de
qual a mudança que ocorrerá, com quem ocorrerá e de forma isso se ligará com a
campanha.
Dicas finais
Não
esqueça que isso não é uma forma de rebaixar os outros membros do grupo, mas de
valorizar um dos personagens para dar novo tempero à aventura e às
possibilidades de interpretação. Não esqueça também que isso não é simplesmente
uma questão de fazer uma alteração e pronto. Implica em um certo grau de
preparo e preocupação com as formas de introduzir essa mudanças aos jogadores.
Vamos
recapitular então com dicas rápidas:
-
Antes de tudo decida qual será a ‘prêmio’ que o jogador sortudo ganhará (uma
nova classe, habilidade, perícias, status etc);
-
Escolha como isso será descoberto ou detectado (magia, NPC, diário, carta
anônima, parente, etc);
-
De alguns passos para trás e crie um background para essa mudança (história,
significado, motivos e particularidades) ligada à aventura;
-
Decida quando as pistas começarão a ser apresentadas.
Vejamos
um exemplo prático:
“Em meio à campanha um grupo de cinco
aventureiros (a clássica formação guerreiro, ladino, ranger, mago e clérigo)
entra em uma simpática lojinha de produtos mágicos para comprar alguns
pergaminhos e ingredientes para a próxima jornada. Eles terão de enfrentar um
poderoso mago particularmente perigoso e especialista em magias de fogo. Como o
mago do grupo não tem especialidade ou poder para nada que contraponha seu
futuro adversário eles pensam em se munir de tudo o que for útil. Ao entrar na
loja a sineta na porta tilinta e de trás de uma cortina esfarrapada surge uma
figura muito simpática, uma senhora com um pequeno par de óculos na ponta do
nariz e um sorriso agradável.
- Ora, ora... em que posso ajudar dois
excelentíssimos magos nesta adorável manhã?
- Desculpe senhora, mas só eu sou mago
aqui – disse apressadamente o mago do grupo.
- Creio que não meu amiguinho... minha
intuição é perfeita para detectar detentores de poder mágico por perto... posso
não saber quem, mas sei com certeza que temos dois magos aqui!”
Todos se entreolham sem entender o que
está acontecendo.”
Um comentário:
Muito legal a dica!
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