PARTIÇÕES DO ESCUDO
Pode
parecer a mesma coisa, mas ‘Partição’ (chamadas também de Ordinária) necessariamente
não está relacionado às ‘partes’ do campo do escudo (vistas na postagem
anterior). O escudo possui partes específicas, que não importa o que fizermos,
sempre estarão ali nos orientando sobre uma área do escudo. As partições,
diferente disso, indicam que o campo do escudo está dividido como que montado. Nesses
casos dizemos que o escudo está partido.
Um
detalhe importante tem relação com a natureza dessas partições e sua noção
exata é crucial tanto para a compreensão do que vemos, quanto para descrevermos
o brasão. A partição é como se uníssemos duas (ou mais partes) de campos em um
só, e isso é muito importante de ser entendido. A prática de dividir campos de
brasões e unir partes em um só, comumente chamada de ordenamento, e expressava
soberania, aliança, descendência, ocupação de um território etc.
Inicialmente
a forma de realizar esse ordenamento era por dimidiação - apenas unindo metades
(ou fragmentos, conforme o tipo de partição) de cada brasão para compor um
novo. A história dá sinais de que a prática, diferente do que muitos pensam,
não surgiu por questões militares, e sim matrimoniais. O normal (e era
entendido assim) era que o brasão da esposa fosse partido na vertical ao centro
e unido ao do marido, tal qual uma anexação, visando deixar claro à quem as
terras de herança dela pertenciam agora. Assim o marido mantinha seu brasão
intacto e a esposa possuía um brasão partido (o do marido à destra/direita e o
da esposa à sinistro/esquerda). Essa prática não foi muito longeva, entrando em
declínio no século XV, já que criava na maioria das vezes brasões confusos e
esteticamente desagradáveis. Mas pior do que isso, muitas vezes a dimidiação
criava algo que pareceria ser um novo brasão.
A
dimidiação foi sendo substituída pelo impalamento. Conforme perceberam os
problemas que a dimidiação causava, a primeira resposta foi de tentar colocar
em cada parte dois terço do brasão original, espremendo-o, tentando manter o
máximo da estrutura original. Por lógica, logo começaram a espremer todo o
brasão e colocá-lo de cada lado sendo que os primeiros exemplos remontam o
século XIV. O impalamento é a prática de reduzir os brasões que serão
introduzidos na partição de forma que mantenham a sua estrutura total em cada
parte. Esta prática é utilizada até os dias de hoje.
Não
há uma regra específica que limite o número de brasões impalados. Um exemplo
extremo disso é o brasão de Richard, 2º Duqe de Buckinghan e Chandos, como nada
menos do que 719 brasões impalados.
As
ordinárias são diferentes das honrarias (ou peças de honrarias, que veremos
futuramente) que são peças colocadas sobre o escudo, dando a impressão de que
ele também está montado. Por que isso é importante? Para começar para termos
uma adequada leitura do brasão. Em segundo por uma questão de interpretação do
que ele representa, pois uma honraria é concedida e uma partição é criada ou
conquistada. Além disso, como já vimos nas regras da heráldica, não podemos colocar
cor sobre cor, ou seja, não podemos colocar esmalte sobre esmalte ou metal
sobre metal – a chamada regra da contrariedade das cores. Mas como a própria
definição de partição nos esclarece, ela não coloca algo sobre algo, mas algo ao
lado de algo. Sendo assim, poderemos sim colocar um metal ao lado de um metal
ou um esmalte ao lado de um esmalte, ignorando a regra. Essa regra da
utilização das cores está intimamente ligada à questão das honrarias. Veja a
imagem abaixo para ficar mais claro:
Partições Ordinárias |
Honrarias |
Temos
aqui outro detalhe para atentarmos na relação entre ordinárias e honrarias. Os
nomes que usamos para nos referirmos às ordinárias, além de terem ligação ao
tipo de partição, também podem estar relacionados às honrarias sob a forma de
elementos geométricos simples no escudo de forma semelhante às partições. Essa
confusão ocorre, pois as várias ordinárias recebem seu nome conforme a posição,
forma ou sentido com o qual o escudo está partido. Esses mesmos nomes são
utilizados pelas honrarias para demonstrar a posição, forma ou sentido delas
sobre o campo do escudo. Veremos isso no futuro.
Visualmente
delimitamos a partição por uma linha (ornamentada ou não) dividindo o campo do
escudo e percorrendo-o de borda a borda. Existe uma grande série de partições
que foram e são utilizadas na heráldica. Elas são divididas em dois tipos: as ordinárias
e os diminutivos de ordinárias. Quando o escudo não possui partições dizemos
que ele está Pleno (limpo).
Partições
Ordinárias
Também
conhecidas por honoráveis, as partições ordinárias são consideradas as
principais ou primeiras, pois delas todas as outras teriam se originado. Há
alguma controvérsia conforme o século ou a escola heráldica que se usa como
base, variando entre sete e dez partições ordinárias. Trabalharemos com oito
partições ordinárias, aquelas mais amplamente aceitas. São elas: Partido (Pale),
Cortado (Fess), Fendido (Bend), Talhado (Bend Sinister), Quartelado (Quartely
ou Cross), Franchado (Saltire), Em Asna (Chevron - e sua variação em Em Asna
Invertido, embora muito raro) e Terciado (Pall - e suas variações). A linha
delimitadora da partição ordinária passa pelo centro do campo do escudo, não
necessariamente dividindo-o em duas partes iguais.
Partido:
uma linha partindo o escudo na vertical em seu centro.
Cortado:
uma linha partindo o escudo na horizontal em seu centro.
Fendido:
uma linha partindo o escudo na diagonal descendente da esquerda (sinistra) para
a direita (destra), partindo de seu canto superior.
Talhado:
uma linha partindo o escudo na diagonal ascendente da esquerda (sinistra) para
a direita (destra), finalizando em seu canto superior.
Quartelado/Esquartelado:
duas linhas (horizontal e vertical) cruzando-se ao centro do escudo. Seria uma
combinação das partições partido e cortado. Desta união formam-se quatro partes
chamadas de quartel.
Franchado/Esquartelado
em Aspa: duas linhas verticais partindo de ambos os cantos superiores e se
cruzando ao centro do escudo. Seria uma combinação das partições fendido e
talhado.
Em
Asna: duas linhas diagonais se encontrando ao centro do escudo partindo de sua
parte inferior formando um “v” invertido. A Asna Invertida seria formada por
duas linhas diagonais que partem dos cantos superiores do escudo e se encontram
no centro, formando um “v”.
Terciado:
escudo dividido em três partes. O terciado pode ser dividido principalmente em
tipos. O mais comum e que dá o nome à partição tem linhas que se encontram sem
eu centro, tendo partido dos cantos superiores e da base do escudo, formando um
“Y”, chamado de Terciado. O Terciado Invertido seria um escudo dividido em três
partes, com linhas que se encontram em seu centro, tendo partido duas delas das
laterais inferiores do escudo e um do centro da borda inferior, formando um “Y”
invertido. O Terciado em Faixa é composto por duas linhas horizontais e
paralelas. O Terciado em Pala é composto por duas linhas verticais paralelas. O
Terciado em Banda é composto por duas linhas diagonais paralelas descendentes
da esquerda para a direita. O Terciado em Barra é composto por duas linhas
diagonais paralelas ascendentes da esquerda para a direita. Alguns autores chamam as variações do terciado
como sendo partições sub-ordinárias. Com relação aos Terciados, ainda, é
importante ressaltar uma questão importante. As partições representam a junção
de partes de escudos diferentes. Neste sentido, quando temos um escudo
terciado, teremos três partes ‘diferentes’, não importando qual variação seja.
Para terminar, ainda temos o Terciado em Mantel, semelhante ao terciado
invertido, mas com linhas arredondadas tal qual uma chave deitada para separar
a base.
Temos
mais duas partições que não se enquadram nem nas oridnárias principais e nem
nos diminutivos - são o Gironado e o Contra-quartelado. O Gironado seria a
união das partições quartelado e franchado, formando normalmente oito partes
triangulares, chamadas de girões. Esta quantidade pode variar de seis à doze
girões no campo do escudo. Já o Contra-quartelado ocorre quando dois quartéis opostos
de um escudo quartelado tem seu interior também quartelado.
Diminutivo
das Ordinárias
Os
diminutivos das ordinárias, também chamados de Variações de Ordinárias, existem,
embora poucas vezes acabem por representar frações de dois escudos complexos. Em
uma linguagem simplista, os diminutivos das partições seria como se
fracionássemos dois escudos no sentido de algumas partições. Eles são em número
de cinco: Barry (oriundo do cortado), Paly (oriundo do partido), Bendy (oriundo
do fendido) e Chevronelly (oriundo do chevron), Chequy (oriundo do quartelado)
e o Lozengy (oriundo do franchado). A heráldica alemã considera o gironado uma
variação, enquanto a heráldica inglesa o considera como uma ordinária
propriamente dita.
Combinação
das Ordinárias
As
combinações acontecem quando um dos campos de uma partição é ele mesmo é
particionado (uma ou mais vezes, em alguns casos). Para que as combinações sejam
consideradas assim é necessário que cada uma das três partições sejam um
elemento em si. As partições ordinárias podem ser combinadas de quatro formas:
o Partido cortado, o Cortado partido, o Fendido Talhado e o Partido e Cortado
combinados.
Pode
haver confusão entre a partição ordinária quartelada, o diminutivo Chequy e o
combinado de partido e cortado. A diferenciação está na quantidade de quartéis,
enquanto o quartelado tem apenas quatro e o Chequy tem mais de vinte, o combinado
pode ter 6, 8, 10, 12 ou 16 quartéis.
Descrição
Tendo
claro quais são as partições ordinárias nossa preocupação passa a ser como
descrevê-las apenas verbalmente. Nossa preocupação aqui é apresentar a partição
e os esmaltes que a formam de uma maneira que quem o descreve é perfeitamente
entendido por aquele que o escuta, sem a necessidade de imagem. Primeiramente
anunciamos que o escudo está partido e o tipo de partição (com uma pequena
variação que será exemplificada nos exemplos, abaixo), logo em seguida a ordem
dos esmaltes. Mas qual a ordem correta para começar a descrever as cores?
Começamos
apresentando o esmalte que estiver no topo do escudo ou em maior quantidade no
topo do escudo, passando em seguida para o segundo esmalte (quando apenas com dois
esmaltes como no caso de Cortado, Fendido, Talhado, Franchado, Em Asna e Em
Asna Invertida). Se houver dois esmaltes em igual quantidade no topo do escudo,
começamos descrevendo aquele que estiver à esquerda (sinistra), passando logo
em seguida para o da direita (Partido) e seguindo no sentido horário (Quartelado).
No caso do Franchado e do Quartelado, que temos cores duplas, as nomeamos aos
pares (veja exemplos abaixo).
De ouro partido em vermelho
ou partido de ouro e vermleho
De
prata, cortado em azul
ou cortado de prata e azul
Fendido,
o primeiro em prata,
o segundo em verde
Talhado,
o primeiro em vermelho,
o segundo em preto
Em
Asna, o primeiro em vermelho,
o segundo em ouro
Em
Asna Invertida, o primeiro em prata,
o segundo em verde
Franchado,
o primeiro e quarto de ouro,
o segundo e terceiro púrpura
De
ouro, esquartelado em vermelho
Quando
temos três esmaltes as coisas se complicam um pouco. No caso do Terciado,
apresentamos primeiramente o esmalte do topo, passando para o da direita e, em
seguida, o da esquerda (sentido horário a partir do topo). Com o Terciado
Invertido, o Terciado em Pala e o Terciado em Mantel, começamos com o esmalte
mais à esquerda e seguimos o sentido horário para os próximos. Para os
Terciados em Faixa, Banda e Barra, começamos com o esmalte no topo ou em maior
quantidade no topo e passamos a descrever os seguintes pelo esmalte do meio e
depois o da base.
Terciado,
1º em azul, 2º em verde, 3º em vermelho.
Brasão da vila francesa Avon.
Terciado
em Faixa, 1º em ouro, 2º em argenta, 3º em vermelho.
Brasão da vila francesa de
Chartres.
Terciado
em Banda, 1º argenta, 2º verde, 3º preto.
Brasão de Chapitre de Cosne.
Terciando
em Barra, 1ª em ouro, 2º em vermelho, 3º em azul.
Brasão de La Uzun.
Terciado
invertido, 1º em ouro, 2º em vermelho, 3º em verde.
Brasão da vila francesa
Issans
Terciado
em Pala, 1º em ouro, 2º em preto, 3º em argenta.
Brasão de Mazerolles Du Razés
A
descrição do Gironado leva em consideração dois elementos – quantidade de
girões e cor. Quando o escudo tiver 8 girões, dizemos apenas que o escudo é ‘gironado’,
e se ele tiver mais, dizemos ‘gironado em’ e acrescentamos a quantidade de
girões. A seguir introduzimos as cores tomando por base uma posição do primeiro
girão antes do topo do escudo (ver imagem abaixo).
Para
a descrição do Contra-quartelado temos que tomar um cuidado em especial.
Começamos sua descrição pelo quartel superior à esquerda (que estará quartelado),
especificando-o como se ele fosse um escudo em si e depois declaramos o quartel
da direita. Abaixo temos: Quartelado, o 1º e 4º contra-quartelado – o primeiro
e quarto de ouro, o segundo e o terceiro vermelho – o segundo e terceiro azul
Para
as combinações, apresentamos primeiramente a partição. Em segundo o que vier
primeiro – ou a parte maior ou a combinação – descrevendo seus esmaltes. Abaixo
temos dois exemplo mais comuns. O primeiro deles é partido, o 1º em ouro, o
segundo cortado de vermelho e azul; o segundo é cortado, o primeiro em ouro, o
segundo partido de azul e verde.
Um
esclarecimento importante. Estamos apresentando as partições, e suas
descrições, nos formatos mais simples, pois são base para muitos assuntos
vindouros Bem sabemos que escudos partidos podem conter fragmentos ou escudos
complexos em sua composição e a sua adequada descrição vai muito além do
apresentado no parágrafo anterior. Para descrevermos escudos partidos mais
complexos precisamos apresentar muitos outros elementos. A descrição adequada é
um conjunto cumulativo de conhecimentos e conceitos.
2 comentários:
Espero que continue com seu material, pois está sendo muito útil para mim
Que bom que está gostando... Pretendo continuar sim, e espero que consiga manter uma periodicidade mais exata!!!
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