terça-feira, 17 de maio de 2022

A importância do mestre ser imparcial

  
A importância do mestre ser imparcial

 
Parece uma coisa óbvia de se dizer quando falamos de RPG, mas muitas vezes é necessário relembrar o óbvio. Depois de uma desagradável experiência recente em uma campanha de RPG, resolvi tocar nesse assunto que em um primeiro momento poderia parecer, para a maioria, como uma simples dica que deveria ser direcionada à novatos.

RPG é um hobby socializante onde pessoas se reúnem para compartilhar uma experiência, baseada em um determinado sistema de regras em um determinado cenário. Embora haja posições (funções) distintas para mestre e jogadores – pelo menos na maioria dos sistemas –, a função fim proporcionada pelo RPG é a mesma para ambos – diversão.

Diversão é um termo um tanto amplo e repleto de nuances conforme a expectativa de cada um, mas no final das contas é o que todos os que abraçam o RPG procuram. E para chegar à isso não é preciso muito – respeitar os outros jogadores, ter empatia pela diversão do outro e manter os acordos implícitos da mesa, como seguir as regras ou quais regras seguir de forma que todos sejam contemplados.

 Para isso funcionar adequadamente o mestre possui uma função um tanto determinada. Cabe à ele servir de mediador entre as regras/aventura e as ações dos jogadores, apontando quais regras ou jogadas são necessárias, julgando quais o peso das dificuldades, dando vida à NPCs e quaisquer outras necessidades que o sistema de regras/aventura/cenário imponha à mesa.

Para que tudo isso conduza todos os participantes da mesa (mestre e jogadores) à diversão desejada, espera-se que o mestre exerça sua função no mínimo de forma isenta, ou seja, não quebre com as expectativas que os participantes têm com relação ao acordo implícito de que ele fará tudo andar de forma justa nessa relação.

Quando o mestre exerce essa função da forma esperada – e não estou aqui entrando no debate de como mestrar – isso cria uma conexão entre todos. No meu caso, isso cria um sentimento de segurança de que as coisas estão sendo feitas da forma correta. Não é sobre fazer combos, “vencer”, haver plot twist ou de não sofrer um TPK (sigla para Total Party Kill), mas sim de todos terem a real noção de que qualquer coisa que aconteça na mesa com os personagens chegou àquele ponto de forma correta e natural. Minhas melhores e memoráveis experiências em mesa foram quando meus personagens sofreram grandes reveses ou morreram. É uma grande satisfação saber que as coisas estão no seu lugar.

Para tudo isso o mestre tem um papel importante. Mas e quando ele foge desse tipo de ação? O que acontece quando ele deixa de lado a sua isenção frente à condução da mesa? Quando isso acontece a confiança é quebrada em vários níveis.

Quando jogamos RPG decidimos pelas ações de nossos personagens. Como ele agirá, como ele se relacionará com os NPCs, estratégias de combate e tantas outras coisas, contribuindo para a construção de nosso personagem na mesa e para nós mesmos. Para isso usamos certos parâmetros simples de causa e consequência, parâmetros esses baseados no conhecimento das regras, no conhecimento e na interação com o cenário e na confiança nas decisões do mestre. Quando o mestre se torna parcial – ou seja, pondera e aplica as regras de forma que seu embasamento não está sustentado na neutralidade ou na manutenção do dito ‘acordo’ ou está baseado em interesses próprios ligados às suas preferencias do que “acha mais interessante” ou para sustentar artificialmente algum ponto da aventura – isso faz com que os jogadores não tenham tranquilidade em tomar suas ações.

Quando isso acontece o jogador fica em meio à insegurança. Ele não tem mais como ponderar como seu personagem deve agir, pois não há parâmetros definidos.

Pior ainda é quando o mestre tem ações/decisões diferentes para jogadores diferentes. Além da insegurança já comentada anteriormente, isso gera um enorme desconforto, pois quebra o acordo e atinge em cheio a relação pessoal do mestre com os jogadores (pelo menos aqueles que foram desconsiderados pelo mestre). Se o RPG é um hobby socializante, isso põe por terra a relação entre alguns membros da mesa e está fadado ou a terminar a mesa antecipadamente ou em ir até o fim, mas com aquele gosto amargo de foi uma péssima experiência.

Não importa qual das ações do mestre descritas acima, qualquer uma delas não resultará na diversão almejada por todos. Este tipo de problema pode parecer algo que deva ser passado para mestres novatos, mas infelizmente nenhum mestre com alguma experiência está livre de cometer esses equívocos. Mestres veteranos podem facilmente esbarrar nesse problema sem nem ao menos se dar conta.

O importante é estarmos nos policiando constantemente enquanto estivermos mestrando e ter sempre um canal de comunicação claro e sem barreiras com todos os membros da mesa. Qualquer um que está mestre precisa ter a nítida noção de que sua posição não é de poder, mas de função. Os jogadores precisam estar sempre atentos para que qualquer equívoco do mestre possa ser conversado claramente e não seja deixado passar. O elemento socializante da mesa também passa por essa relação direta e sincera entre seus participantes.

Enquanto todos estiverem mirando na diversão de todos e deixando isso claro uns para os outros, o resultado será sempre satisfatório.

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