quarta-feira, 6 de julho de 2022

Material de Apoio – Lâminas 46 Quanto realmente pesava uma espada?

  
Material de Apoio – Lâminas 46
Quanto realmente pesava uma espada?

 
Não tenho certeza de onde surgiu a noção de que espadas pesavam exageradamente o suficiente para restringir quem poderia as usar, mas isso é um equívoco das pessoas comum que permeia pessoas que não tenham conhecimento histórico ou que não praticam esgrima nos vários grupos de praticantes entusiastas de esgrima histórica. Muito se escuta que o grande peso das espadas dificultaria seu manuseio por parte de pessoas de porte pequeno ou mulheres. Nada disso, e vamos passar por essa questão rapidamente aqui para esclarecer um pouco as coisas e não se precisa de muita pesquisa para isso.

Muito desse desentendimento vem em grande parte do uso de abuso das espadas na mídia de forma geral. Quadrinhos, cinema, seriados e livros tratam espadas mais por seus interesses particulares quanto à história que desejam contar do que por pesquisa história e interesse com a veracidade, mas a história é outra.

Basta uma ida à um museu especializado em armamentos medievais que historicamente as espadas não eram exageradamente pesadas nem frágeis (por não serem pesadas). Embora uma informação crucial quanto o peso das espadas fosse de grande interesse para curadores e historiadores sobre armas, não há nenhum livro de referência relevante que realmente liste os pesos de diferentes tipos de espadas e, quem sabe, por isso mesmo é que haja tanta controvérsia quanto à isso. Ao mesmo tempo existem algumas fontes respeitadas que fornecem estatísticas valiosas para isso como, por exemplo, o extenso catálogo de espadas do Wallace Collection Museum, em Londres, que lista prontamente dezenas de belos exemplares, entre os quais é difícil encontrar algum pesando mais de 1,8Kg (cerca de 4 libras). De fato, a maioria dos exemplares, de rapieiras, espadas de uma mão e espadas de duas mãos, pesam muito menos de 1,3Kg (cerca de 3 libras).


Apesar do que o senso comum e dos especialistas de wikipédia alegam, as espadas medievais eram de fato leves, manejáveis ​​e, em média, pesavam menos de 1,3Kg. Como o especialista em espadas Ewart Oakeshott declarou: “Espadas medievais não são nem pesadas nem todas iguais - o peso médio de qualquer uma de tamanho normal é entre 1,1kg (2,5 libras) e 1,5kg (3,5 libras). As espadas raramente pesam mais de 2kg (4,5 libras). Esses pesos, para homens que foram treinados para usar a espada desde os sete anos de idade (e que tinham que ser espécimes resistentes para sobreviver a essa época), não eram grandes demais para serem práticos.” (Sword in Hand, p. 13). 

As espadas medievais em geral eram armas de combate resultante de uma evolução tecnológica da metalurgia da época, leves e ágeis, capazes de igualmente cortar ou perfurar. Elas estavam longe das coisas desajeitadas e pesadas que costumam ser retratadas na mídia popular. Nos livros da série Arms, de Liliane Funcken e Fred Funken é dito: “a espada era, de fato, surpreendentemente leve. o peso médio das espadas dos séculos X ao XV era de 1,3 kg, enquanto no século XVI era de 0,9 kg. Mesmo as espadas bastardas mais pesadas que eram usadas apenas por combatentes de segundo grau não excediam 1,6 kg, enquanto as espadas conhecidas como espadas de ‘mão e meia’ pesavam em média 1,8 kg. Quando as devidas concessões são feitas, esses números surpreendentemente baixos também valem para a enorme espada de duas mãos, que tradicionalmente era empunhadas apenas pelo ‘verdadeiro Hércules’. No entanto, raramente pesava mais de 3 kg.” (Part 3, p. 26).

A partir do século 16, é claro que houve desfiles especiais ou espadas que pesavam até 3,5kg ou 4kg libras ou mais, no entanto, essas peças monstruosas não eram armas de combate e não há evidências de que elas tenham sido destinadas para uso em qualquer tipo de combate. De fato, não faria sentido, já que havia outros modelos de combate muito mais manejáveis
​​disponíveis, que eram vários quilos mais leves. Dr. Hans-Peter Hils em sua dissertação de 1985 sobre o trabalho do grande mestre do século 14, Johannes Liechtenauer, observou que desde o século 19 muitas coleções de museus de armas normalmente apresentam imensas espadas como se fossem armas de combate reais, ignorando o fato de que são não apenas com arestas rombas, mas de tamanho e peso impraticáveis em campo de batalha, bem como mal balanceadas para uso eficaz. (Hils, p. 269-286).

Mesmo com todas as evidências, a crença de que as espadas medievais eram pesadas ou difíceis de usar ainda é recorrente. É até mesmo um desafio tentar encontrar um autor de esgrima do século XIX (e até mesmo do século XX) que não declare inequivocamente em seus escritos que as espadas eram “pesadas”, “incômodas”, “desajeitadas”, “desajeitado” e (em um completo mal-entendido do manuseio, propósito e aplicação de tais armas diversas) foram projetados apenas para “atacar”. Muito disso vem do imaginário e da noção de poder que a imagem da espada trás junto de si.

Indo um pouco além, em algumas ponderações do fabricante de espadas John Latham, da William Swords, escritas em 1863, ele dizia que uma espada com peso tremendo, necessitaria de uma força enorme para ser manejada e que seria impossível dar velocidade tamanha para seu corte, resultando em um resultado nulo (Shape, p. 420-422). Ele continuava ponderando chegando a conclusão de que é um erro comum acreditar que um homem forte pegaria uma espada mais pesada para poder causar mais danos com ela e que o ideal é a relação certa entre peso e eficiência da espada - “O peso que um homem pode mover com a maior velocidade é aquele com o qual ele produzirá o maior efeito, mas a espada mais leve não é necessariamente aquela que ele pode mover mais rápido. É possível que uma espada seja tão leve que sintamos a resistência do ar ao fazer um corte com ela, e é isso que expressamos quando dizemos que uma espada parece 'chicotada' na mão. Tal espada é pior do que uma muito pesada.” (Shape, p. 414-415). Uma espada certamente tinha que ter massa suficiente para suportar um fio e uma ponta, ser capaz de aparar golpes e também dar um golpe de peso, mas ao mesmo tempo não poderia ser tão pesada a ponto de ser lenta e incontrolável. Esse peso necessário era um fator para o qual a lâmina era projetada, seja para cortar, perfurar ou fazer as duas coisas contra quaisquer materiais específicos que ela encontrasse.


O certo é que entre a especulação e a história eu prefiro sempre a história, embora possa não parecer tão “legal”. Os muitos tipos de espadas medievais e renascentistas eram armas versáteis, ágeis e altamente eficazes, e é por isso que elas existiram por tanto tempo em tantas formas. Como uma ferramenta de autoproteção seria tão desajeitada ou exclusiva em suas dimensões e uso teria sido continuamente popular por tantos séculos? Alegações de que consistiam apenas em cortes grosseiros e movimentos descoordenados quando usadas por pessoas “normais” insultam o quão versáteis e elegantes essas lâminas de combate realmente eram. Existiam alguns tipos maiores e pesadas? Sim, mas eram a exceção da exceção, enquanto a grande maioria pesava menos do que se imaginava.

Abaixo, veja uma imagem comparando o peso real de certas espadas com coisas usuais dos dias de hoje. Vá lá e experimente empunhar essas coisas e imagine que aquele é o peso real de uma espada. A imagem foi criada pela Swordwind (Escola Histórica de Artes Marciais Europeia) com bases na coleção de espadas do Royal Armouries Museum, em Leeds, Reino Unido.



Bons jogos!

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