Material de Apoio –
Lâminas 46
Quanto realmente
pesava uma espada?
Não
tenho certeza de onde surgiu a noção de que espadas pesavam exageradamente o
suficiente para restringir quem poderia as usar, mas isso é um equívoco das
pessoas comum que permeia pessoas que não tenham conhecimento histórico ou que
não praticam esgrima nos vários grupos de praticantes entusiastas de esgrima histórica.
Muito se escuta que o grande peso das espadas dificultaria seu manuseio por
parte de pessoas de porte pequeno ou mulheres. Nada disso, e vamos passar por
essa questão rapidamente aqui para esclarecer um pouco as coisas e não se
precisa de muita pesquisa para isso.
Muito
desse desentendimento vem em grande parte do uso de abuso das espadas na mídia
de forma geral. Quadrinhos, cinema, seriados e livros tratam espadas mais por
seus interesses particulares quanto à história que desejam contar do que por pesquisa
história e interesse com a veracidade, mas a história é outra.
Basta
uma ida à um museu especializado em armamentos medievais que historicamente as
espadas não eram exageradamente pesadas nem frágeis (por não serem pesadas). Embora
uma informação crucial quanto o peso das espadas fosse de grande interesse para
curadores e historiadores sobre armas, não há nenhum livro de referência relevante
que realmente liste os pesos de diferentes tipos de espadas e, quem sabe, por
isso mesmo é que haja tanta controvérsia quanto à isso. Ao mesmo tempo existem
algumas fontes respeitadas que fornecem estatísticas valiosas para isso como, por
exemplo, o extenso catálogo de espadas do Wallace Collection Museum, em
Londres, que lista prontamente dezenas de belos exemplares, entre os quais é
difícil encontrar algum pesando mais de 1,8Kg (cerca de 4 libras). De
fato, a maioria dos exemplares, de rapieiras, espadas de uma mão e espadas de
duas mãos, pesam muito menos de 1,3Kg (cerca de 3 libras).
Apesar
do que o senso comum e dos especialistas de wikipédia alegam, as espadas medievais eram
de fato leves, manejáveis e, em média, pesavam
menos de 1,3Kg. Como o especialista em espadas
Ewart Oakeshott declarou: “Espadas medievais não são nem pesadas nem
todas iguais - o peso médio de qualquer uma de tamanho normal é entre 1,1kg (2,5
libras) e 1,5kg (3,5 libras). As espadas raramente pesam mais de 2kg (4,5
libras). Esses pesos, para homens que foram treinados para usar a espada
desde os sete anos de idade (e que tinham que ser espécimes resistentes para
sobreviver a essa época), não eram grandes demais para serem práticos.”
(Sword in Hand, p. 13).
As
espadas medievais em geral eram armas de combate resultante de uma evolução
tecnológica da metalurgia da época, leves e ágeis, capazes de igualmente cortar
ou perfurar. Elas estavam longe das coisas desajeitadas e pesadas que
costumam ser retratadas na mídia popular. Nos livros da série Arms, de Liliane
Funcken e Fred Funken é dito: “a espada era, de fato, surpreendentemente
leve. o peso médio das espadas dos séculos X ao XV era de 1,3 kg, enquanto no
século XVI era de 0,9 kg. Mesmo as espadas bastardas mais pesadas que eram
usadas apenas por combatentes de segundo grau não excediam 1,6 kg, enquanto as
espadas conhecidas como espadas de ‘mão e meia’ pesavam em média 1,8
kg. Quando as devidas concessões são feitas, esses números
surpreendentemente baixos também valem para a enorme espada de duas mãos, que
tradicionalmente era empunhadas apenas pelo ‘verdadeiro Hércules’. No
entanto, raramente pesava mais de 3 kg.” (Part 3, p. 26).
A
partir do século 16, é claro que houve desfiles especiais ou espadas que
pesavam até 3,5kg ou 4kg libras ou mais, no entanto, essas peças monstruosas
não eram armas de combate e não há evidências de que elas tenham sido
destinadas para uso em qualquer tipo de combate. De fato, não faria
sentido, já que havia outros modelos de combate muito mais manejáveis disponíveis,
que eram vários quilos mais leves. Dr. Hans-Peter Hils em sua dissertação de
1985 sobre o trabalho do grande mestre do século 14, Johannes Liechtenauer,
observou que desde o século 19 muitas coleções de museus de armas normalmente
apresentam imensas espadas como se fossem armas de combate reais, ignorando o
fato de que são não apenas com arestas rombas, mas de tamanho e peso
impraticáveis em campo de batalha, bem como mal balanceadas para uso
eficaz. (Hils, p. 269-286).
Mesmo
com todas as evidências, a crença de que as espadas medievais eram pesadas ou
difíceis de usar ainda é recorrente. É até mesmo um desafio tentar
encontrar um autor de esgrima do século XIX (e até mesmo do século XX)
que não declare inequivocamente em seus escritos que as espadas eram “pesadas”,
“incômodas”, “desajeitadas”, “desajeitado” e (em um completo mal-entendido do
manuseio, propósito e aplicação de tais armas diversas) foram projetados apenas
para “atacar”. Muito disso vem do imaginário e da noção de poder que a imagem
da espada trás junto de si.
Indo
um pouco além, em algumas ponderações do fabricante de espadas John Latham, da
William Swords, escritas em 1863, ele dizia que uma espada com peso tremendo,
necessitaria de uma força enorme para ser manejada e que seria impossível dar
velocidade tamanha para seu corte, resultando em um resultado nulo (Shape, p.
420-422). Ele continuava ponderando chegando a conclusão de que é um erro comum
acreditar que um homem forte pegaria uma espada mais pesada para poder causar
mais danos com ela e que o ideal é a relação certa entre peso e eficiência da
espada - “O peso que um homem pode mover com a maior velocidade é
aquele com o qual ele produzirá o maior efeito, mas a espada mais leve não é
necessariamente aquela que ele pode mover mais rápido. É possível que uma
espada seja tão leve que sintamos a resistência do ar ao fazer um corte com
ela, e é isso que expressamos quando dizemos que uma espada parece 'chicotada'
na mão. Tal espada é pior do que uma muito pesada.” (Shape,
p. 414-415). Uma espada certamente tinha que ter massa suficiente para suportar
um fio e uma ponta, ser capaz de aparar golpes e também dar um golpe de peso,
mas ao mesmo tempo não poderia ser tão pesada a ponto de ser lenta e
incontrolável. Esse peso necessário era um fator para o qual a lâmina era
projetada, seja para cortar, perfurar ou fazer as duas coisas contra quaisquer
materiais específicos que ela encontrasse.
O
certo é que entre a especulação e a história eu prefiro sempre a história,
embora possa não parecer tão “legal”. Os muitos tipos de espadas medievais e
renascentistas eram armas versáteis, ágeis e altamente eficazes, e é por isso
que elas existiram por tanto tempo em tantas formas. Como uma ferramenta
de autoproteção seria tão desajeitada ou exclusiva em suas dimensões e uso teria sido
continuamente popular por tantos séculos? Alegações de que consistiam
apenas em cortes grosseiros e movimentos descoordenados quando usadas por
pessoas “normais” insultam o quão versáteis e elegantes essas lâminas de
combate realmente eram. Existiam alguns tipos maiores e pesadas? Sim, mas eram a exceção da exceção, enquanto a grande maioria pesava menos do que se imaginava.
Abaixo,
veja uma imagem comparando o peso real de certas espadas com coisas usuais dos
dias de hoje. Vá lá e experimente empunhar essas coisas e imagine que aquele é
o peso real de uma espada. A imagem foi criada pela Swordwind (Escola Histórica
de Artes Marciais Europeia) com bases na coleção de espadas do Royal Armouries
Museum, em Leeds, Reino Unido.
Bons jogos!
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