Uma história para
Starfinder
Sobrevivência Incerta
Capítulo 03
Nytta estava logo atrás de
Kroan e de frente para a porta de desembarque com suas pistolas apontadas para ela.
Tudo estava em silêncio depois do estrondoso disparo das armas de proteção da
rampa. Após visualizar o alerta do scanner ela apenas tivera tempo de acionar
as defesas e correr ao encontro dos colegas. A capitã Huua tentava distinguir
alguma coisa entre a escuridão e a fumaça no pequeno monitor ao lado da porta.
“- Formas orgânicas
desconhecidas capitã!” – disse a imediata – “umas dozes pelo menos ao redor do
perímetro.”
“- Cobertura!” – sussurrou a
capitã. Prontamente Kroan e Nytta se posicionaram agilmente em ambos os lados do
corredor, à frente da porta de desembarque. Kroan agachou-se empunhando seu
rifle ígneo, olho direito na mira. Nytta estava empunhando suas pistolas e com
o rifle às costas. Embora não fosse a mais potente das armas ela as preferia ao
invés de armas pesadas. A capitã empunhou o rifle com apenas uma das mãos e
acionou a trava da porta com a outra.
A porta deslizou rapidamente
para a esquerda e as luzes externas automáticas se acenderam iluminando uma
larga faixa de terra. O ar do planeta, embora respirável, era denso e estranho,
e o efeito de ozônio dos disparos não ajudavam em nada. Fora isso não havia
movimento algum.
A capitã Huua deu dois passos à
frente enquanto os outros dois se posicionavam nas laterais da porta. Tudo
estava quieto.
“- O que quer que estivesse nos
rodeando não está mais” – disse Nytta olhando o pequeno monitor em seu
antebraço, por onde acompanha os dispositivos da nave.
A capitã deu mais alguns passos
até vislumbrar uma massa disforme alguns metros adiante. Alguma coisa, que
estava no alcance das armas de proteção da rampa de acesso, foi alvejada logo
que o sistema voltou a funcionar. Huaa baixou a guarda e se aproximou, seguida
pelo resto da tripulação.
“- Mas que diabos é isso?” –
disse Kroan tentando não vomitar devido ao odor insuportável.
“- Vamos descobrir. Kroan,
verifique a estrutura externa da Icarus e comece os reparos necessários” –
disse a capitão de forma enfática enquanto escrutinava o ambiente ao redor –
“isso aqui não é seguro e quero sair daqui o mais rápido possível!”
O garoto jogou seu rifle nas
costas e saiu correndo para debaixo da nave. Por ser pequeno quase conseguia
ficar de pé, o que facilitava sua tarefa. Verificando o dispositivo em seu
punho e a holotela flutuante à sua frente conseguiu todas as informações
necessárias para começar seu trabalho
agora que o sistema havia sido reinicializado. Havia um pequeno rompimento
parcial no casco, nada sério, e as medidas automáticas de reparo seriam um
ótimo paliativo. Uma solda externa deixaria como novo até chegarem à algum
espaçoporto. O maior problema estava em um dos trens de pouso com sua barra
central de sustentação avariada, deixando a nave arqueada para um dos lados.
Parece brincadeira, mas com
toda a tecnologia existente algumas coisas ainda são regras. Não é possível vencer certas leis da física tais como não se
conseguir levantar voo dentro de certo grau de inclinação. A força de empuxo
inicial não consegue ser compensada em diferentes áreas por um grau de
inclinação errado e simplesmente a nave seria jogada para o lado. Quanto maior
a nave, maior o problema. Kroan sabia muito bem disso e arrumar isso seria sua
prioridade se desejassem sair dali o mais rápido possível.
Kroan apertou um botão em seu
punho e aguardou um instante. Um som abafado e contínuo começou a aumentar até
que um cubo metálico pouco maior que um palmo surgiu flutuando, vindo de dentro
da nave.
“- Olá amiguinho! O que acha
disso?” – perguntou ao drone apontando para o trem de pouco.
“- Acho que precisa melhorar
suas aterrissagens! Já pensou em algum curso rápido?” – soou a voz metalizada
enquanto aproximava seu dispositivo ocular da peça avariada.
“- Acho que vou apagar suas
rotinas de humor de sua IA se continuar assim.”
“- Claro que vai, m-e-s-t-r-e, mas
quem lhe traria um pouco de alegria ao seu dia?”
“- Sabe o que fazer, não é Mark?”
“- Pegar a peça sobressalente e
auxiliar na troca” – respondeu pronta e entusiasmada a voz forçadamente alegre
do drone.
“- Sim, pegue a peça, mas antes
solde externamente a fissura no casco enquanto eu começo a soltar essa peça”.
Mark esticou seu braço metálico fazendo uma continência exagerada e voou para
dentro da Icarus assobiando uma canção que Kroan não lembrava de tê-la gravado
em sua memória.
O drone passou rapidamente pela
capitã e sua imediata que ainda tentavam entender o que era aquela criatura
feita em pedaços. Nytaa estava debruçada sobre os restos manuseando partes com
algum instrumento enquanto tentava escanear outra parte com o dispositivo em
seu pulso. Huaa prestava atenção no que a amiga fazia, mas não se descuidava
das redondezas. As luzes da Icarus eram suficientes para iluminar apenas
algumas dezenas metros adiante e ela não gostava disso. Até o amanhecer todos corriam
o dobro do perigo.
“- Alguma ideia com que estamos
lidando, Nytaa?” – perguntou a capitã se espichando por sobre seu ombro e
espiando o que ela cuidadosamente colocava dentro de um dos tantos recipientes
que trazia no bolso.
“- Nada ainda, mas espero que o laboratório me ajude. Analisando os restos apenas dá para dizer que são grandes, cerca de dois metros, com seis ou mais patas, todas elas pontiagudas à ponto de serem perigosas, e possuem uma carapaça muito resistente.” Ela dizia isso enquanto mexiam em um pedaço ou outro dos restos.
“- Isso não é bom” – disse a
capitã levantando-se e olhando ao redor – “os sensores haviam detectado pelo
menos uma dezena ao nosso redor até esse bicho ser destroçado. Quando saímos
todos tinham sumido, o que significa que não são estúpidos e que possuem certo
grau de inteligência! Isso é ruim... grandes, resistentes, perigosos e
inteligentes. Nytaa, mande seu amiguinho dar uma vasculhada no perímetro
enquanto continua com seu estudo no laboratório!”
De pronto Nytaa levantou recolocando
os frascos de amostras e seu bolso e correu para dentro da nave enquanto usava
o comunicador –“hora de acordar baby!”. Ela entrou na nave correndo indo em
direção ao laboratório, no final do corredor e não por acaso ao lado de seus
aposentos. Quando a porta se abriu, do lado de dentro, seu drone já a aguardava
pacientemente. Ao vê-la ele acionou uma série de luzes e sons que ela jurava
serem sinais de afeto.
A imediata passou por ele dando
tapinhas em sua cabeça, ou seja, no topo daquela esfera enquanto procurava
espaço sobre a bancada para colocar suas amostras - “baby, o negócio é o
seguinte, perímetro de duzentos metros ao redor da nave, mapeie a região e
espalhe alguns sensores e câmeras.”
Ela se abaixou conferindo
alguns ajustes de seu amigo esférico e verificando as esteiras laterais. Ela ia
como que checando itens de uma lista.
“- Sensores, ok?” - o drone
piscou luzes a assobiou.
“- Pernas de escalada?” - o
drone esticou suas seis pernas metálicas e as retesou como que espregiçando-se.
“- Câmeras e sensores para
instalar?” - o drone abriu um compartimento mostrando os itens.
“- Arma?” - o drone esticou um
braço curto com um laser.
“- Cara de mau?” - todas as
luzes ficaram vermelhas e ele imitou o som de rosnado.
“- Perfeito. Agora faça a
tarefa e me avise qualquer incidente… e mais uma coisa… nada de correr perigo,
hein?” - o drone ascendeu algumas luzes rosa e fez um assobio grave. Nytaa
abaixou-se e deu um beijo no topo de seu amigo - “agora vá!”
Baby acionou as esteiras e
correu para fora com uma destreza difícil de acreditar ser possível para aquele
drone.
Do lado de fora Huaa estava
distante algumas dezenas de metros, à bombordo da nave, sobre uma elevação de
areia e pedra acompanhando as marcas deixadas ao aterrissarem. Realmente Kroan
houvera feito um milagre.
Este era ou um enorme asteroide
ou um planeta anão, a capitã ainda não tinha decidido. Incrivelmente ele tinha
atmosfera, um pouco mais densa, é verdade, mas respirável. A visão até onde enxergava,
com os primeiros raios de sol, era de uma terra morta e arenosa, algo
semelhante ao que ela vira nos desertos de Plenaluz, em Verces. Elevações e
planícies de areia e pedra e nada vivo até onde a vista alcançava.
Uma pequena nuvem de poeira
saindo da nave chamou sua atenção, indicando que o drone de Nytaa já estava à
caminho, o que a tranquilizou. Finalmente as coisas estavam começando a entrar
nos eixos. Ela precisava de um pouco de ordem para se acalmar. Ter a
responsabilidade sobre sua tripulação não a incomodava, desde que pudesse fazer
bem seu trabalho os mantendo sãos e salvos, e ordem era uma coisa fundamental
para isso.
A capitã começou a circundar a
posição da nave sem nenhum sinal de movimento além da nuvem de poeira de Baby
ao longe e o brilho irregular da solda que vinha debaixo da nave.
Depois de alguns metros ela
encontrou um rastro, provavelmente da criatura destroçada. Eram marcas
circulares como se dezenas de picaretas tivessem feito pequenos furos no solo. Como
Nytaa havia dito, eram várias as pernas, e a quantidade de furos espalhados
pelo solo confirmavam a teoria. Elas vinham de uma determinada posição em
direção ao topo de uma colina, atrás da nave. Com seu fuzil armado e pronto ela
começou a segui-los.
Seu comunicador soou - “fala
Nytaa, o que descobriu?”
“- Não muito ainda. Se eu
estivesse na base teria mais recursos com meus brinquedinhos. Por enquanto
posso dizer que é algum tipo de criatura de fora de nosso sistema. Seu dna não
bate com nada registrado ou meramente conhecido.”
“- Hum... Isso não e bom… sem
informação, mais perigoso é... pelo menos sabemos que projéteis o ferem!”
“- Outra coisa que percebi, mas
pode ser um erro, já que temos pouca informação. Esse bicho tem características
semelhantes à insetos conhecidos de uma série de planetas. Corpo segmentado,
carapaça, quantidade de pernas, sistema nervoso... Pode ser só coincidência,
mas nunca se sabe. É tudo muito novo.”
Huaa continuava seguindo o
rastro subindo a pequena colina em direção ao sol nascente.
“- Eles serem insetos é
relevante de alguma forma?”
“- Sim, Huaa. Algumas
características ou modos de agir são incrivelmente semelhantes mesmo em
espécies de planetas diferentes.”
Ela continuava subindo a
colina.
“- Algo útil?”
“- Bom, articulações frágeis
são alvos bons para ataques, imobilizando-os ou atrasando-os. A carapaça
resistente é mais suscetível à ataques de projéteis do que energéticos. Fogo é
pouco efetivo, à não ser que seja em grande intensidade. Vivem em colônias
numerosas. Possuem subespécies especializadas…” - Nytaa ia listando as
características conforme conferia a tela do microscópio digital.
Huaa chegou ao topo da colina justamente
quando sol começava a iluminar todo o platô. Ela ficou paralisada.
“- Nytaa, repete a parte da
colônia…”
…
Kroan estava segurando a peça
sobressalente do trem de pouso enquanto Mark IV a soldava pairando alguns
centímetros do chão.
“- Essa arrumação deve durar
até chegarmos à algum lugar onde possamos trocá-la por inteiro, mas faça uma
solda dupla só por garantia.”
O drone movia-se com maestria
sem produzir quase nenhum som, soldando ora com um dos braços, ora com o outro,
ora com os dois. Todas as principais diretrizes de Mark estavam ligadas às
tarefas de engenharia ou computação. Kroan, logo que o construiu, tinha a
intenção de criar um subordinado que facilitasse seu trabalho na oficina da
família. Agregou bancos de dados com tudo o que pode encontrar sobre naves e
veículos naquele momento. As melhorias ligadas ao conhecimento computacional
vieram um pouco depois. Era para ele ser um ajudante ou mecânico apto quando
bem direcionado por ordens diretas e simples. O melhor que ele poderia fazer
com dez anos de idade. Mas isso foi além.
A vida na oficina da família, na
Estação Absalom, lhe rendeu duas coisas. Muito conhecimento prático e solidão. Embora
um receptáculo de todas as culturas dos Mundos do Pacto, o tipo de atividade o
mantinha como que dentro de uma bolha de interações. Desde que saíra de sua terra
natal, Castrovel, nunca mais teve uma vida normal. Ele se sentia como uma das
tantas ferramentas penduradas nas paredes ou nas gavetas da oficina.
Por tudo isso, conforme o tempo
foi passando, Kroan começou a ver em Mark não um mero ajudante, mas um
companheiro para inconscientemente suprir as relações que não tinha na vida
real. Inicialmente ele conversava com o drone mesmo sabendo que não teria
resposta alguma ou simplesmente lhe dava a ordem para segui-lo. Pareciam
inseparáveis, mesmo que isso fosse apenas uma mera fantasia.
Quando Mark foi destruído em um
acidente na oficina, devido à falha no sistema antigravitacional de elevação de
uma nave que estavam consertando, Kroan sentiu como se tivesse perdido
realmente um amigo. Ele passou os três dias e noites seguintes trabalhando para
recuperá-lo. O reparo deu origem à Mark II, embora o garoto o chamasse apenas
de Mark. O projeto fora melhorado e seu drone espelhava o crescente talento de
Kroan em construir coisas, tendo agora um sistema ainda rudimentar de
aprendizado e de resposta empática à estímulos externos de interação, ou seja,
ele aprendia um pouco, mas principalmente, tinha a capacidade de responder à
interações.
Mark ainda foi destruído outras
duas vezes, uma ainda na oficina e outra já quando faziam parte da tripulação
da Icarus. À cada nova reconstrução o projeto fica melhor e a inteligência
artificial de Mark se torna mais e mais complexa e intuitiva.
Kroan foi trazido a realidade
quando percebeu o silêncio. Não havia mais aquele som crepitante do maçarico de
Mark. O drone havia terminado o reparo da peça, mas permanecia estranhamente
imóvel, pairando no ar na mesma posição. Ele o olhou com atenção imaginando ser
mais uma piada da rotina de humor implantada dias atrás e que ele ainda lutava
para se acostumar. Só então ele sentiu.
Era algo quase imperceptível.
Passaria despercebido pela maioria, mas não por alguém treinado em encontrar
mínimas vibrações em cascos e motores de espaçonaves ou veículos de toda a
espécie. Ao mesmo tempo que mínimo, também era claramente crescente. Algo
estava se movimentando na direção deles.
“- Você sentiu?” - o garoto
perguntou aprumando o corpo para enxergar além do casco da Icarus.
“- Uns trezentos metros e se
aproximando.”
O garoto saiu debaixo da
espaçonave em direção à ponte, seguido do drone flutuante ao seu lado. A frente
da nave havia uma planície ampla com alguns quilômetros e depois elevações
acentuadas. Curiosamente não havia nada no campo de visão que justificasse as
vibrações, muito menos tão próximas.
O comunicador no braço de Kroan
soou mostrando ser a capitã.
“- Capitã, tem algo estranho
aqui…” - o rapaz foi o interrompido antes que conseguisse terminar a frase.
…
Momentos antes, quando a capitã
conseguiu acostumar sua visão a luz matutina, todo o platô se apresentou como
um quadro de terror. Nytaa acabará que reforçar que uma das características dos
insetos era a vida em colônias. Huaa não queria acreditar. Ela puxou seu
binóculo e o graduou para aumento máximo e todos os seus temores se mostraram
verdadeiros.
O platô, à cerca de quinhentos
metros da traseira da nave, tinha uma textura curiosa não por uma mera
peculiaridade do solo daquele rocha maldita pairando no espaço. Eram pequenos
furos. Centenas, milhares, milhões. Todo o platô estava marcado com incontáveis
pegadas daquelas sinistras criaturas.
“- Nytaa, quantas criaturas
podem ter nessas colônias?” - questionou a capitã pelo comunicador ainda
olhando o binóculo.
“- Ah, nada muito
significativo, de dez à cem mil espécimes... às vezes mais... se não tiverem um
predador natural podem chegar à milhões”. Huaa praguejou mentalmente em todos
os idiomas que conhecia. Ela sabia que agora, mais do que nunca, tinham de sair
dali o mais rápido possível.
Uma pequena variação no
horizonte, além do platô, chamou sua atenção. Era como um nevoeiro, uma
neblina, se formando alguns quilômetros além. Mas sua mente estava em modo de
alerta máximo. A primeira coisa que pensou foi que para haver algum tipo de
neblina era necessário haver algum tipo de umidade e aquela rocha era seca. Lembrou
imediatamente de Baby saindo da nave e criando uma pequena nuvem. Só podia ser
uma nuvem de poeira. Pior. O vento estava indo naquela direção, mas a nuvem se
aproximava. Algo estava vindo.
“- Merda…”
Huaa acionou o comunicador para
Kroan.
“- Capitã, tem algo estranho aqui…” começou o garoto, mas ela não
tinha tempo - “Diz que estamos prontos para levantar voo!” – ela disse.
“- Preciso de mais algum
tempo... meia hora, quem sabe. Mas, tem algo vindo da nossa frente... ainda não
consigo ver o que é!”
“- Tem muita coisa vindo de
trás de nós... temos que levantar voo AGORA!” – a capitã esperava ter sido
enfática o suficiente.
A ordem da capitã pegou Kroan
de surpresa. Mas a maior surpresa foi quando o chão começou tremer não mais de
forma sutil. Um pequeno terremoto o obrigou a equilibrar seu corpo ao mesmo
tempo de Mark subia um pouco mais para ter um melhor visual.
Saindo de um ponto de
cobertura, alguns metros à frente, Baby surgiu em velocidade máxima com um som
que todos conheciam como sendo de alerta de perigo, fazendo instintivamente
Kroan puxar seu rifle. Estranhamente ele não tinha no que mirar. Embora a vibração
parecesse de um tanque pesado se aproximando, não havia nada à sua frente.
Baby parou ao seu lado trocando
alguns sinais sonoros com Mark – “ele disse que há alvos vindo em nossa direção
alguns quilômetros à oeste e sul e disse que a vibração próxima fez seus
sensores dispararem, mas não localizou a origem” – disse Mark.
Então tudo aconteceu muito
rápido. O chão, algumas dezenas de metros à frente da nave, simplesmente
desapareceu ruino. Em meio à poeira algo grande, enorme, começou a sair do
buraco. À primeira vista era tão grande quanto uma pequena nave e tão robusto
como um hover tank. Ele surgiu inicialmente colocando duas enormes pernas para
fora forçando para que seu corpo viesse a superfície. Após estar totalmente
fora do buraco ele parecia um besouro superdesenvolvido com quase três metros
de altura e uns sete de comprimento, no mínimo.
Kroan estava literalmente
paralisado. Mas quando o enorme inseto lançou uma rajada de plasmas em algumas
pedras próximo de onde saíra, quase as derretendo, ele retornou à si fazendo a
única coisa que poderia – disparando seu arma. Os disparos pareceram não fazer
nem cócegas naquele enorme monstro, apenas denunciar uma presa para ele.
“- Isso não vai adiantar” –
disse Mark IV saindo do silêncio – “e temos mais companhia!” De trás do enorme
inseto outros três, iguais àquele destruído pelas armas automáticas, saltaram
da cratera no chão. Enquanto o grande levaria algum tempo para chegar até eles,
os outros três, muito ágeis e rápidos, precisariam de apenas alguns segundos.
Do nada Nytaa surgiu por trás
de Kroan empunhando um rifle de combate e disparando diretamente para o
primeiro dos três insetos menores arrancando duas de suas pernas e deixando-o
no chão. Mesmo assim aquela coisa não tinha intenção de parar e continuava se
arrastando em direção à nave.
“- KROAN!!! Nos tire daqui
AGORA!” – o grito da capitão pelo comunicador o fez agir! Ele não precisou de
mais nada para começar a correr em direção à rampa de embarque, seguido de Mark
e Baby.
“- Nytaa, aquela coisa grande
lança jatos de plasmas. Se pegar na nave já era! Ela não pode se aproximar!” –
ele gritou enquanto se afastava por debaixo da nave.
Nytaa escutou as palavras sem
perceber o perigo real, se concentrando nos insetos menores que estavam cada
vez mais próximos. Apenas quando a enorme coisa lançou um novo jato de plasma
ela percebeu todo o risco que corriam. A nave não estava pronta para resistir
àquele tipo de dano, pelo menos não parada no chão. Seria catastrófico. Ela
tentava pensar em algo enquanto mirava para um novo disparo. Quatro projeteis precisos
no dorso do segundo inseto deixando-o, desta vez, inerte. Faltava apenas um.
Infelizmente não percebeu o quão rápido ele eram e a criatura já estava quase
sobre ela.
Com um salto a criatura escapou
de um disparo desajeitado e assustado da imediata, pousando à menos de dois
metros dela, fazendo-a cair de costas. As duas patas frontais, em forma de
longas e pontiagudas lanças, projetaram-se em sua direção atingindo o solo. Ela
escapou de ser empalada mais por sorte do que por agilidade, rolando para lado.
Quando o segundo ataque do monstro ia acontecer disparos o impediram vindos da
capitão Huaa, que acabara de chegar. Nytaa completou o ataque disparando de
baixo e criando uma chuva de sangue verde e mal cheiroso.
Elas nem tiveram tempo de
comemorar. Nytaa se pós de pé rapidamente, trocando o cartucho da munição e
disparando contra um inseto que avançava correndo, com mais quatro atrás, pelo
flanco.
“- Vou cuidar daquela coisa” –
disse Huaa, se referindo ao lançador de plasma – “me dê cobertura e vamos sair
daqui... tem muitos deles vindo.”
Para quem conhecia mais
intimamente a tripulação da Icarus uma coisa era clara – Huaa e Nytaa tinham
uma sinergia invejável. Mais do que um par romântico, nos campos de batalha
elas lutavam como uma só. Um desavisado poderia dizer que elas tinham alguma
espécie de conexão ou interface permanente que lhes permitiam saber uma do
movimento da outra, com manobras e ações precisas e letais. A história delas
era antiga, mas o ballet mortal que desempenhavam vinha de alguma coisa sem
explicação. Elas gostavam do que faziam e principalmente gostavam de fazer
juntas.
A capitã correu em direção ao
enorme tanque em forma de inseto, jogando o rifle para as costas enquanto
preparava algumas granadas unido-as magneticamente. Um lançamento não forte,
mas preciso, conseguiu posicionar o dispositivo por sobre o que seria o pescoço
do monstro. Uma rajada de plasmas ainda foi lançada em sua direção antes da
explosão, a obrigando à se jogar para longe do perigo incandescente, antes da cabeça
da besta ser arrancada, fazendo-a tombar.
Um pouco atrás Nytaa revezava
entre disparar nos insetos que se aproximavam dela, pelo flanco da nave, e nos
novos que saiam da cratera próxima de Huaa. Ele usava com precisão a economia
de recursos necessária no uso de cartuchos com apenas doze projeteis,
disparando nas pernas apenas duas vezes para atrasá-los. Isso permitia que
atingisse seis antes de cada recarregamento. Mas mesmo com sua pontaria, que
incrivelmente não estava lhe faltando hoje, ela tinha que esperar eles se
aproximarem um pouco para não ter perigo de desperdiçar munição. Isso estava
fazendo surgirem cada vez mais insetos de todos os lados.
A capitã recuou para o lado da
imediata e ambas dispararam incessantemente, ora trocando de posição, ora uma
dando cobertura para a outra recarregar seu fuzil. O som dos motores quando
foram acionados foi uma benção já que o número de insetos estava se tornando
impossível de conter. Huaa fez um sinal para Nytaa e ambas recuaram
rapidamente, mas mantendo os disparos nos insetos mais próximos. Quando chegaram
à rampa de embarque a nave começou a subir e ambas se posicionaram na
plataforma à tempo de ver um mar de insetos que estavam chegando por sua
retaguarda. Mais alguns segundos e teriam sido enterradas vivas.
...
A nave atingiu uma altitude
baixa, mas constante. Os motores pareciam se esforçar ao máximo, mas a nave não
conseguia subir mais. Quando a porta externa fechou Huaa correu para a ponte se
jogando para sua poltrona, ao lado da do piloto, ocupada por Kroan. Muitas
luzes erradas piscavam e sinais sonoros eram disparados com alarmes diversos.
“- Eu disse que precisava de
mais algum tempo” – bufou Kroan não como uma reclamação, mas como uma
explicação frente ao esforço que ele fazia com o manche da Icarus.
“- Alguma notícia de Sakesk ou
Target?” – perguntou Huaa.
“- Eu mandei uma nova mensagem
no meio do combate” – disse Nytaa – “espero que tenham recebido!”
“- Capitã... os motores não têm
potência para sair da atmosfera... na verdade não conseguiremos subir mais do
que isso... mas posso nos afastar muito desses monstros até achar um local para
pousar com um pouco mais de segurança!” – disse Kroan.
“- Nos deixe no ar o máximo que
puder!” – disse a capitã levantando e sendo substituída por Mark IV, que pousou
em seu assento esticando seus braços metálicos acionando botões e alavancas.
O voo durou cerca de duas horas
antes que Kroan fosse obrigado a escolher um lugar para pousar. O topo de uma
elevação foi a escolha possível. Pouca área ao redor para aquelas coisas
escavarem e atacarem sorrateiramente, ampla visibilidade de monstros se
aproximando e um ótimo ângulo para disparos se necessário. Huaa recomendou que
pousassem com ajuda dos dispositivos de antigravidade para a menor indicação
possível de vibração. Nytaa suspeitava que aquelas coisas poderiam se guiavam
pelas vibrações. A ordem era de silêncio absoluto dentro da nave, o mínimo
possível de movimentação e velocidade nas tarefas.
Os três se encontraram na mesa
de refeições, junto com Mark e Baby. Os estômagos roncando era um indicativo de
que passaram quase um dia sem se alimentarem, além de que precisavam relaxar
pelo menos um pouco.
Continue a leitura:
Capítulo 4
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