sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Material de Apoio I - Arquearia: sua excelência, o arco


Arquearia I
- Sua excelência, o arco -

Quando pensamos em arquearia não estamos pensando numa simples e antiquada arma, mas em um dos mais elaborados saltos tecnológicos da militaria na história da humanidade. Se pensarmos na humanidade, desde seus primórdios, quando a espécie homo começou a moldar o seu redor, instrumentos foram criados para defesa e ataque, principalmente na defesa contra outros grupos humanos e no ataque para caça. Nesses períodos a distância de um alvo era um problema real, que foi levemente superado com as hastes de arremesso – uma espécie de lanças primitvas. Mas ainda assim elas se valiam diretamente da força do braço de alguém para arremessá-la à uma certa distância com uma certa potência. Ambas, distância e potência, relativamente pequenos para nossos parâmetros atuais.

Com a invenção do arco para arremessar uma flecha, o homem criou um instrumento que ampliava a sua capacidade de força para arremessar algo muito além da simples capacidade de seu braço e com muito mais força. Foi realmente, como já disse, uma salto tecnológico. E quando esse salto aconteceu? Ainda há muita controvérsia, mas antropólogos localizam a invenção do arco entre os períodos paleolítico e mesolíticos, provavelmente mais próximo possível dos 15 mil anos a.C., muito embora arqueólogos já tenham descoberto o queriam pontas de flecha datadas em 60 mil anos. O que temos certeza é que em meio ao mesolítico temos pipocando por todos os cantos restos arqueológicos de artefatos que até certa medida serviam de arco.

Quanto mais nos aproximamos do presente mais vemos o arco tomando seu lugar nos exércitos e campos de batalha, pelo menos até a descoberta da pólvora. Não por menos que ele é colocado dentre as cinco invenções de militaria que mais influenciaram e mudaram o mundo.

Estrutura
O arco, a estrutura que impulsiona as flechas, é composto basicamente (por que não dizer historicamente) de madeira. Essa madeira tem de ser resistente e densa e normalmente vem de árvores com o teixo, o freixo, carvalho ou carya (isso será abordado melhor na postagem sobre fabricação de arcos). Existem duas formas dessa haste ser trabalhada - em forma plana, onde apenas uma haste (também chama de pala) compõe toda a estrutura do arco, ou de forma composta, quando duas hastes (palas) montam a estrutura do arco à partir do centro. Ele é uma haste relativamente alongada e com as extremidades afinadas e interligadas por uma corda chamada simplesmente de a corda do arco.

O arco é dividido em duas seções quando o olhamos em posição vertical, ambas chamadas de limb (‘extensão’ ou ‘braço’), assim divididos em braço superior (uper limb) e braço inferior (lower limb). Ambas extensões finalizam em extremidades chamadas de nock. A porção central do arco, considerando o local onde o seguramos acrescido de mais cinco centímetros para cima e para baixo, é chamado de rise ou handle.

A corda do arco (originalmente chama de bowstring) precisa ser resistente tanto à tensão de uso quanto à ação da água e umidade. Mas sem engana aquele que pensa que a corda de arco é uma simples corda resistente. Até mesmo a forma de entrelaçamento de suas fibras tem importância em seu uso. Em princípio temos três tipos de trançados para o arco: simples, reverso-torcido e as looped strings.

A corda trançada de forma simples pode ser feita de qualquer tipo de fibra torcida em um único cabo. Sua maior vantagem é a facilidade de se achar o material (quase todo o tipo de fibra) e a rapidez de a produzirmos. Mas sua velocidade de trançado acaba por produzir uma corda mais fraca e que precisa estar em constante tensão no arco para que suas fibras não se separem. Para se presa ao arco usamos um nó simples com duas laçadas ao redor do nock.

Já o reverso-torcido, mais comum na Europa, usava fibras de linho ou cânhamo, e tinha uma mecânica de torção muito peculiar. Conjuntos de fibras são torcidos em um sentido em vários feixes separados. Depois esses feixes são unidos e torcidos entre eles em um sentido contrário. Isso garante que eles permanecerão em sua estrutura, não necessitando estar em permanente tensão. Eles são presos aos nocks por nós em um engate na própria estrutura do arco. Por fim o looper string é simplesmente um feixo fino contínuo que é preparado dando voltas com o comprimento máximo que terá no arco. Depois esse conjunto de feixos paralelos é unido a partir das extremidades já formando um laço para ser preso no arco. Ao redor do centro desse feixe coloca-se uma sustentação onde as flechas serão colocadas circulando com outro fio como que criando um incólucro.

As flechas são hastes, de madeira (pelo menos as da época que temos como alvo aqui nesta postagem), com uma ponta de pedra, osso, metal ou mesmo apenas com a ponta da haste afinada, que são propelidas pelo arco. Sua estrutura é muito simples sendo composta pela haste, numa das extremidades a ponta de flecha (que passa a ser chamada de dianteira) e noutra extremidade possuindo o nock (o mesmo nome das extremidades do arco) que nada mais é do que um encaixe para melhor fixação na corda do arco. Antes de chegar ao nock, na haste, há um conjunto de três estabilizadores chamados de fletching (que normalmente são feitos de penas de pássaros ou folhas).


As pontas de flecha possuem uma grande variedade de tipos. Quem pensa que as variações de pontas de flechas utilizadas pelos personagens de HQs Gavião Arqueiro e Arqueiro Verde são fantasia, está enganado. Ao longo dos séculos muitos tipos de pontas de flechas foram inventados e aprimorados para as mais variadas funções. Basicamente as flechas se dividem em três tipos básicos: combate, caça pequena e caça grande.

As flechas para caça, tanto para presas pequenas quanto para presas grandes, têm as mesmas características estruturais para causar dano. Elas possuem uma forma triangular menos alongada que as de combate para possibilitar uma maior área de entrada na presa e assim desabilitá-la rapidamente, não lhe dando chance de fuga. Pelas imagens abaixo vocês perceberão que as dimensões também são diferentes. As para presas de pequeno porte são menores para uma rápida ação a curta distância, quase sempre em meio à floresta. Já as para presas de maior porte possuem uma área muito mais ampla, para potencializar o ferimento, e com abas laterais para que a flecha não dê à presa a possibilidade de fuga.

 

As flechas de combate têm um formato um pouco diferente. Elas são mais alongadas, pois sua função é causar dano em adversários cobertos de proteção – escudo, armadura, cota de malhar e proteção acolchoada, quando não todas elas. Cada um dos tipos era indicado para um tipo de proteção. Por exemplo as imagens 4 e 7 eram indicadas para para cotas de malha e vestimentas acolchoados, enquanto as de número 1, 2 e 3 para armaduras e escudos. Nos aprofundaremos mais na postagem sobre os mitos dos combates com arcos na Idade Média.


Tipos de Arco
Como já vimos até agora a definição de arco passa a idéia de um objeto alongado de madeira, preso por uma corda, com a função de projetas flechas. Esta é a definição de todos os arcos. Mas mesmo dentro deste universo de simplicidade temos muitas variações fazendo eles se dividirem quanto à estrutura, formato e tamanho.

Como já dissemos antes os arcos podem ser divididos quanto à sua estrutura. Os arcos planos são aqueles construídos a partir de uma peça única de madeira podendo ser chamados também de arcos laminados. Já os arcos compostos eram produzidos a partir de duas palas feitas de cornos de animais ou madeira, que se iniciavam no centro e se curvavam individualmente até as pontas. Seu formato assimétrico permitia ter um tamanho reduzido sem perder a força nos disparos, mas era extremamente frágil, além de ser afetado pela umidade. Por seu tamanho menor eles eram mais utilizados por arqueiros em montarias.


Quanto ao seu formato eles tinham uma maior variação, desde o simétrico arco em linha reta (a) até o triangular com aderência (h). Entre eles tínhamos o arco em linha reta curvo (b), arco em linha reta com duas curvas (c), o arco assimétrico (d), o arco com curvatura dupla (e), o arco com quatro curvas (f) e o arco triangular (g). Todos esses formatos tinham suas explicações e justificativas regionais, culturais ou funcionais.

Quanto ao seu tamanho podemos dizer que existem os arcos curtos e longos. Existe muita controvérsia quanto o tamanho exato de um e de outro, mas podemos dizer que os arcos curtos mediam até 1,20m e os longos acima disso, podendo chegar à 2 metros de comprimento. Por sua potência ligada ao tamanho sabe-se que os arcos curtos tinham um desempenho menor, sendo mais utilizados para caça, enquanto os longos, que poderiam atingir perto de 400 metros de distância, mais utilizados para combates. Mas mesmo isso pode ser debatido se levarmos em conta a questão dos arcos compostos, mas veremos isso em outro momento.


Dentre estas três variações apresentadas – estrutura, formato e tamanho – foi criada ao longo da história, e pelo mundo à fora, uma grande variedade de tipos. Por exemplo, o arco clássico inglês é um arco plano, reto e longo. Já um arco mongol é um arco muitas vezes composto, curto e com quatro curvas.



6 comentários:

José Ozorio Costa disse...

Parabéns pelo texto, muito bem elaborado. Espero a segunda parte. Isto é incrível para qualquer RPG!

João Brasil disse...

Muito obrigado.... muito em breve teremos a segunda parte!

Josimar disse...

Parabéns, ótimo texto mesmo! Não pensava que tinha tanta informação sobre o arco.

João Brasil disse...

E isso é só o começo!!!!

Dija disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Dija disse...

Parabéns pelas informações. Me recomendaram o link e estou olhando aos poucos. Muito útil pros meus enredos de fantasia, já que eles são bem baseados nos RPG/MMORPG.