ARQUEARIA VI
- Disparo de flechas montado -
História
Sempre
fiquei curioso quanto à eficácia da arquearia montada, ou seja, a prática de
disparar flechas enquanto montando. O uso do arco por pessoas montando não foi
nada fora do comum ao longo da história, por sinal, era muito mais comum do que
se imagina. Por muitos séculos rebanhos eram pastorados e estradas eram
vigiadas por pessoas que portavam uma espada na cintura e um arco na mão.
Se
procurarmos uma origem seremos remetidos aos povos nômades da Idade do Ferro de
toda a gigantesca extensão da atual Rússia até a Europa e daí para o sul, nos
atuais Irã e Índia e o Japão para leste, isso pensando em termos de
Antiguidade. Durante a Idade média, principalmente depois das invasões
bárbaras, a Europa adotou largamente o costume de pessoas montadas usando arcos
para os combates de exércitos.
Mesmo
tendo suas vantagens relativas no combate em massa (veremos adiante), o uso de
tropas montadas com arco deixou de ser utilizado já ao longo do século XVI. Primeiro
pelo desenvolvimentos de arcos mais potentes, como o arco longo, depois pelo o
advento das armas de fogo, embora inicialmente muito imprecisas, o uso de
tropas de arqueiros montados foi aos poucos sendo deixado de lado. Já o uso individual
perdurou até que as armas de fogo tivessem superioridade numérica e de
qualidade, muito embora pessoas mais simples ainda usassem o arco por uma
questão de condição econômica.
A
Prática
Uma
das questões que podem surgir é com relação aos equipamentos mais adequados para
a arquearia montadas. Vamos começar com o cavalo. Historicamente não existe uma
raça ideal de cavalo para esta modalidade de combate. Em todos os momentos históricos
foram utilizados todas as raças disponíveis para aqueles povos, inclusive
outras espécies de animais como camelos ou elefantes. O diferencial com relação
à montaria é sua personalidade – calma, principalmente no movimento em conjunto
com outros cavalos; linearidade no movimento; e equilíbrio no trote e corrida.
Todos esses três elementos são fundamentais para que o disparo da flecha montado
seja o mais natural possível.
Na
verdade é dito por muitos mestres de arquearia que o cavalo, no final de tudo,
até mesmo além do arqueiro, é o ponto mais importante do disparo de flechas
montado, pois estamos lidando com outra mente no conjunto de equipamentos. Um
ótimo arqueiro sobre um cavalo não adequado, baseado nos elementos que mostramos,
terá um resultado péssimo em seu disparo. Da mesma forma, um cavalo adequado,
poderá otimizar o disparo de um arqueiro não tão habilidoso.
Pensando
no arco para prática do disparo sobre o cavalo o mais indicado seria o que tivesse
um tamanho reduzido. Não é impossível realizar o disparo com um arco longo, mas
com toda a certeza o manuseio fica muito mais fácil com arcos menores. Os povos
orientais e da eurásia usavam em sua grande maioria ou o arco recurvo composto,
também chamado de arco com quatro curvas, ou o arco com curvatura dupla (ver
nossa postagem sobre tipos arcos AQUI). Sua vantagem vinha do tamanho reduzido,
mas sem uma considerável perda de potência, já que as curvas possibilitavam uma
ótima tensão à corda. Com este tipo de arco o arqueiro poderia movimentá-lo sem
grandes problemas sobre a montaria facilitando seu uso e disparo.
Técnicas
de combate
Inegavelmente
disparar flechas enquanto montando é a forma mais complicada e complexa para se
disparar flechas. O cavaleiro precisa exercer duas atividades de forma
impecável – manejar o cavalo e atirar com arco. Pensando nisso, além dele ter
de manejar muito bem sua montaria, ele deverá fazer isso sem o uso das mãos, já
que ambas estarão manejando o arco.
No
que tange o uso do arco por cavaleiros de forma individual ou cotidiana as
técnicas não eram tão importantes. Normalmente nessa situação o arqueiro teria
tempo de parar seu cavalo ou diminuir seu movimento para um melhor disparo. Mas
em momentos de combate entre exércitos a necessidade era outra.
Para
os combates em massa algumas técnicas forma criadas e aprimoradas. Uma das mais
antigas e conhecidas é a skirmishers. Ela era uma tropa extremamente rápida e
ágil para ataques em constante movimento tanto com arcos quanto com lanças.
Seus ataques eram normalmente pelo flanco ou ao redor do alvo. Foram
principalmente utilizados na época medieval muito embora também tenhamos uma
noção a partir de nosso imaginário sobre o velho oeste americano. O grande
limitante desta técnica é que há a necessidade de uma ampla área aberta para
todas as manobras da tropa tanto para ataque quanto para formação e fuga. Mesmo
com a vantagem da velocidade eles ainda eram tropas vulneráveis ao revide da
tropa inimiga, fosse de arqueiros à pé ou besteiros, visto que para serem ágeis
deveriam ser leves e rápidos, impossibilitando o uso de pesadas proteções
corporais.
Outra
tática era a do Tiro Parthian (o nome advém de Império Parta, entre os anos 247
AC à 224 DC, na antiga Pérsia). Ela consistia nos arqueiros movendo-se para uma
direção e girando seu corpo para trás para disparar suas flechas diretamente na
direção oposta, pegando seus alvos, que os perseguiam, de frente. A vantagem
aqui era que seus adversários não tinham condições de resposta aos ataques além
de estarem relativamente próximos. Essa tática era utilizada também pela tribo
Comanche, de índios americanos.
Para
termos uma noção da importância dessas técnicas, quando bem utilizada, recordamos
a humilhante derrota das tropas do império romano na Batalha de Carras contra o
exército Parta, que se valia das duas técnicas – tropas velozes montadas e
armadas com arco e a técnica de tiros para trás. Mesmo com uma grande
desvantagem numérica, as forças do general Marco Licínio Grasso, contando com 43
mil homens (entre legionários, cavalaria e infantaria leve), não foram páreas
para as forças do general Surena, com seus 9 mil arqueiros montados. As perdas
das tropas romanas foram de mais de 30 mil enquanto que as forças Partas
perderam poucas centenas.
Mas
nem todas as táticas de tiro de arco sobre cavalos eram velozes. Elas poderiam
fazer parte de tropas pesadas, como nos casos bizantinos, japoneses (samurais),
turcos (timariots), assírios ou húngaros. A tática desse tipo de tropa era
normalmente de forma disciplinada e com a intenção de, pela quantidade e
ferocidade, enfraquecer a posição inimiga para um segundo ataque direto.
As
tropas assírias, bizantinas e turcas, por exemplo, usavam pesadas armaduras
chamadas de catafracrátio, aumentando em muito a proteção, mas diminuindo em
igual proporção a mobilidade. Eles compensavam essa dificuldade de mobilidade
com uma técnica e disciplina apuradas trabalhando em conjunto com lanceiros
também montados. Desta forma os arqueiros montados tinham uma considerável
proteção contra a arquearia adversária enquanto os lanceiros faziam a proteção
contra as tropas que se aproximassem. Desta forma com menos necessidade de
movimentação, eles poderiam disparar em cadência e em conjunto aumentando a possibilidade
de dano em amplo espectro. Normalmente eram feitos de cinco à seis disparos
como uma verdadeira nuvem para desestabilizar e confundir as tropas adversárias
e logo em seguida partiam para a carga junto com os lanceiros.
Algumas
variações aconteceram nos exércitos germânicos principalmente, que se valiam de
besteiros montados. O disparo de uma besta é extremamente poderoso, mas trás um
grande inconveniente - a enorme dificuldade de rearmarmos a besta, algo
impossível sobre um cavalo. A tática utilizada então tentava se valer destas
características. Grupos de besteiros montados normalmente atacavam o flanco
inimigo com uma única, mas devastadora saraivada de disparos, que logo em
seguida descartavam as bestas e partiam para o ataque como uma infantaria.
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